Por: Juliana Donato, de São Paulo, SP
O leite materno fornece todos os nutrientes que um bebê necessita nos seus primeiros meses de vida, além de anticorpos e proteção contra infecções respiratórias, evita casos de diarreia e diminui riscos de alergias. A médio e longo prazos, pode ter efeitos benéficos sobre a pressão arterial, níveis de colesterol e reduzir os riscos de ocorrência de doenças como a obesidade e diabetes. A amamentação traz benefícios também para as mulheres: auxilia o retorno do útero a seu tamanho anterior à gestação, protege contra o câncer de mama e de ovários e ajuda a proteger contra uma nova gestação nos primeiros meses.
Além de tudo isso, e não menos importante, a amamentação promove o vínculo afetivo entre a mãe e o bebê. Por isso, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que os bebês sejam alimentados exclusivamente com leite materno até os 6 meses de idade. Sem água, sem chá, só o leite materno mesmo. Após os 6 meses, o aleitamento materno continua sendo recomendado, de forma não exclusiva, até, pelo menos, os 2 anos de idade.
Amamentar pode ser bom, mas não é fácil. É um aprendizado para as mães e os bebês. Um aprendizado que pode ser bastante difícil e doloroso no início e, também por isso, precisa de incentivo e informação para que ocorra da melhor forma possível. O Brasil é considerado pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) uma referência em aleitamento materno, o que pode passar uma falsa boa impressão.
Mas a realidade é que, em todo o mundo, poucas crianças são alimentadas exclusivamente com leite materno por mais de algumas semanas. No Brasil, 61% das crianças de até 6 meses não são alimentadas exclusivamente com o leite materno. A duração média do aleitamento materno exclusivo é de 54,1 dias (o recomendado são 180 dias). Para melhorar este cenário é que foi criada a Semana Mundial de Aleitamento Materno, de 01 a 07 de agosto.
Por que os números da amamentação são tão baixos?
Apesar dos benefícios para mães e bebês, há muitos obstáculos para a amamentação, como a falta de informação e de políticas públicas. A maternidade e as mães são idealizadas pela sociedade, mas não nos dão as condições adequadas para que criemos nossos filhos. O direito de amamentar não pode ser exercido se não pensarmos em mudanças nas políticas sociais e no mercado de trabalho.
A maternidade leva muitas mães ao mercado de trabalho informal. Assim como o trabalho doméstico, as responsabilidades sobre os filhos recaem muito mais sobre as mães. Na medida em que não há creches públicas de qualidade e em número suficiente, muitas mães optam pelo mercado informal para terem jornada mais flexível. No entanto, o mercado informal não garante nenhum direito às mulheres. A licença maternidade de 6 meses é realidade para poucas. A maioria conta apenas com 4 meses ou nenhum e, assim, não conseguem amamentar seus filhos até os 6 meses de idade, como recomenda a OMS. Das 175 mil empresas que poderiam solicitar a extensão da licença para 6 meses, apenas 19 mil o fizeram até setembro de 2015.
Há também os mitos, a falta de informação e de atendimento adequado para as mães que amamentam. Muitas desistem porque acham que seu leite é “fraco”, que não dá conta da nutrição do bebê, ou que a quantidade não é suficiente, ou mesmo pela dificuldade dos primeiros dias. Além de tudo isso, a amamentação em público, além de não ser incentivada, muitas vezes é coibida ou até proibida.
Isso tudo é o retrato de uma sociedade que, ao mesmo tempo em que propagandeia a maternidade como algo belo e sagrado, não garante os direitos mais básicos das mulheres, das mães e das crianças. Uma prova recente foi a aprovação da reforma trabalhista que, dentre outros ataques aos nossos direitos, permite que as mulheres gestantes e lactantes trabalhem em locais insalubres.
Amamentação e feminismo
Uma certa controvérsia ronda a relação entre amamentação e feminismo. Amamentar é um ato feminista? Pode ser. Muitos fatores jogam contra a amamentação, apesar de todos os seus benefícios: a indústria do leite artificial e das papinhas industrializadas, a falta de políticas públicas, como a garantia da licença maternidade de 6 meses, entre outros. Amamentar é um direito coletivo não garantido, e exercê-lo e lutar para que todas as mulheres também possam fazê-lo deve fazer parte da luta feminista. Amamentar pode contribuir também para o conhecimento das mulheres sobre seu próprio corpo.
Mas, um alerta: criar um modelo da “mãe feminista” é completamente anti-feminista. Nem sempre amamentar é libertador. Pode ser o oposto quando torna-se uma prisão, um dever moral, ou quando reduz o papel social da mulher somente ou principalmente ao papel de mãe. Há mulheres que defendem o desmame guiado pelo desejo da criança ou a amamentação prolongada como uma forma de afirmar o direito à amamentação. E devemos ter este direito. Mas não pode ser um dever. Amamentar ou não e até quando fazê-lo deve ser uma escolha consciente da mulher, respeitando as suas necessidades e desejos.
Feminismo é, acima de tudo, sobre as mulheres poderem ser o que quiserem ser. É sobre poder escolher, poder dizer sim e poder dizer não e ser respeitada por isso.
Imagem: Reprodução Facebook
*Este artigo reflete a opinião da autora e, não necessariamente, a linha editorial do Esquerda Online
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