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Brasil, último lugar em testes por caso confirmado

Bruno Concha / Fotos Públicas

Travesti Socialista

Travesti socialista que adora debates polêmicos, programação e encher o saco de quem discorda (sem gulags nem paredões pelo amor de Inanna). Faz debates sobre feminismo, diversidade de gênero, cultura e outros assuntos. Confira o canal no Youtube.

Quando dividimos o número testes feitos no Brasil (999.836) pelo número de confirmados (691.962) [1], obtemos um valor próximo de 1,4. Entre os 191 países com número de testes no site Worldometer e desconsiderando os dados desatualizados [2], o Brasil é o último lugar em número de testes por caso confirmado. Parabéns ao Bolsonaro pelo péssimo trabalho, já pode subir no pódio da vergonha mundial! O campeão de subnotificações!

Uma medalha de ouro da vergonha mundial muito bem merecida

Vários ‘especialistas’ na mídia comparam o Brasil com países muito ricos, de primeiro mundo, o que é muito injusto. Se fossem inteligentes, olhariam para os países mais pobres do mundo, vários deles estão indo muito melhor do que o Brasil. Há várias nações na América do Sul, América Central, África e Ásia que têm PIB per capita muito menor que o do Brasil (que, em 2018, era $9001,00) e estão conseguindo conter a pandemia, aplicando muito mais testes – seja em número de testes por caso confirmado, seja por por milhão de habitantes – e tendo políticas públicas muito mais efetivas.

O Brasil está com um número enorme de infectados por culpa da política do governo Bolsonaro: em vez de copiar a política de vários países que conseguiram controlar a pandemia e esmagar a curva de infectados (por exemplo, China, Vietnã, Coreia do Sul, Islândia e Austrália), o governo brasileiro foi em sentido absolutamente inverso.

No lugar de testes em massa, o Ministério da Saúde ordena testes apenas em casos graves. Bolsonaro sempre recusou o isolamento social e nem sequer falou em internação e quarentena de pessoas infectadas (inclusive dos casos mais leves). Em vez disso, nesse país, a pessoa doente só é internada em último caso. Em vez de ter colocado, dois meses atrás, as cidades mais infectadas em quarentena total, os governadores simplesmente esperaram o tempo passar e o problema foi se agravando. Agora, em vez de corrigir o erro, fala-se em relaxar o isolamento, sendo que nem sequer chegamos a 70%, nem a 60%, mal chegamos a 50%!

Desde dois ou três meses atrás, o Brasil deveria ter iniciado uma política de ampla fabricação de testes, testando todas as pessoas com sintomas (ainda que leves) e também as que entraram em contato com pessoas confirmadas. O governo deveria ter garantido a internação de todas as pessoas cujo teste foi positivo ou, no mínimo, seu total isolamento dentro de suas residências, com pagamento de auxílio e cesta básica e garantia de estabilidade no emprego.

Em vez disso, Bolsonaro apenas lamentou que não podia fazer milagres. Se fazer melhor que o Brasil é um milagre, então o mundo todo – menos o Brasil – está fazendo ‘milagres’.

Por falar em ‘milagre’, a República do Níger, que tem PIB per capita de $414,00 (dado de 2018 – quase 22 vezes menor que o do Brasil) e mais que 20 milhões de habitantes, vem diminuindo o número de casos ativos desde 12 de maio, quando havia mais de 100 casos ativos – hoje, há cerca de 30.

A subnotificação e o oportunismo devem aumentar

No texto anterior critiquei uma ‘estimativa’ vergonhosa feita pela Funcional Health Tech. Infelizmente, é apenas um exemplo de ‘estimativa’ mal-feita que, em última instância, mascara os dados e confunde a população sobre a dimensão real da pandemia.

A evolução dos dados indica que a subnotificação está aumentando. Duas semanas atrás, um estudo feito pela UFPel [3] demonstrou que esse é um problema enorme no Brasil – estimou-se que 1,3 a 1,6% da população há havia sido infectada, um número entre 7 e 9 vezes maior do que o número de casos confirmados.

As declarações feitas por Bolsonaro, pelo vice-presidente Mourão e outros membros de seu governo que dão a entender que o problema no Brasil é o excesso de notificação não passa de oportunismo. Isso, infelizmente, tende a aumentar com a notificação. Se não houver um aumento massivo na capacidade de testagem no país, em breve o número de novos confirmados deve estacionar, o que dará base ao surgimento de pseudo-estimativas como a da Funcional, afirmando que já atingimos o pico.

Mas o fato é que estamos longe de atingir o pico. Os dados das duas últimas semanas, por exemplo, apontam uma taxa de reprodução da COVID-19 de aproximadamente 1,7, o que indica que, no pico, cerca de 40% da população já terá sido infectada [4]. Considerando o número de confirmados e a estimativa de subnotificação da UFPel, até agora, ‘apenas’ cerca de 2,7% da população foi infectada até 7 de julho.

É urgente que Bolsonaro seja derrubado, para que o Brasil comece, de fato, a aplicar uma política consequente de combate à pandemia. Cada dia de atraso custará milhares de vidas.

Referências

[1] Ambos números divulgados pelo G1:

https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/06/07/casos-de-coronavirus-e-numero-de-mortes-no-brasil-em-7-de-junho.ghtml 

[2] Países com números não atualizados: Sudão, Iemen e Guiné-Bissau. Fonte dos dados:

https://www.worldometers.info/coronavirus/#countries 

[3] https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2020/05/25/brasil-tem-sete-vezes-mais-contaminados-por-covid-19-do-que-mostram-as-estatisticas-oficiais-aponta-pesquisa-da-ufpel.ghtml

[4] Expliquei como esse cálculo é feito em um texto anterior [https://esquerdaonline.com.br/2020/05/30/relaxar-o-isolamento-vai-sair-mais-caro-do-que-mante-lo/.