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MOVIMENTO

O que os estudantes têm a ver com a greve dos técnicos e docentes das universidades federais?

Marina Amaral - Diretora de Movimentos Sociais da UNE e da Coordenação Nacional do Afronte!
Sintufepe UFPE

No último mês de março se iniciou a greve nacional dos Técnico-Administrativos das Universidades Federais. Já são centenas de universidades e institutos federais espalhados pelo Brasil em que a categoria dos técnicos entrou em greve em um processo de muita mobilização e assembleias lotadas. Os Técnicos Administrativos em educação de fato são uma das carreiras mais desvalorizadas do serviço público, estando há anos sem reajuste digno. Os TAE’s conseguiram abrir mesa de negociação com o governo, mas avaliam que a proposta apresentada foi bastante rebaixada, sendo apenas o aumento linear já oferecido para as demais carreiras, de 4,5% em 2025 e 2026, não sendo suficiente considerando a defasagem do salário comparado aos demais setores do funcionalismo público. A PF e a PRF, por exemplo, receberam reajustes que podem superar 20%.

Diante deste cenário, a Fasubra (Federação de sindicatos dos trabalhadores técnicos administrativos em educação das instituições de ensino superior no Brasil) declarou greve desde o dia 11/03, e mais recentemente, o Sinasefe (Sindicato nacional dos servidores da educação básica, profissional e tecnológica) também aderiu a greve neste início de abril, unificando a categoria dos TAE’s e fortalecendo a mobilização da categoria.

Entre os docentes, março foi o mês da construção de assembleias nas seções sindicais do ANDES (Sindicato nacional dos docentes das instituições de ensino superior), aferindo a opinião da categoria. A partir disso, existe um indicativo de adesão nacional à greve, a se iniciar no dia 15 deste mês de abril. A pauta central também é a de reajuste salarial, em que os docentes apresentam a necessidade de 7,06% para repor as perdas da categoria desde o governo Temer.

É importante destacar que, em que pese que a pauta de salário seja a central, existem outras pautas importantes para toda a categoria da educação, e que também são de interesse dos estudantes. São várias as pautas que unificam nossas lutas, como a necessidade de revogação de toda medida herança do golpe que ataca a educação e os servidores públicos, como a própria reforma administrativa, e a recomposição total do orçamento das universidades, para que os IE’s tenham seu pleno funcionamento estrutural, assim como a garantia do seu tripé de ensino, pesquisa e extensão.

Caso se confirme a principal hipótese e seja deflagrada a greve docente no dia 15 de abril, as aulas nas universidades estarão suspensas. Essa é a principal preocupação atual da maioria dos estudantes do ensino superior público. Nesse sentido, fica a reflexão: qual postura deve ter o movimento estudantil diante da iminência da greve?

Existem muitos sentimentos no ME sobre a atual greve. Quero aqui neste texto trazer alguns elementos importantes para acumular no debate. A primeira é que toda categoria de trabalhadores têm direito a greve e é dever do movimento estudantil apoiar toda mobilização que valorize a educação e seus trabalhadores. Além disso, o pleno funcionamento da pesquisa, ensino e extensão, assim como o atendimento à permanência estudantil nas Instituições de Ensino Superior dependem diretamente do trabalho dos técnicos. Portanto, é fundamental considerar legítima uma greve que pauta melhorias para as categorias e que também pauta sobre o orçamento das universidades.

Considerar a mobilização legítima, não significa dizer que o conjunto dos estudantes também esteja mobilizado ou que exista correlação de forças entre os discentes para uma greve estudantil nacional neste momento. Na verdade, grande parte desses estudantes, que tiveram a experiência da pandemia durante a sua graduação, têm uma maior ânsia de se formar e não atrasar os seus estudos. Apesar desse elemento objetivo, não considero que este seja o principal motivo para não haver mobilização estudantil para uma greve discente. O principal fator, é de fato, político.

O movimento estudantil veio de uma série de derrotas pós golpe, aprofundadas durante o governo Bolsonaro, que elegeu a educação e as universidades públicas como seus principais focos de ataques. Foram inúmeros retrocessos: ataques à ciência, corte de verbas e redução no orçamento, nomeação de interventores, que perseguiram ativistas; e a longo prazo, um projeto de pôr fim às universidades públicas. O movimento estudantil precisou ser firme e resistir a esses ataques. Mas foram lutas defensivas e várias derrotas pesaram.

Com a vitória democrática de Lula, conseguimos interromper um horizonte de barbáries,. Mesmo com diversas contradições do atual governo – inclusive na educação – é preciso reconhecer que o governo realizou iniciativas que representam de fato as primeiras vitórias dos últimos tempos para a educação brasileira: aumento das bolsas estudantis, ampliação e renovação da lei de cotas, criação de novos IF’s e a segurança de que as universidades públicas seguirão existindo. Esse signo de vitórias, ainda que parciais, faz com que as principais experiências dos estudantes com o atual governo Lula sejam de vitórias e não de derrotas, pois foi criado um outro parâmetro em comparação ao governo Bolsonaro. Dito isso, é preciso entender a realidade do Movimento Estudantil em cada universidade e buscar aproveitar esse processo para disputar entre os estudantes que a nossa mobilização é uma forma de conquistar mais vitórias.

Como aproveitar a greve dos TAE’s e docentes para iniciar também uma mobilização entre os estudantes?

Partir da caracterização de que está mais difícil organizar os estudantes em torno de uma greve neste momento, não significa ficar de braços cruzados ou apenas “ir pra casa” durante uma possível suspensão das aulas. Desde já, é papel do movimento estudantil utilizar do momento político nas universidades para mobilizar a base dos estudantes, defender os interesses estudantis, e fazer o grande debate político em defesa da educação e das universidades públicas.

  • As entidades neste momento, devem convocar assembleias estudantis, dos cursos, das universidades, para acumular com o conjunto dos estudantes a posição discente sobre uma greve da categoria. Além disso, é fundamental aproveitar esses espaços para debater os principais temas de cada universidade: permanência estudantil, políticas afirmativas, iniciações científicas, melhorias nas bancas de heteroidentificação, restaurantes universitários, interiorização das universidades, e todos temas que são fundamentais para o conjunto dos estudantes, sejam eles de competência do governo federal ou de legislação da própria universidade;
  • O movimento estudantil organizado deve estar conectado com a base estudantil, as entidades e o sentimento do conjunto dos estudantes, referendado pelo seus espaços legítimos. Organizar ações que refletem apenas interesses de seus coletivos, buscando suas autoconstruções, não ajuda a mobilizar os estudantes, ao contrário, atrapalha e os afasta da luta estudantil;
  • Podemos utilizar este momento da greve para defender em conjunto com os três setores as demandas das universidades públicas, como a recomposição total orçamentária. Queremos mais dinheiro para a educação e menos dinheiro para o centrão! Hoje o centrão controla grande parte do orçamento do país e chantageia o governo com sua política, fazendo com que o orçamento da educação também seja sufocado. A recomposição total do orçamento das universidades deve ser uma exigência das três categorias ao governo federal, que precisa fazer a escolha de colocar a educação e seus trabalhadores em primeiro lugar. Além disso, é preciso exigir do MEC uma postura ativa nessa luta, rompendo a paralisia e subordinação à agenda das fundações liberais;
  • Devemos construir o dia 09 de abril como dia nacional de luta pela educação. A União Nacional dos Estudantes está convocando atos pelo país em defesa da educação, contra o novo ensino médio, e pela recomposição orçamentária das universidades. Independente da greve, esse é um dia em que os estudantes do Brasil devem se organizar e pautar o debate com o conjunto da sociedade. Com a iminência da greve, essa mobilização se torna ainda mais importante, inclusive para dizer aos técnicos e professores, que os estudantes sempre apoiaram as suas pautas, e que é de necessidade igual que as categorias abracem as pautas estudantis.

A mobilização dos estudantes certamente será diferente em cada universidade e em cada curso. O fundamental, é que a articulação do movimento estudantil para aproveitar deste momento político seja capaz de, mais uma vez, dizer que os estudantes foram e estarão sendo linha de frente nas lutas em defesa da educação pública e das nossas pautas históricas.