Nós nos dedicamos à resistência coletiva. Resistência contra a biolionária especulação imobiliária e sua gentrificação. Resistência contra os que defendem a privatização da saúde. Resistência contra os ataques aos muçulmanos e aos imigrantes. Resistência contra os ataques aos deficientes. Resistência contra a violência do estado perpetrada pela polícia e pelo sistema carcerário. Resistência contra a violência de gênero institucionalizada, especialmente contra as mulheres trans e negras. Angela Davis
A recente retirada de Joe Biden da corrida presidencial dos Estados Unidos lança luz sobre um cenário político profundamente desafiador. Sua longa trajetória como promotor de guerras, cúmplice de genocídios, aliado das grandes corporações, inimigo dos imigrantes e do meio ambiente, e uma constante decepção para a classe trabalhadora culmina em um fim político desonroso.
Joe Biden abre mão de sua candidatura em um contexto de muita pressão e dúvidas sobre suas capacidades cognitivas para continuar à frente da principal nação imperialista, os EUA. Dizer que tal recuo tem como pano de fundo a necessidade de derrotar Donald Trump e impedir seu retorno à presidência como principal representante do fascismo mundial é essencial para compreender a atual dinâmica política. Trump, com sua retórica inflamadora e políticas excludentes, representa um risco significativo à democracia e à coesão social não apenas nos Estados Unidos, mas globalmente.
Além disso, a renúncia de Biden e a indicação de Kamala Harris como candidata presidencial têm implicações financeiras significativas. A legislação americana estipula que, caso um novo nome seja indicado, o fundo de campanha eleitoral do Partido Democrata não poderá ser utilizado, o que explica, em parte, a escolha de Harris. Este cenário revela uma estratégia que visa preservar os recursos financeiros do partido, evitando um revés econômico que poderia comprometer a campanha.
Kamala Harris: Entre a Representatividade e a Prática Política
É fundamental analisar criticamente o papel de Kamala Harris neste contexto. Apesar de ser uma mulher negra e filha de imigrantes, atributos que, à primeira vista, poderiam sugerir uma representação autêntica da diversidade e inclusão, Harris não escapa da crítica mais profunda sobre suas políticas e alinhamentos. Sua identidade, embora importante, não deve ser vista como um substituto para um compromisso genuíno com as causas da classe trabalhadora.
A questão da representatividade de gênero e etnia no parlamento é de indiscutível importância para setores progressistas. No entanto, é crucial reconhecer que tal representatividade, quando desvinculada da luta de classes, corre o risco de ser instrumentalizada pela burguesia para manter o status quo.
Kamala Harris tem consistentemente apoiado políticas de imigração rigorosas, resultando em um aumento significativo no número de imigrantes detidos e crianças desacompanhadas nas fronteiras americanas. Este apoio a políticas que perpetuam a opressão e marginalização de imigrantes é emblemático de uma abordagem que serve aos interesses do imperialismo norte-americano, não aos dos grupos marginalizados ou da classe trabalhadora.
A questão da representatividade de gênero e etnia no parlamento é de indiscutível importância para setores progressistas. No entanto, é crucial reconhecer que tal representatividade, quando desvinculada da luta de classes, corre o risco de ser instrumentalizada pela burguesia para manter o status quo. Harris simboliza um falso avanço em termos de diversidade, já que representa políticas que não desafiam as estruturas opressivas do capitalismo e do imperialismo. Por essa razão, é um erro parte da esquerda comemorar a indicação de seu nome apenas pela justificativa de ser uma mulher negra. Sua posição política revela uma continuidade das práticas imperialistas e neoliberais que não servem aos interesses da classe trabalhadora.
O Limite da Representatividade e a Apropriação Neoliberal
A representatividade é frequentemente entendida como a presença efetiva e proporcional de grupos diversos em várias esferas da sociedade, especialmente nos espaços de poder e decisão. No entanto, quando analisada pela perspectiva do feminismo negro, a representatividade vai além da simples presença. Trata-se de garantir que as experiências e perspectivas políticas das margens sejam integradas e influenciem as decisões. Essa abordagem visa combater a marginalização e assegurar que as vozes dos grupos oprimidos disputem efetivamente os espaços de poder.
O problema surge quando o neoliberalismo se apropria dessa ferramenta política, esvaziando seu significado original e transformando-a em uma agenda de diversidade que pouco ou nada altera as estruturas de poder. Kamala Harris exemplifica esse fenômeno. Embora sua identidade como mulher negra e filha de imigrantes possa sugerir uma representatividade significativa, suas políticas perpetuam as práticas imperialistas e neoliberais que caracterizam a administração Biden.
Um outro exemplo desse esvaziamento da representatividade pode ser observado no Brasil, onde deputadas mulheres apoiaram um projeto de lei que equipara abortos acima de 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples. Entre os 33 deputados autores do projeto, 12 são mulheres. O projeto de lei 1904/2024, que foi aprovado com caráter de urgência na Câmara, gerou indignação e protestos por parte de movimentos feministas e de direitos humanos. Esse apoio a um projeto que vulnerabiliza ainda mais meninas vítimas de abuso sexual exemplifica como a presença de mulheres em posições de poder não garante, por si só, um compromisso com a defesa dos direitos das mulheres e outros grupos marginalizados.
A administração Biden-Harris não conseguiu construir uma base sólida de apoio entre a classe trabalhadora, agravada pelo contínuo apoio ao genocídio dos palestinos em Gaza por Israel. Este posicionamento alienou muitos jovens eleitores e desmascarou a promessa de que “nada mudará fundamentalmente”, enquanto as condições sociais e econômicas se deterioram.
No Brasil, é imperativo que ativistas, especialmente mulheres negras, não se emocionem com a candidatura de Kamala Harris. Apesar de sua identidade como mulher negra, suas políticas continuam a prática imperialista dos Estados Unidos. A luta por justiça social e igualdade exige representantes comprometidos com a transformação real, não apenas figuras simbólicas de diversidade.
No Brasil, é imperativo que ativistas, especialmente mulheres negras, não se emocionem com a candidatura de Kamala Harris. Apesar de sua identidade como mulher negra, suas políticas continuam a prática imperialista dos Estados Unidos. A luta por justiça social e igualdade exige representantes comprometidos com a transformação real, não apenas figuras simbólicas de diversidade.
Contudo, precisamos acompanhar de perto o desenvolvimento das eleições norte-americanas e, se possível, intervir para garantir que Kamala Harris ou outro candidato do Partido Democrata seja eleito. Isso se torna crucial para impedir o retorno do principal representante do fascismo mundial, Donald Trump, no coração do imperialismo. A derrota de Trump e do que ele representa é uma prioridade, não apenas pela política interna dos EUA, mas pelos impactos globais de suas políticas excludentes e discriminatórias.
Em conclusão, a necessidade de uma liderança que verdadeiramente represente as mulheres, especialmente as negras, bem como a comunidade LGBTQIPN+, as pessoas com deficiência, os imigrantes e tantas outras facetas essenciais que, juntas, formam a espinha dorsal da classe trabalhadora, é premente. Devemos ser críticos e vigilantes, evitando comemorar ascensões apenas pela representatividade simbólica, que perpetua estruturas opressivas. A verdadeira emancipação e justiça dos setores oprimidos, com especial destaque para as mulheres negras, só podem ser alcançadas por meio de um compromisso inabalável com a transformação estrutural e a defesa dos interesses da classe trabalhadora, já que esses setores são partes constitutivas da classe e não existem para além dela.
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