O morticínio neonazista de Jair Bolsonaro

Travesti Socialista

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Travesti socialista que adora debates polêmicos, programação e encher o saco de quem discorda (sem gulags nem paredões pelo amor de Inanna). Faz debates sobre feminismo, diversidade de gênero, cultura e outros assuntos. Confira o canal no Youtube.

“A única coisa necessária para que o mal triunfe é que os bons não façam nada.”

Edmund Burke

 

“Mor·ti·cí·ni·o

Substantivo masculino

Grande número de mortes violentas. = CARNIFICINA, CHACINA, HECATOMBE, MORTANDADE.”

Dicionário Priberam da Língua Portuguesa

 

A falta de ações efetivas do Governo Federal está causando um morticínio no Brasil. A cada um milhão de habitantes, cerca de 223 faleceram devido à COVID-19, segundo dados oficiais de 19 de junho. Entre 177 nações, ou regiões nos dados da COVID-19 [1], esse índice é maior em apenas 14 delas. Das demais 166 nações ou regiões, 63 têm mais de 50 vezes menos mortes por milhão de habitantes, sendo que 53 delas têm PIB per capita menor que o Brasil. Seria isso apenas incompetência?

Neofascismo ou neonazismo – uma discussão conceitual

Consideremos os diversos fatores envolvidos: a ideologia anti-científica de Bolsonaro, a crença de que a pandemia é uma invenção da imprensa e dos governadores para derrubá-lo, o fundamentalismo religioso da base bolsonarista que prega que os fiéis não padecerão de COVID-19, a ideologia de Paulo Guedes de que os serviços sociais devem ser deixados à iniciativa privada. Um presidente que tem essas ideias chegaria à conclusão que ele não deve fazer nada, ou muito pouco, em relação à pandemia que vitima mais de mil pessoas por dia nesse país.

Por isso, a crise pandêmica que assola o país é consequência de uma escolha política. Não fazer nada e permitir que dezenas de milhares de mortes ocorram pode não parecer tão ruim quanto ordenar a morte dessas pessoas, como fez o nazismo no século passado, mas as consequências são as mesmas. Se uma pessoa recebe uma bala na nuca ou falece por insuficiência respiratória, seu destino é o mesmo: sete palmos embaixo da terra.

Devemos ainda levar em conta que a pandemia ainda está em ascensão no país. Como a letalidade da COVID-19 é de cerca de 1%, o Brasil pode passar de um milhão de mortes. Isso é possível e, aliás, provável se o governo continuar com a política de deitar na rede e esperar. Podemos considerar também as ações de Trump, que também podem causar outras milhões de mortes. Por mais que Trump critique Bolsonaro, sua falta de ação teve e tem as mesmas consequências letais.

Existe uma diferença fundamental entre fascismo e nazismo. O fascismo mata para chegar e permanecer no poder. O nazismo chega e permanece no poder para matar. No nazismo, as mortes em massa são gratuitas, não apenas a quem demonstra se opor ao governo.

No Brasil e nos EUA, as mortes que ocorrem pelas escolhas políticas de Trump, Bolsonaro e seus apoiadores não são direcionadas a manifestantes e oponentes políticos, por exemplo, como era o caso do fascismo italiano. Existe um certo ‘direcionamento político’, uma vez que a população pobre, em sua vasta maioria negra, é a que tem menos condições de permanecer em quarentena e a que tem acesso à saúde muito mais precário. A população que fica à margem do sistema econômico (moradores de rua, mendigos, profissionais do sexo, vendedores ambulantes) são ainda mais vulneráveis à contaminação e, consequentemente, à morte.

O morticínio cheira a genocídio. A diferença com o genocídio nazista é que o morticínio neonazista não foi planejado, portanto a responsabilidade dos governantes é disfarçada. Afinal, como dizia Marx, grandes eventos (e tragédias) na História acontecem duas vezes: primeiro como tragédia, depois como farsa.

É por essa razão que acredito que o neofascismo de Bolsonaro e Trump merece o nome de neonazismo. No futuro, se a humanidade tornar-se mais consciente, os livros de história colocarão o trágico genocídio nazista ao lado de sua repetição disfarçada.

Uma comparação com outras nações

Nessa pandemia, o número de mortes por milhão de habitantes no Brasil é mais de 50 vezes maior do que o encontrado em Nigéria, Costa Rica, Burquina Fasso, Sudão do Sul, Níger, República Africana Central, Jamaica, Essuatini, Malásia, Geórgia, Austrália, Tunísia, Líbano, Nova Zelândia, Singapura, Chade e até na infame China. É também mais de 100 vezes maior que em Burúndi, Mianmar (ou Burma), Ruanda, Angola, Taiwan, Zimbábue, Maláui, Tanzânia, Gâmbia, Botsuana, Madagascar, Sri Lanka, Etiópia, Uzbequistão, Zâmbia, Cisjordânia e Faixa de Gaza, Nepal, Benim, Tailândia, Jordânia, Venezuela, Congo-Quinxassa, Líbia, Togo, Costa do Marfim, Paraguai, Gana, Quênia e Guiné. Há países onde, apesar da contaminação, não ocorreu nenhuma morte pela doença: Butão, Camboja, Eritrea, Fiji, Granada, Laos, Lesoto, Mongólia, Namíbia, Papua-Nova Guiné, São Cristóvao e Neves, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Seicheles, Uganda e Vietnã.

Entre os 14 países que estão com maior número de mortes por milhão de habitantes que nosso país, o número de casos ativos já está em queda em 10 deles: Andorra, Bélgica, França, Irlanda, Itália, Países Baixos, São Marinho, Espanha, Suíça e Reino Unido. Os demais são Peru, Equador, Estados Unidos e a favorita do Bolsonaro, a Suécia. Nesses quatro países, assim como no Brasil, a curva de infectados ainda está em dinâmica de ascensão.

Existem ainda outros 103 países com número de mortes por milhão de habitantes menor que o Brasil.

O Brasil precisa de 2 milhões de testes por dia!

A política de testes em massa, por si só, não garante um efetivo combate à pandemia de COVID-19. Podemos tomar como exemplo a Rússia, um país que fez 16,7 milhões de testes, mas teve, até agora, 8 mil mortes. Por outro lado, a realidade demonstra que, sem testes em massa, é impossível combater efetivamente a pandemia.

Uma forma de comparar quantos testes cada país realiza é através do número de testes por caso confirmado. Por exemplo, vejamos o número de testes por caso confirmado nos países com mais de 10 milhões de habitantes até 1,0 morte por milhão de habitantes [4]:

 

PaísTestes por caso confirmadoMortes por milhão de habitantes
Vietnã7880,0
Jordânia3160,9
Venezuela3101,0
Camboja2320,0
Uganda2040,0
Mianmar2100,1
Taiwam1670,3
Ruanda1590,2
Tailândia1490,8
Uzbequistão1210,6
Zimbábue1100,3
Benin830,9
Angola580,2
Etiópia510,6
Nepal490,8
Sri Lanka480,5
Zâmbia340,6
Malawi140,4
Madagascar120,5

 

Uma estimativa da UFPel revelou que o Brasil tem entre 7 e 9 pessoas infectadas para cada caso confirmado, o que nos leva a concluir que cerca de 200 mil pessoas são infectadas por dia nesse país. A tabela acima sugere que o Brasil precisa fazer, no mínimo, 10 testes para cada pessoa infectada, ou seja, 2 milhões de testes por dia. Além disso, é preciso investimento massivo de verbas no SUS, o que requer que o Brasil suspenda o pagamento da dívida pública e faça uma auditoria.

Para que isso aconteça, é preciso urgentemente derrubar o Bolsonaro.

Referências

[1] Nesta análise, desconsideramos entradas relacionadas a dois cruzeiros, à Santa Sé e à região da Saara Ocidental. Os dados são fornecidos pelo CSSE da Universidade Johns Hopkins e podem ser conferidos na página Worldometers, que tem visualização mais amigável. Já a população de cada país foi estimada para 2020 com base nos dados fornedicos pelo Banco Mundial. Links:

Github

Worldometers

Worldbank