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BRASIL

O que falta na reforma tributária?

Os petistas comemoram a vitória do governo. Foi, sim, uma vitória. Mostrou que o governo consegue maioria na Câmara – ainda que o preço, na liberação de verbas para o Centrão, tenha sido pra lá de salgado. Mas a reforma aprovada é aquela de que o Brasil precisa?

Luis Felipe Miguel, professor de Ciência Política da UnB
Valter Campanato/Agência Brasil

A reforma aprovada na Câmara parece ampliar a racionalidade do sistema tributário brasileiro. Reduz algumas inconsistências e impõe obstáculos a absurdos como as guerras fiscais entre os estados.

Mas restam brechas para os lobbies, em tudo aquilo que não foi regulamentado. Quais setores se beneficiam com tributação reduzida, dada sua relevância social? Quando se lê que Marcelo Freixo se movimenta para incluir agências de turismo na lista, dá para ver que há muito espaço para desvirtuação.

E produtos prejudiciais a saúde ou ao meio ambiente podem ser sobretaxados. Alguém acredita que o governo que torrou centenas de milhões de reais para subsidiar as montadoras vai incluir o automóvel nessa lista?

O (pequeno) efeito redistributivo esperado da reforma vem, uma vez mais, da transferência da classe média para os mais pobres.

A progressividade no imposto sobre herança é bem vinda, mas faltou mexer nas alíquotas ridiculamente baixas praticadas no Brasil.

A direita está fazendo do tema um cavalo de batalha – quem tem a paciência de acompanhar as redes sociais dos Bolsonaros sabem. O espetáculo de pobres defendendo herdeiros, de gente que não tem nada indignada porque bilionários poderiam ter que pagar para receber as fortunas legadas por seus antepassados, é outro monumento à estupidez humana. Eles andam bem frequentes nesses últimos tempos.

Mesmo a tributação de barcos e aeronaves particulares, apresentada como grande avanço, é cheia de exceções e permite muitas maracutaias dos proprietários – em suma, pode não dar em quase nada.

Falta à reforma mexer nos ganhos de capital, nos dividendos hoje isentos de impostos, na remessa de lucros para o exterior, nas grandes fortunas, no latifúndio.

Tributação é luta de classes. A reforma tributária de que o Brasil precisa depende de organização e enfrentamento. Não virá das mãos de Lira.

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