Com menos de um trimestre para seu fim, o ano de 2021 não nos deixará saudades. O avanço descontrolado da pandemia, que recentemente completou a triste marca de 600 mil mortes no país, foi fruto da ação direta de Jair Bolsonaro e sua sistemática sabotagem à campanha de vacinação contra a Covid-19. No plano econômico, a condução da política neoliberal por Paulo Guedes reduziu à extrema pobreza milhões de famílias brasileiras, recolocando o país no mapa da fome.
Enquanto agentes a serviço do capital especulativo, que fazem fortuna a partir da miséria de tantos explorados e exploradas, nada disso nos espanta. Mas, o que dizer dos políticos que se dizem de oposição a estes execráveis senhores, progressistas no discurso mas que, na prática, emulam aquelas mesmas políticas que estrangulam a classe trabalhadora? No Recife, o seu jovem prefeito se enquadra nesse perfil, seu nome é João Campos (PSB-PE), herdeiro de um dos clãs mais tradicionais da política regional.
Campos, eleito como um dos mais jovens prefeitos de capitais, segue fielmente alinhado à política neoliberal vinda de Brasília. Em junho deste ano, um projeto de sua autoria que tratava da reforma previdenciária do funcionalismo municipal (conforme relatamos aqui) foi aprovado em regime de urgência, isto é, com prazos reduzidos para debate no legislativo da cidade. Tal projeto, mais draconiano que o análogo aprovado à nível federal, em 2019, implicou na redução de salário dos milhares de servidores e servidoras da cidade, que desde 2020 tiveram seus salários congelados, mas tiveram suas alíquotas de contribuição ajustadas.
Mais recentemente, um novo projeto também de sua autoria, pretende transferir pouco mais de 700 servidores aposentados do fundo financeiro ligado ao serviço público municipal, mas que é deficitário, o RECIFIN, para o fundo previdenciário municipal, o RECIPREV, este, superavitário. A manobra, que geraria um alívio aos cofres da prefeitura, representa um grave risco à previdência dos servidores e servidoras do Recife. Tal iniciativa legislativa já havia sido tentada pelo antecessor de Campos, Geraldo Júlio, de seu mesmo partido, mas fora rejeitada pelo TCE.
Outra prova de que o bisneto de Miguel Arraes pouco tem de socialista é a recente nomeação de Alexandre Benedito Pessatte Filho para cargo no secretariado municipal. Pessatte Filho tem em seu currículo passagem como assessor para assuntos de privatização no governo Bruno Covas (PSDB-SP), falecido em maio deste ano. Além dele, outros especialistas em privatizações compõem o grupo a serviço de Campos vindos tanto do setor público quanto da iniciativa privada. E na mira deles já se encontram equipamentos públicos como o ginásio de esportes Geraldão, os parques públicos da cidade e, inclusive, o próprio prédio da prefeitura.
Não bastasse isso, na área da educação, Campos também se destaca como inimigo das professoras e professores municipais. Além de não cumprir o piso nacional da educação, a gestão truculenta do secretário Frederico Amâncio impôs o retorno às aulas presenciais em um momento em que a pandemia ainda apresentava dados elevados de contaminação e mortes. Em sua defesa, o sindicato dos professores do Recife, Simpere, aprovou em resolução que os professores manteriam as aulas em formato remoto até completarem seu ciclo de imunização com a segunda dose de vacina. Em represália, toda a diretoria do sindicato foi ameaçada com multa diária elevada e até mesmo prisão. Mesmo após acordo para retornarem às aulas presenciais, os professores que seguiram a resolução do sindicato tiveram descontados seus dias em ensino remoto.
Com a campanha salarial fortemente prejudicada pela duração da pandemia, que serve como justificativa para os gestores públicos em todo o Brasil congelarem os salários dos servidores, a prefeitura do Recife se aproveita também do fim de ano que se aproxima e, na primeira mesa de negociação em meses, faz a ridícula proposta de 1,02% de aumento, a contar a partir de janeiro de 2022. Um verdadeiro escárnio! Geraldo Júlio encaminhou ainda em 2020, no auge da pandemia, um projeto de aumento no salário do próximo prefeito na margem de 70,8%, aprovado pela Câmara Municipal com ampla maioria. Campos, seu correligionário, sucessor e, portanto, beneficiário desse aumento, deixou de ganhar pouco menos de R$15.000, para embolsar R$ 25.000.
Diante do cenário acima apresentado, com a convergência de ataque tanto do governo federal quanto do governo municipal, a única saída que se apresenta é o chamado à greve dos servidores através das diferentes representações sindicais do município contra essa agenda neoliberal do PSB-Campos. Contudo, a relação ambígua da presidência do maior sindicato do funcionalismo do Recife, o Sindsepre, com a gestão municipal, dificultou um posicionamento mais ativo desse sindicato contra, por exemplo, a votação da reforma da previdência municipal, em junho passado. O Sindsepre é presidido por Osmar Ricardo (PT-PE), vereador do Recife. Ricardo, no entanto, é conhecido por ser de uma ala do partido mais próxima ao PSB.
Para a próxima assembleia sindical, marcada para segunda-feira, 18, é imperativo que a direção do sindicato cumpra seu dever em defesa da base, com uma postura inequivocamente independente e combativa frente a Prefeitura do Recife, na defesa de uma pauta que reivindique a reposição das perdas geradas pela inflação no acumulado dos anos 2020-2021, além disso, que a atual gestão municipal honre os acordos assinados na ocasião da campanha salarial de 2020 e que foram suspensos por recomendação do TCE.
Compreendemos assim que, se a prefeitura não cumprir tais acordos e ainda insistir em empurrar esse debate para 2022, defendemos que o único caminho que restará será a união em torno da greve no serviço público municipal.
*Servidor do Recife e militante da Resistência/PSOL.
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