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BRASIL

Juntos, mas pra quê?

Luís Felipe Miguel*, de Brasília, DF

O curioso, nesses manifestos de Frente Ampla, é que, quando eles saem das abstrações banais sobre democracia, desenvolvimento e justiça, sempre caem no discurso conservador – “lei e ordem”, “responsabilidade na economia” e, claro, “unir a pátria” num “projeto comum” que dissolve as diferenças entre dominadores e dominados.

O preço que a esquerda paga para que a direita “civilizada” faça frente comum contra o fascismo tem que ser abrir mão de seu discurso?

O desespero com a situação pode levar para esse caminho, mas a experiência mostra que ele se revela um péssimo negócio a médio prazo – na verdade, nem médio, já no “um pouquinho menos curto prazo”.

O manifesto do tal “Juntos” não é capaz sequer de dizer com todas as letras o único ponto que deveria ser destacado: que o objetivo é retirar Bolsonaro do cargo. Pelo que li, foi para ampliar ainda mais o rol de assinaturas e incluir gente como Luciano Huck, que ainda não se sente à vontade para bater de frente com o presidente que ajudou a eleger.

Com algum esforço, o manifesto pode ser lido como um apelo para que ele “tome jeito” e faça um governo mais republicano…

Ao fazer com que lideranças da esquerda abram mão do próprio discurso, um manifesto como o que foi divulgado ontem reforça a posição da ideologia dominante como chão comum e fronteira final da disputa política. Reduz nossos horizontes e enfraquece a exigência de uma transformação social profunda.

Para quem sabe que Bolsonaro é fruto do golpe de 2016, derrubá-lo tem que ser entendido não como meta final, mas como passo necessário na luta pelo desfazimento do golpe, a fim de reabrir caminhos para a luta popular e para a construção de um Brasil menos injusto e menos violento.

 

*Cientista político e professor da UnB.

 

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