Sexta-feira, dia 15 de janeiro, final da tarde. Os vereadores de Florianópolis ainda em processo de organização de seus mandatos recebem um memorando do Presidente da Câmara convocando para sessão ordinária na próxima segunda feira (18), a fim de apreciar seis “mensagens” que nada mais são do que mais um pacote de maldades em forma de projetos de lei do “novo” governo Gean. Prepare-se para mais um textão, mas antecipo que não serão medidas as palavras para denunciar esse ser politicamente desprezível que segue na cadeira de prefeito da ilha da magia…
Breve Contexto
Há exatos quatro anos atrás (2017) a categoria de servidores municipais enfrentava uma de suas maiores greves contra o então pacotão de 40 maldades do recém eleito Gean. Foram 38 dias de luta que conseguiu reverter a maior parte dos ataques do executivo. Contudo, era também um ensaio do prefeito para medir forças com a categoria de trabalhadoras e trabalhadores do serviço municipal que, apesar de derrotado, seguiu reunindo forças para novos ataques que se sucederam nos anos seguintes.
Agora, no fim da primeira quinzena do novo mandato mais um pacote, contendo seis “mensagens”, demonstrando ainda mais desprezo pelo serviço público e seu anseio pelo avanço de processos privatistas, em especial na COMCAP e na educação municipal. Apresentaremos nossa análise sobre as cinco primeiras mensagens, considerando que a sexta[1] não seja de maior impacto nas relações de trabalho nos serviços públicos de nosso município.
Mensagem 01
A “mensagem 01” diz respeito a venda de vários imóveis públicos sob o argumento de uso do recurso para destino exclusivo “ao regime próprio de previdência dos servidores municipais”. Ora, após destruir nossa previdência, parcelar a parte patronal em vários anos, aumentar o desconto na folha de pagamento das trabalhadoras e trabalhadores, não realizar qualquer auditoria que comprovaria não haver déficit, agora o governo investe em se desfazer de imóveis, “enxugar a máquina” e criar a aparência de manter as contas em dia.
Muitos empresários lucraram com o dinheiro do fundo, na época, investido no Banco Santos, não obstante, agora poderão lucrar ainda mais comprando esses imóveis da prefeitura. Ainda nesta mensagem há um conjunto de imóveis da COMCAP, os quais estão sendo colocados a venda sob o argumento de aquisição de bens de capital (equipamentos e materiais permanentes). Ora, o executivo vem dia após dia atacando os trabalhadores da COMCAP, tentando retirar direitos, sucateando ainda mais a empresa para justificar sua privatização.
A venda destes terrenos é só mais um engodo que visa engordar bolsos ocultos, mas não melhorar de fato o serviço prestado para população. Voltaremos a essa questão mais a frente, quando o real objetivo se desvela nas próximas “mensagens”.
A Mensagem 02 e o ataque à gestão democrática na educação
A “mensagem 02” é o exemplo concreto de como tratar o serviço público e a democracia a partir de interesses empresariais, consequentemente privatistas. Trata-se da alteração na lei 7.503, sobre o Conselho Municipal de Educação (CME).
A atual gestão do CME tem sido exemplo na atuação referente ao trato com a educação nesse período de pandemia. De forma efetivamente democrática tem sido uma “pedra no sapato” do atual prefeito, pois seus representantes institucionais e empresariais que estão no CME não têm sido eficazes em suas proposições. O que tem acontecido é uma construção atenta as reais necessidades do processo pedagógico público municipal e não interesses privatistas fomentados por Gean, pelo Secretário municipal de Educação e seus “empreendedores”.
Por essa razão o ataque proposto sugere a entrada de 16 novos “representantes da sociedade civil” para ocuparem acento no CME e assim obviamente virar o jogo a favor dos interesses explícitos na própria mensagem, ou seja, “empreendedorismo, inovação e tecnologia”. Na verdade, com exceção da Academia Catarinense de Letras e da Coordenadoria Municipal de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, todas as outras 14 representações propostas são das classes que dominam o capital da cidade, como empresários do comércio e indústria, de empresas de contabilidade, comunicação entre outros agrupamentos que nada tem a ver com a educação.
Para piorar, o governo ainda propõe aumentar sua ingerência sobre o CME, dando poderes ao secretário municipal de educação para vetar as resoluções do conselho que não forem do seu interesse, num total exemplo de desrespeito com uma entidade democrática. Pior que isso, confere ao prefeito legislar na educação por meio de decreto, de modo que a própria Câmara de Vereadores é também atacada com essa propositura. Mas não sejamos ingênuos, é sabido que a maior parte dos vereadores são da base de apoio do Gean e seguirão como gado aos comandos de seu “pastor”. Por isso a importância de lutarmos, tomarmos as ruas, nos organizamos para virar a roda da opinião pública e não permitir mais esse desmonte.
Pode parecer pouco, uma simples mudança representativa no CME, mas não é. Pelo CME, a educação municipal poderá ser ainda mais desmantelada, sofrendo sequestro de recursos públicos para interesses privados, termos ainda mais ataques aos profissionais da educação, da gestão democrática da escola, da formação continuada, do desmonte da autonomia pedagógica em nome de iniciativas privatistas, meritocráticas, chamadas de “inovadoras”, “tecnológicas”, “empreendedoras”.
A resolução 01/2020, sobre a educação durante a pandemia é um exemplo concreto que foi construída ouvindo toda a sociedade e desagradou o executivo municipal. O projeto atual sendo aprovado abrirá as portas para mudança de várias normativas, inclusive a contraditória resolução sobre avaliação no ensino fundamental, que, apesar de sérios problemas, ainda garante o apoio pedagógico.
Após o fim da pandemia emergirá o tamanho do problema acumulado na educação, tanto pelo engordamento das matrículas na rede pública em função da quebra da economia e o aumento do desemprego, bem como os traumas psicológicos devido ao isolamento social, perda de familiares, tanto dos estudantes como das profissionais de todo o magistério. Além disso, o aumento do abismo educacional entre os que tiveram acesso as aulas remotas e os que não. Serão muitos os desafios, dos quais o CME poderá ser apoio para superação, ou se tiver aprovação desse pacote do Gean, será o representante capataz para chicotear o lombo das trabalhadoras e trabalhadores da educação, bem como dos filhos da classe trabalhadora que tentam se desenvolver pelo uso da educação municipal.
Mensagens 03 e 04
A “mensagem 03” é uma proposta de 52 páginas, alterando o Plano Diretor da Cidade, sob o argumento de incentivar a criação de mais empregos. A “mensagem 04” segue na mesma linha (33 páginas), propondo alterações na lei do “Código de Obras”, sob alegação de desburocratizar e regularizar obras no município. Uma proposta de tamanha complexidade não pode ser tratada sem a devida seriedade, muito menos ser colocada para apreciação sem audiência pública, ouvindo e registrando publicamente os anseios da sociedade. Fica claro a lógica de “passar a boiada”, considerando o momento de crise e pandemia, sem qualquer proposição objetiva de salvaguarda e respeito a vida.
Colocar uma câmara de vereadores para analisar propostas de mudança de vagas de garagem, mezanino e passeio, enquanto explode o número de casos de covid em todo o país é só mais um exemplo do valor que Gean dá para vida da população de nossa cidade. Fica a reflexão.
A primeira parte do grande ataque na “Mensagem 05” – Da Reforma administrativa a destruição da COMCAP
Apresentando-se como se a gestão fosse “nova”, o executivo municipal encaminha uma reforma administrativa de 286 páginas, repetindo organizações anteriores referente as secretarias, mas também alterações estruturais que tanto retiram direitos dos trabalhadores da COMCAP, como aumenta a perseguição aos servidores, com alteração do estatuto do serviço público municipal no tocante as punições e medidas administrativas. Além disso, há o aumento ao erário, com a criação da Fundação Somar, autarquia vinculada diretamente ao gabinete do prefeito, com objetivo de formalizar o desmonte da própria Secretaria Municipal de Assistência Social que já vinha ocorrendo nos últimos quatro anos.
Aqui vale o questionamento do porquê há tantas propostas de alteração na composição de vários conselhos municipais, mas justamente o CME veio em mensagem separada. Parece que é interesse do executivo expor seu poderio em relação ao desmantelamento do CME, ação típica do “Narciso que acha feio o que não é espelho”.
Em vários momentos do texto, nas várias proposições, aparece de forma repetida e insistente questões relacionadas a “avaliação do seu desempenho econômico e financeiro e dos seus resultados pelo seu órgão supervisor”, o que parece conotar implicitamente a lógica meritocrática e empresarial.
É no artigo 13 que aparece pela primeira vez o reconhecimento da Fundação Rede Solidária Somar Floripa (SOMAR) enquanto autarquia e no decorrer do texto é proposto a institucionalização do voluntariado e sequestro de recursos por meio desta autarquia. Para entender melhor vale uma lida a partir do artigo 93, o qual institui a criação dessa entidade. O detalhe é que também fica visível o interesse do prefeito de tornar lei a fundação, não enquanto política de estado, mas exclusivamente uma política de governo, de modo que a “Somar” fica vinculada diretamente ao gabinete do Prefeito. Se efetivamente o interesse fosse de fortalecer a assistência social do município, no mínimo a tal fundação deveria estar subordinada a respetiva secretaria, projetando a melhoria do serviço para população a longo prazo. A realidade é que ela é simplesmente uma vitrine de propaganda do governo para auto promoção, já almejando voos maiores quando do fim de seu mandato.
A partir do artigo 166 começa o ataque aos direitos dos trabalhadores da COMCAP. A manobra desse ataque começou ainda em 2017, quando a empresa de caráter de Sociedade de Economia Mista foi transformada em Autarquia Municipal. Ocorreu que naquele momento, a lei 618/2017, em seu artigo 17 garantia que os futuros acordos coletivos respeitariam e valeriam para toda categoria, tanto os antigos empregados públicos, como os novos empregados estatutários. Ignorando todas as conquistas da categoria, agora é apresentado um conjunto de alterações para esta lei, institucionalizando a meritocracia no quadro funcional, além de retirar todos os direitos presentes nos artigos 6º da antiga lei, excluindo o artigo 7º e o antigo artigo 12, o qual, respectivamente, garantiam promoção por tempo de serviço de 4% a cada dois anos; e promoção por titulação, quando o servidor avançava de um nível de formação para o outro. Simplesmente esses direitos deixarão de existir para todos, caso o projeto de lei da mensagem 05 seja aprovado.
Seguindo o ataque, o artigo 169 revoga a parte da lei que regulamentava a jornada de 30 e 40 horas na COMCAP, além das horas extras e a data-base, ocorrida sempre em novembro. Com a revogação dessa lei, a data-base fica em maio, no sentido de tirar a força do movimento que sempre ocorre para pressionar o executivo a garantir condições dignas de trabalho na temporada de verão, momento de aumento expressivo da carga de trabalho.
Na sequência, o artigo 170 é simplesmente a REVOGAÇÃO, repito, revogação do Plano de Carreira dos trabalhadores e trabalhadoras da COMCAP. Uma luta histórica, que remonta o período de criação de nosso sindicato, concomitante a democratização de nosso país, vem sendo destruída já há bastante tempo. Com a transformação da empresa em autarquia, uma forte greve garantiu ao menos um plano de carreira e agora, com a revogação da lei 663/2019, simplesmente não existe mais perspectiva de carreira na COMCAP.
A segunda parte da Mensagem 05 e a instituição “Caça às Bruxas”
Em relação aos trabalhadores da PMF, a partir do artigo 187 há uma série de mudanças em seu estatuto com respeito as formas de punição, numa clara demonstração de avanço autoritário, aumentando as formas de sindicância e abertura de processos disciplinares. Estará aberta, com a aprovação dessa lei, oficialmente a temporada de caça às bruxas nos próximos quatro anos no serviço público municipal de Florianópolis.
O primeiro mandato do ditador Gean também foi marcado por perseguições políticas de seu governo a lideranças sindicais, diretoras e diretores escolares, e servidoras e servidores públicos que, ao defender o serviço público explicitavam as ingerências do executivo municipal. Muitas dessas perseguições não avançaram devido aos contrapesos previstos no estatuto dos servidores e servidoras municipais. Cortar fora elementos necessários que garantem hoje o direito a ampla defesa e ao contraditório é o foco da proposta atual do governo. Ora, se reconhecemos que há muito o que melhorar em nosso estatuto, por que não ouvir de fato nossa categoria? O que é prioridade, punir servidores contrários a posição política do governo ou garantir isonomia para as auxiliares de sala, que sequer são reconhecidas como profissionais do magistério? E os profissionais da saúde que estão saturados diante do expressivo aumento da carga de trabalho, trabalharão melhor sabendo que o estatuto foi alterado para realizar inquisições com os servidores e servidoras? As perguntas são retóricas, mas a aprovação desse pacote representará ainda mais prejuízo para população, com ainda mais sucateamento da prestação do serviço público.
Por fim, o trâmite por dentro da Câmara de vereadores deve ser breve, por isso a importância de fortalecermos a luta e não permitirmos o avanço de mais esse conjunto de ataques! Segunda Feira, às 7h haverá Assembleia da COMCAP, mas é preciso ampliar a luta com toda a categoria, com toda classe trabalhadora da cidade, pois o avanço dessa iniciativa do executivo não pode prosperar! O ano de 2021 será decisivo para toda a classe trabalhadora em todo o mundo. Aqui em Florianópolis, nossa primeira luta contra o governo Gean pode dar o ritmo do que nos aguarda!
[1] A MENSAGEM 06 trata da Manutenção de desconto de 20% no IPTU para pagamento até 20 de janeiro para quem não tiver pendência com a PMF.
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