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BRASIL

O conto de Maia

Gibran Jordão*
Foto Cleia Viana/Câmara dos Deputados

No final do ano passado, Rodrigo Maia, do DEM, contou! E muita gente acreditou que estava sendo construído um “bloco democrático” para a disputa da Presidência da Câmara. Que teria à frente Baleia Rossi do MDB, e que seria um gesto de grandeza que setores da direita e da esquerda estivessem juntos para não deixar a Câmara ser um puxadinho do Palácio do Planalto. Essa prosa causou estranheza, pois o bloco de Maia não tinha disposição pra analisar as dezenas de pedidos de impeachment. Defendeu uma pauta contra os interesses dos trabalhadores e é composto por muitos dos “engenheiros” do golpe de 2016. Essa gente estava falando de bloco democrático?!

O bloco de Maia começou a ganhar adesão, afinal eram MDB, DEM e PSDB juntos. Doria chegou a promover evento com a candidatura de Baleia Rossi em São Paulo. Com a popularidade em viés de queda, a articulação de Maia preocupou Bolsonaro e todo Planalto. O conto de Maia ganhou, inclusive, audiência na opinião pública, artistas progressistas se posicionando, simpatizantes começavam a cobrar uma posição dos partidos de esquerda. O PCdoB, PDT e PSB (embora alguns ficaram com Lira) foram os primeiros a aderir ao bloco de Maia.

O PT se dividiu entre aqueles que propunham aderir ao bloco de Lira (Pasmem!), aqueles que defendiam aderir à candidatura de Baleia Rossi, e aqueles que defendiam uma candidatura unitária da esquerda (o que seria o mais correto!). Mas os parlamentares do PT preferiram aderir ao conto de Maia. Para quem conhece a esquerda pragmática, isso não é uma novidade.

Incrivelmente, o Psol se dividiu entre aqueles que propunham uma adesão ao conto de Maia, e aqueles que defendiam que a esquerda deveria ter uma candidatura que tivesse voz no plenário para defender a pauta dos trabalhadores, os direitos democráticos, a exigência por vacinas, a continuidade do auxílio emergencial e o impeachment. O Psol acabou optando pelo lançamento da candidatura de Luiza Erundina, para cumprir o papel que deveria ser de uma candidatura independente e unitária de toda esquerda. Mas, infelizmente, até dentro do Psol tivemos vozes que se iludiram com os “princípios democráticos” da turma de Baleira Rossi.

Deputados à venda

Pode até ser que haja alguma preocupação com direitos democráticos por alguns deputados que estavam com Baleia Rossi, mas a maioria ajudou a construir essa farsa. Para fazer Bolsonaro pagar mais caro, valorizaram seus próprios passes, iludindo parte da esquerda, para conseguir arrancar mais emendas e mais cargos. E Bolsonaro pagou.

O responsável pela tarefa de ir às compras de parlamentares foi o General da reserva Luiz Eduardo Ramos. Quanto mais ele transitava pelo Congresso Nacional, a cada vez que terminava uma reunião, o bloco de Baleia encalhava. O Planalto liberou de imediato R$ 3 bilhões para emendas extras, mais ministérios vão ficar sob o comando do centrão, mais cargos e mais obras.

E assim, vai tentando também pavimentar um caminho para aprovar reformas de interesse do capital e um bom arco de alianças para 2022. É a velha política, usando dinheiro público, para comprar votos de parlamentares sem princípios. Nem mesmo o DEM, acreditou no conto de Maia, preferindo ir de BolsoLira! É de dar dó, a ingenuidade dos eleitores que votaram em Bolsonaro, e na sua aliança com militares e donos de igrejas, para acabar com o toma lá dá cá (E ainda usam o nome de Jesus pra isso!). É de dar pena o atraso da burguesia brasileira, que está feliz com o que aconteceu na reabertura dos trabalhos no Congresso Nacional. E temos que rir pra não chorar, em ver o arrependimento de parte da grande mídia, em ter ajudado a eleger Bolsonaro. Que decisão difícil, hein, Estadão?

O Psol quase caiu no conto de Maia

A esquerda se dividiu entre duas candidaturas, obviamente a minoria com Erundina. Que, por sua vez, fez um discurso forte de enfrentamento com o governo Bolsonaro, se diferenciou de outras candidaturas e destacou as pautas de interesse do povo brasileiro como a vacina, o auxilio emergencial e o impeachment de Bolsonaro.

“Não baixaremos a cabeça, chega de tanta arbitrariedade, Fora Bolsonaro e todos os seus asseclas. Gostaria de estar aqui, como candidata de toda esquerda democrática e popular. Até abriria mão da candidatura, se essa fosse a condição para que estivéssemos unificados, em torno de um programa,que respondesse aos anseios da maioria do povo brasileiro. Trabalhadores e trabalhadoras, pelos quais fomos eleitos para representar e ser a sua voz no parlamento. As campanhas de Arthur Lira e Baleia Rossi recebem adesões de parlamentares de outras legendas, como PP e MDB, que funcionam como sublegendas a serviço do governo Bolsonaro”. (Trechos do discurso de Luiza Erundina, Camara dos Deputados 01/02/2021)

Mas, por muito pouco, o Psol não esteve no Bloco de Baleia Rossi. A bancada psolista é formada por dez parlamentares. E se dividiu ao meio. Os quatro parlamentares do MES (Sâmia, Mechiona, David e Vivi), juntamente com Marcelo Freixo, defenderam a adesão do Psol ao bloco de Maia. Em votação na executiva nacional do PSOL, que aprovou o lançamento da candidatura de Luiza Erundina, mais uma vez, isoladamente, o MES votou pela adesão à candidatura de Baleia Rossi ( 13 X 4). Chamo a atenção para a responsabilidade do Movimento Esquerda Socialista como corrente interna do partido, que tem quase a metade da bancada do Psol na Câmara dos Deputados.

Depois de tudo que passamos de 2016 para cá, imaginem qual seria a história do Psol se as posições do MES tivessem sido majoritárias nos momentos decisivos da luta de classes no país. Senão, vejamos: O Psol teria defendido a Lava Jato e consequentemente participado do golpe contra Dilma Roussef, teria abandonado por completo a defesa da liberdade de Lula, não teria lançado Boulos para presidente e nem mesmo para a Prefeitura de São Paulo e teria feito parte do conto de Maia na eleição para a Presidência da Câmara.

Fazemos esse debate com o devido e merecido respeito com os companheir@s do MES, por ser uma corrente que tem uma militância aguerrida, combativa e que está sempre nas lutas. Mas, nos chama atenção o acúmulo de equívocos táticos que poderiam ter levado o Psol a um processo de isolamento num período dificílimo da luta de classes, numa situação reacionária. O PSOL teria, hoje, o alcance que tem, diante de tantos erros significativos? Teríamos sobrevivido? Talvez nem mesmo o MES teria uma bancada de quatro deputados federais.

Lira e Pacheco vão abrir fogo contra o povo trabalhador

Erros e polêmicas à parte, é hora de apostar tudo na pressão popular nas ruas e nas redes. O calendário de lutas apontado pelas frentes Brasil Popular e Frente Povo Sem Medo é um farol importante nesse momento, porque expressa a possibilidade de se consolidar no país uma frente única para lutar contra Bolsonaro.

Não há duvidas que agora, com Lira na Câmara e Pacheco no Senado, Bolsonaro vai tentar avançar com a sua agenda ultra liberal, conservadora e antidemocrática. E só a pressão nas ruas e nas redes poderá evitar que o povo trabalhador brasileiro possa perder mais direitos, como também vamos poder defender os direitos civis das mulheres, da comunidade LGBTQI+, do movimento negro, a pauta do meio ambiente e acudir os excluídos e atingidos pela pandemia.

É preciso continuar a luta pela vacinação, pela continuidade do auxílio emergencial, contra as privatizações, contra o corte dos salários do funcionalismo, denunciado a inflação, defendendo emprego e renda. Dar continuidade a um calendário de lutas com carreatas, panelaços, enquanto estivermos em meio à pandemia. Como também construir um grande 8 de março com uma ampla unidade para acumularmos forças contra Bolsonaro e seu governo de predadores da vida.

*Gibran Jordão é membro da Coordenação Nacional da TRAVESSIA Coletivo Sindical e Popular.