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BRASIL

Prefeito do Recife, João Campos (PSB), ataca servidores municipais com reforma neoliberal da previdência

Diogo Diniz*, de Recife, PE

Servidores protestam desde o dia 14, em frente à Câmara Municipal

Foi aprovada nesta segunda-feira (21) a reforma da previdência dos servidores públicos do Recife, com 32 votos favoráveis e sete contrários. Nesta terça-feira (22), haverá uma segunda votação, sem a possibilidade de emendas, e a previsão é que o placar se mantenha.

O projeto, que foi enviado à Câmara Municipal e tramitou em regime de urgência, foi mais um duro golpe contra o serviço público. A justificativa dada pelo governo João Campos (PSB) é que o município precisava se adequar à reforma previdenciária aprovada pelo governo Jair Bolsonaro em 2019, para que tivesse acesso a recursos federais. Contudo, como os vereadores da oposição de esquerda argumentaram, a Câmara teria até novembro para fazer um debate mais aprofundado sobre a matéria, ouvindo o Conselho de Previdência, servidores e sindicatos. Com a aprovação da tramitação em regime de urgência, os prazos para discussão caíram para cinco dias. 

Passados pouco mais de seis meses desde que assumiu a prefeitura do Recife, João Campos enviou à Câmara Municipal um projeto ainda mais duro de reforma da previdência que aquele aprovado em âmbito federal. Em 2019, quando o atual prefeito era deputado, ele havia se posicionado contrário à reforma análoga enviada ao Congresso Nacional. Na ocasião, João Campos disse que se dez votos tivesse, dez vezes ele votaria contra a reforma que retirava direitos dos trabalhadores. Agora, apenas dois anos depois e chefe de um poder Executivo, Campos impõe uma reforma ainda mais severa, valendo-se de sua ampla base de apoio no Legislativo local, num projeto que modifica a Lei Orgânica do Município e que impacta sobremaneira a vida das servidoras e servidores. 

Servidores protestam em frente à Câmara do Recife

As contradições continuam. Durante a campanha eleitoral de 2020, Campos tentou emplacar uma imagem de gestor moderno. Eleito como um dos mais jovens prefeitos de capitais, uma de suas promessas de campanha foi a igualdade de gênero no alto escalão das secretarias do município, afirmando que metade delas seria comandada por mulheres. A sua reforma da previdência, porém, é especialmente severa com as servidoras, estabelecendo um aumento de seis anos na idade de aposentadoria para mulheres, ao passo que a dos homens sobe em mais 4 anos. Ponto este, como inclusive argumentaram os vereadores da oposição, que é discricionário ao gestor público. A vereadora do Recife Dani Portela (PSOL) destacou que a opção por mexer na idade dos servidores foi uma decisão política do prefeito.

Outra das propostas da reforma é o aumento da alíquota de contribuição para o fundo previdenciário do Recife, o Reciprev, hoje fixado em 12,82%, já uma das mais altas do país, e que agora sobe para 14%. Num contexto de crise econômica fortemente agravada pela pandemia do novo coronavírus, do elevado índice de desemprego, da pressão inflacionária e com o congelamento dos salários dos servidores durante 15 anos, tal medida constitui, na prática, redução do salário no funcionalismo. Uma das propostas de emenda ao texto da reforma foi a de instituir uma alíquota progressiva, em que os servidores que recebessem mais contribuiriam com mais. No entanto, essa emenda foi rejeitada, assim como todas as outras 89 emendas que visavam mitigar os efeitos mais severos da reforma. O texto aprovado foi o mais duro possível.

Com tudo isso, chama atenção também o fato de que o ex-prefeito do Recife, Geraldo Júlio, do mesmo partido do atual, o PSB, e possível nome para o governo do estado de Pernambuco em 2022, ter chegado a afirmar há 3 anos, durante as discussões sobre a Reforma Previdenciária do Governo Federal, que o município não precisaria passar por uma reforma da previdência por estar em uma “situação privilegiada, como poucas cidades do país”, cujo fundo, diga-se superavitário, possuía R$ 1,5 bilhão de reais em reservas. 

Entre os vereadores que votaram a favor da reforma, dois chamam atenção por serem do PCdoB, são eles a vereadora Cida Pedrosa e o vereador Almir Fernando. Embora o PCdoB seja da base aliada da atual gestão, havia a expectativa de que eles votassem contra devido ao posicionamento crítico do partido na ocasião da reforma de Bolsonaro. Durante a semana, ao ser questionada pela mídia local sobre que posição iria tomar, Pedrosa limitou-se a dizer que isso seria decidido internamente, com o partido. 

A resistência dos servidores do Recife

Diante de tudo isso, vários servidores e servidoras passaram a semana mobilizados em ocupação permanente desde o dia 14 de junho, no pátio da Câmara Municipal, resistindo às fortes chuvas que atingiram a cidade nos últimos dias e mesmo com a pandemia em curso, para tentar conquistar o apoio de vereadores contra essa reforma. Vários protestos também foram realizados ao longo da última semana, com queima de pneus em várias vias do centro da cidade, porém, estranhamente, o maior sindicato de servidores do município, o Sindsepre, insistiu apenas nessa tática e não deliberou encaminhamento de greve com as suas bases. Ao contrário de outro sindicato do funcionalismo municipal, o Sindicato dos Professores do Recife (Simpere), que encontra-se em estado de greve desde o fim de abril.

Vale lembrar também que, no Recife, o dia 29 de maio, data nacional do #29M contra Bolsonaro, foi marcado por uma violenta repressão policial, com dois casos de trabalhadores que perderam, cada um, a visão de um dos olhos por disparos efetuados pela polícia. Polícia esta que está sob o comando do Governo do Estado, de Paulo Câmara. Do mesmo PSB que agora agride os direitos dos servidores do Recife.

*Servidor do Recife e militante da Resistência/PSOL.