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EDITORIAL

Mais um jovem negro assassinado pela PM do Rio de Janeiro; até quando continuaremos morrendo?

Por: Gabriel Santos, de Maceió, AL

Um morador no Morro Chapéu-Mangueira, no Leme, Zona Sul do Rio, foi morto na noite desta segunda-feira (17), após ser atingindo com dois tiros, um no peito e um na perna. Rodrigo Serrano tinha 26 anos, era casado há sete, tinha dois filhos, e esperava a mulher e a filha no alto da ladeira do Leme. De acordo com familiares, Rodrigo foi assassinado por policias da UPP, que confundiram o guarda chuva que Rodrigo carregava com um fuzil.

Durante a manhã de hoje, moradores protestaram pela comunidade contra a morte de Rodrigo e contra as violentas ações da Polícia Militar na região, pedindo o fim da UPP na comunidade. Muitos presentes no protesto carregavam guarda-chuva.

Nas redes sociais, em especial na página “Meu Leme meu Rio de Janeiro”, muitos criticavam o horário que a Polícia Militar realizava as operações na comunidade, afirmando que muitas são realizadas no horário em que crianças largam da creche e de escolas.

O sentimento de revolta, de indignação e a dor que os moradores do Morro Chapéu-Mangueira sentem é compartilhado por muitos, visto os constantes e sucessivos assassinatos que a PM carioca tem cometido ao longo do ano.

Sábado passado, dia 15, o Instituto de Segurança Publica, ISP, divulgou que, no mês de agosto, foram 175 pessoas mortas pela Polícia Militar no estado, o maior número desde que se começou a registrar as ocorrências, há 15 anos.

As vidas tiradas por conta de ações da Polícia Militar carioca não são apenas números e estáticas, mas são pessoas que tiveram suas vidas interrompidas por conta do braço armado do Estado.

São jovens que não chegam à vida adulta e têm seus sonhos interrompidos. São pais de famílias que deixam filhos e mulher. São as mães que choram ao ver o corpo do filho sangrando no chão. São crianças que crescem sem pai. A violência policial naturalizada segue matando e destruindo vidas e famílias.

O fato de um jovem negro carregando um guarda-chuva poder ser alvejado com tiros por parte do PM, que confundiram o objeto com um fuzil, mostra o racismo institucional sobre o qual a Polícia Militar atua. Um jovem negro é sempre suspeito. Parado na esquina com um objeto não identificado na mão, só poderia ser criminoso. O negro é sempre suspeito e criminalizado.

As constantes mortes de inocentes cometidas pela PM e o crescimento no número de assassinatos e de tiroteios nas comunidades cariocas após o início da intervenção militar mostra que a Polícia Militar atua como um tribunal de rua, tendo carta branca do Exército, do governo do estado, e do governo federal, para primeiro atirar e matar, para em seguida checar se o suspeito (porque todos negros pobres são suspeitos) era envolvido ao tráfico.

Em toda operação policial que termina com morte o roteiro é o mesmo. Caso o corpo negro assassinado não tenha passagem pela polícia, a PM lança uma nota lamentando e dizendo que foi mais um caso isolado. Caso existam antecedentes criminais, ou algum envolvimento com o tráfico de drogas, foi uma morte que merece ser comemorada, pois é um bandido a menos. Em todos os casos o corpo negro é descartável, de acordo com a lógica racista do Estado e da Polícia Militar.

Assassinar um traficante negro é melhor para o Estado do que manter ele no depósito de gente que são as prisões brasileiras, já que morto o jovem negro traficante não contribui para as superlotações das penitenciarias do país.

A política de guerra as drogas precisa acabar. Esta forma de lidar com as drogas gera somente mortes, superlotações das penitenciárias, criação e fortalecimento das facções criminosas e mais mortes, em um grande ciclo sem fim. Quem sofre com isso é a população negra e pobre, que mora no local de conflito entre facções e polícia militar, e é sujeito do mesmo confronto. Seja com o fuzil na mão, pelo lado da facção, ou usando a farda, pelo lado da PM.

É mais do que necessário mudarmos a lógica da segurança pública. A militarização da segurança não é a solução.

A intervenção militar no Rio de Janeiro também já se mostrou um fiasco, ela não serviu para acabar com o tráfico de drogas, mas pelo contrário, teve um aumento no número de assassinatos, crimes cometidos pela própria PM, e confrontos. Da mesma forma que as UPPs implantadas durante o governo do PT não servem para a resolução do problema de segurança pública.

Para que a lógica de segurança publica se modifique, uma das pautas é a desmilitarização da PM. A Polícia Militar precisa ter outro modelo de funcionamento, pois o modelo sob o qual a instituição funciona é racista e antidemocrática, não sendo compatível com as necessidades, nem com a democracia brasileira.

Porém, para que isso tudo ocorra, o modelo de segurança pública precisa deixar de ter os corpos negros como um alvo, de enxergar o negro morador de favelas e periferias como um inimigo em potencial do Estado. O Estado brasileiro tem, em sua formação, o racismo como algo estruturante e profundas modificações estruturais precisam ser feitas para que ocorram verdadeiras mudanças na forma de atuar do Estado e de suas instituições.

Agora é preciso dar um basta na escalada de violência no Rio de Janeiro, levantando a bandeira do fim da intervenção militar no estado, das UPPs, e da política de guerras. Também é preciso demonstrar toda solidariedade e apoio necessário à família de Rodrigo, para que sua morte não seja tratada apenas como mais uma estatística.

Vidas negras importam, vidas da favela e da periferia importam. Nossas vidas importam.