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Assédio eleitoral: uma breve abordagem jurídica deste crime e medidas preventivas e de combate

Aderson Bussinger

Advogado, morador de Niterói (RJ), anistiado político, diretor do Centro de Documentação e Pesquisa da OAB-RJ e diretor da Afat (Associação Fluminense dos Advogados Trabalhistas).

Antes de adentrar no tema do assédio eleitoral no local de trabalho, é importante dizer que, mesmo fora do trabalho, em qualquer lugar, até nas forças armadas, onde a disciplina é gigantesca, o empregador, superior hierárquico, civil ou fardado, não possui qualquer poder de ingerência sobre a sua consciência política e, em termos eleitorais, no seu voto, ou mesmo no seu direito de se candidatar, se assim for da sua vontade.

Isto, embora saibamos dos abusos, decorre do direito constitucional de liberdade de consciência, de expressão e de orientação política (CF/1988, art. 1o, II e V; 5o, VI, VIII), que resguarda o livre exercício da cidadania, do seu direito de escolha, por meio do voto direto e secreto, que assegura a liberdade de escolha de candidatas ou candidatos, no processo eleitoral.

Dito isto, passemos ao local de trabalho e ao emprego, mais pormenorizadamente:
O exercício do poder do patrão não é ilimitado, e tem suas balizas e contenções na CLT e no próprio contrato de trabalho e, para se ter uma ideia, ainda que, por mais absurdo que fosse, o contrato de trabalho viesse a prever o controle da consciência política, qualquer influência patronal no voto do empregado, isto seria nulo de pleno direito, pois cercearia a liberdade de consciência acima mencionada.

Enfim, é ilícita qualquer prática que exclua ou impeça, cause restrição direta ou indiretamente a liberdade do voto de cada um.

Portanto, conforme vem propagando o Ministério Público do Trabalho e a própria Justiça eleitoral, ” ameaças a trabalhadores para tentar coagir a escolha em favor de um ou mais candidatos ou candidatas podem ser configuradas como prática de assédio eleitoral e abuso do poder econômico do empregador”, o que é tanto crime eleitoral, como também ilício trabalhista, passível de punição, até prisão do empregador, bem como indenização e multas.

A concessão ou a promessa de benefício ou vantagem em troca do voto, bem como o uso de violência ou de coação para influenciar o voto são crimes eleitorais, que estão previstos nos artigos 299 e 301 do código eleitoral.

E este tipo de atitude viola, de uma só vez, os próprios fundamentos da República, dentre outros, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e o pluralismo político (CF/1988, art. 1o, II, III, IV e V);

Em verdade esta proteção á liberdade de consciência política decorre da própria Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, conforme o seu artigo 18(liberdade de convicção política)

No caso do empregado, o manejo ilícito do contrato de trabalho para o exercício ilícito de pressão ou mesmo privação de direitos eleitorais, além de crime eleitoral, conforme acima assinalado, é comportamento patronal que importa em transgressão da denominada função social do próprio contrato, conforme se depreende do Constituição Federal em seus art. 5o, XXIII e o art. 170, III.

Em resumo, o poder diretivo do empregador não pode impedir jamais o exercício dos direitos de liberdade, não discriminação, expressão do pensamento e exercício do voto, sendo que o abuso do poder diretivo viola o valor social do trabalho, fixado como fundamento da República no art. 1o, IV, previsto como direito social fundamental nos arts. 6o e 7o, e como fundamento da ordem econômica, também previstos na C. F. (art. 170, “caput” – e – art. 190).

Vejamos alguns exemplos:

1- A concessão ou promessa de benefício ou vantagem em troca do voto, bem como o uso de violência ou ameaça com o intuito de coagir alguém a votar ou não votar em determinado(a) candidato(a), como dito, configuram atos ilícitos e fatos tipificados como crimes eleitorais, conforme artigos 299 e 301 do Código Eleitoral.

Além de crime eleitoral, as práticas configuram assédio eleitoral laboral.

2- O artigo 297 do Código Eleitoral tipifica como crime, cominando pena de detenção de até seis meses, o ato de “impedir ou embaraçar o exercício do sufrágio”.

O artigo 237 do Código Eleitoral prevê que “a interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos”.

3- O(a) empregador(a) tem o dever de conceder o período necessário para que o(a) empregado(a) possa votar, sem efetuar quaisquer descontos na remuneração do(a) trabalhador(a).

4- O voto, direto e secreto, é um direito fundamental do cidadão protegido pela Constituição Federal como livre exercício da cidadania, da liberdade de consciência, de expressão e de orientação política. Portanto, cabe a cada eleitor/empregado tomar suas próprias decisões eleitorais baseado em suas opiniões e vontade, sem ameaças, do patrão, dos gerentes, chefes, ou seja, de quem for.

Outro aspecto importante é que, desde que sua comunicação e expressão nas redes sociais não pode sofrer ingerência do empregador, sendo apenas vedado que você ataque moralmente o empregador ou a marca da empresa, estando este direito de expressão também protegido pelos preceitos legais e constitucionais acima mencionados.

O que significa dizer que você pode fazer propaganda livremente para os seus candidatos, somente não aconselhando que não o faça com o uniforme da empresa, pois poderá ser interpretado como exposição da marca e do negócio em favor de uma candidatura ou partido.

São cuidados importantes, mas de modo geral é livre a propaganda por parte do empregado, sendo que, em relação aos uniformes, manifestações sindicais em que estejam presentes vestidos com o uniforme de trabalho não pode ser objeto de restrição, pois se trata de reunião sindical, trabalhista, com o propósito definido de reivindicar.

Por fim, quando da ocorrência destes ilícitos e crimes, deve-se procurar imediatamente o sindicato de sua categoria, o diretor sindical ou o advogado da entidade, promover-se uma queixa tanto junto à Delegacia de Polícia, como ao Ministério Público do Trabalho e ainda perante o Ministério Público Eleitoral.

E posteriormente, a par das apurações, é possível condenar o empregador a indenizar o empregado, retratar-se e lhe pagar uma quantia pelo ilícito cometido.

É preciso também estar atento para solicitação de número de sessão eleitoral, cópia de titulo eleitor, pois tudo isto pode ser um indício de que se pretenda controlar seu voto, o que é maquis difícil em função do sigilo, mas pode-se pretender dar o entender ao empregado de que pode controlar seu direito de escolha.
Compra de votos é crime, conforme acima esclarecido, e, uma vez ocorrendo a tentativa, procure documentar, gravar este tipo de promessa, etc.

* Aderson Bussinger é advogado sindical, diretor de pesquisa e memória da OAB-RJ