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Bolsonaro paz e amor?

Gabriel Casoni

Gabriel Casoni, de São Paulo (SP), é professor de sociologia, mestre em História Econômica pela USP e faz parte da coordenação nacional da Resistência, corrente interna do PSOL.

Acossado pelos inquéritos no STF e pela prisão de Queiroz, o presidente miliciano deu um passo atrás essa semana. Não fez ameaça de golpe, entregou cargos ao Centrão, indicou ministro negro e “técnico” fora do núcleo olavista para o MEC, anunciou mais três parcelas do auxílio emergencial, mandou tocar “Ave Maria” na sua Live de quinta em homenagem aos mortos da covid-19; enfim, baixou o tom e recuou da retórica golpista — ao menos por enquanto. Além disso, o Ministro das Comunicações, Fábio Faria, anunciou diálogo com a imprensa e o general Ramos, da Secretaria de Governo, solicitou sua ida à reserva do Exército.

Bolsonaro na versão “paz e amor” é o que a burguesia quer. A classe dominante, por ora, não pretende interromper o mandado do fascista, mas quer ele domestica-lo, preservando o regime democrático-liberal racista e de fortes traços autoritários.

Enquanto o governo coloca “o rabo entre as pernas”, Maia e Alcolumbre vão passando “a boiada” no Congresso, como ocorreu na aprovação da privatização do saneamento público essa semana. O poder Executivo se enfraqueceu, em contrapartida o Legislativo e o Judiciário ganharam mais força, assumindo um papel central na aplicação dos projetos do grande capital.

Esses fatos, elencados acima, demonstram o quão grave é a Frente Ampla (chamada de “Direitos Já”) da oposição de direita que algumas lideranças da esquerda embarcaram, que fará um comício virtual nesta sexta (26). Sem defender o Fora Bolsonaro, serve para quê essa unidade com tucanos e neoliberais? Somente para pintar de cores democráticas setores burgueses que abriram as portas para Bolsonaro chegar onde chegou e que garantem a aprovação de todo pacote de maldades contra os trabalhadores desde o golpe parlamentar de 2016 — reformas trabalhista e da previdência, PEC do Teto, corte nas verbas da edução e saúde públicas, privatizações, entre tantos outros ataques aos direitos sociais.

Com Bolsonaro mantendo 32% de apoio popular, segundo a pesquisa DataFolha divulgada hoje (26), é improvável que prospere, nesse momento, o pedido de impeachment no Congresso ou que o TSE venha a cassar a chapa presidencial.

Por consequência, a chave para a derrubada desse governo genocida está em preparar as condições para entrada em cena do movimento de massas. Esse deve ser o norte estratégico da Esquerda, e não a realização de comícios ao lado de Luciano Huck, FHC e Tasso Jereissati, que nem pedem impeachment. Hoje, por causa da pandemia em curva ascendente, não é possível ir às ruas em peso. Mas há lutas em curso — atos antirracistas e antifascistas; mobilizações de enfermeiras, metroviários, rodoviários e entregadores de aplicado; entre outros processos de resistência — que acumulam forças para esse momento que, cedo ou tarde, chegará.

O inevitável agravamento da crise múltipla (sanitária, econômica e social) dificilmente dará bases para uma estabilização mais duradoura da crise política, ao contrário, tende a agravá-la. O Bolsonaro “paz e amor” é disfarce de quem está acuado, com medo de cair. O projeto fascista está lá, intacto. Precisa ser destruído por baixo e pela esquerda.

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Governo Bolsonaro