Editorial de 26 de novembro,
Morreu Fidel Castro aos noventa anos. Uma era chegou ao fim em Cuba. Coube a seu irmão, Raúl Castro, o anúncio do falecimento em rede nacional de televisão: “Com profunda dor é que compareço para informar ao nosso povo, aos amigos da nossa América e do mundo que hoje, 25 de novembro do 2016, às 22h29, faleceu o comandante da Revolução Cubana, Fidel Castro Ruz”.
O líder cubano entrou para a história como um dos grandes personagens do século XX. Poucos líderes políticos inspiraram tanta paixão e ódio, tanta veneração e repulsa. Vítima de mais de 600 tentativas fracassadas de assassinato, a maioria delas planejadas pelos Estados Unidos, Fidel Castro governou Cuba por ininterruptos 47 anos. Deixou o centro do poder em 2006 por motivo de doença.
As grandes transformações sociais são as parteiras dos fenômenos que comovem o mundo. Fidel apareceu na cena histórica como o maestro da revolução cubana de 1959, isto é, como o seu principal estrategista militar e dirigente político. Dono duma oratória arrebatadora e poderosa, foi o comandante-em-chefe duma revolução nacional-democrática que derrubou a ditadura sanguinária de Fulgencio Batista e foi para além dos limites do capitalismo. Sob a força de circunstâncias inesperadas, Castro viu-se compelido a dirigir a tormenta revolucionária à expropriação da propriedade capitalista nacional e estrangeira em Cuba.
A poucas milhas de distância da Flórida, a pequena Ilha ousou e venceu. O povo cubano rompeu com as amarras da dominação imperialista que condenara por séculos o país à miséria, à opressão, a fome e ao analfabetismo. Deixando para trás os tempos de prostíbulos e cassinos ianques, a Cuba rebelde atingiu conquistas sociais, até hoje, sem precedentes na América Latina. A Ilha enfrentou agressões militares, atentados terroristas comandados pela CIA, sabotagem internacional, embargo econômico, enfim, a fúria dos poderosos que não queriam que o exemplo cubano florescesse pelas Américas.
A força do personagem Fidel Castro, contudo, não pode apagar a crítica marxista. Em Cuba, mesmo em tempos ‘socialistas’, nunca houve democracia operária e popular. As instituições do Estado foram sempre controladas pelas mãos de ferro de um regime político sem liberdades democráticas. O sistema estalinista na Ilha, rigidamente controlado pela cúpula do Partido Comunista, nunca tolerou diferenças: encarceraram revolucionários divergentes, condenaram trabalhadores críticos, perseguiram homossexuais e artistas. O regime ditatorial cubano orienta-se pela preservação dos privilégios de uma burocracia estatal.
Demonstrou-se, em Cuba, uma vez mais, que o projeto de emancipação socialista dos trabalhadores não pode ter êxito confinado às fronteiras de um só país, muito menos restringido aos limites de uma pequena Ilha carente de recursos naturais e subdesenvolvida.
O regime cubano optou também pela estratégia de convivência pacífica com o cerco capitalista a Ilha e, posteriormente, pelos primeiros planos de abertura capitalista. Dos intentos guerrilheiros de Che Guevara em África e Bolívia, Castro passou à defesa do estatus quo na América Latina. É conhecida sua recomendação aos guerrilheiros sandinistas nos anos oitenta: “Não façam da Nicarágua outra Cuba”.
Nos anos noventa, com o naufrágio da União Soviética, foram decretadas as medidas fundamentais que balizariam a restauração capitalista na Ilha. Atualmente, os negócios em Cuba fluem em volume crescente por meio do turismo internacional, dos investimentos externos, do comércio global, de empresas estrangeiras etc. A cúpula da burocracia estatal se enriquece enquanto as conquistas sociais da revolução vão se perdendo. A recente visita de Obama a Ilha foi o símbolo desse processo avassalador.
De toda forma, Fidel Castro é considerado o principal líder da revolução que estremeceu as Américas e lançou a chama da esperança socialista em todo mundo. Seu nome será sempre lembrado por isso. Nesse momento de luto do povo cubano, nos solidarizamos com sua dor e sentimentos.
Foto 1: Ernesto Che Guevara – Fidel Castro – Camilo Cienfuegos – Cuba
Foto 2: Fidel Castro speaks from a makeshift balcony draped with Cuban flags in Santa Clara en route to victorious entry into Havana. Photograph: Lee Lockwood/The Life Images Collection/Getty
Foto 3 : A Havana man is reflected in a mirror hanging on his wall covered with photographs of, left to right, Raúl Castro, Fidel Castro and Ernesto ‘Che’ Guevara. Photograph: Ramon Espinosa/AP
Compartilhamos abaixo a música “El Necio” do compositor e cantor cubano Silvio Rodriguez:
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