Desde o golpe de 2016, há um exponencial aumento de assassinatos de lideranças políticas e dos movimentos sociais no Brasil. O caso de maior repercussão foi o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) do Rio de Janeiro. Ao que indica as investigações, crime realizado por milicianos com profundas ligações com o clã Bolsonaro. Quase um ano depois, os mandantes ainda não foram identificados.
Há, desde o golpe, uma intensificação dos diversos tipos de violência contra os segmentos oprimidos e explorados em todos os sentidos. Seja diretamente pelas mãos do Estado, seja pela via de “agentes do terror”, a serviço de latifundiários ou fruto do aprofundamento do reacionarismo fundamentalista, racista, sexista e lgbtfóbico no conjunto da sociedade.
No campo, a Comissão Pastoral da Terra identificou em dados o indicador mais alarmante do crescimento dessa violência: o aumento do número de assassinatos. Pra ficar em um número, de 2015 pra cá foram identificados 210 assassinatos (o número deve aumentar quando forem atualizados os dados de 2019).
Também nas periferias das grandes e médias cidades a violência promovida por uma política de segurança de extermínio, tem chegado a níveis escandalosos. Os dados divulgados pelo Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro (portanto números oficiais) demonstram que o número de assassinatos por policiais no estado chegou ao mais alto número, desde que o instituto passou a fazer a estatística. Na contagem feita até outubro (ainda não foram contabilizados novembro e dezembro) atingiu-se em 2019 a absurdo cifra de 1.549 assassinatos durante operações da polícia.
A violência policial cotidiana nas periferias, com um essencial componente racista, não é exclusividade do estado do Rio, embora o governo de Witzel, um insano aficionado por balas e armas, contribua para aprofundar essa selvageria. Mas há uma verdadeira escalada de exarcebação da cólera dos “agentes de segurança” contra pobres e negros em todo o país. A chacina no baile funk de Paraisópolis em SP é uma expressão disso. A atuação das policias estaduais, mesmo em estados não alinhados ao planalto central, como na Bahia, também tem tido traços de carnificina.
A eleição de Bolsonaro em 2018 foi um marco que aprofundou, desgraçadamente, esse quadro de ampliação da violência. Já que que se conta agora com um incentivador na presidência da república e com a anuência e ate cumplicidade de inúmeras autoridades e órgãos públicos. Ampliou-se o feminicídios, os crimes lgbtfóbicos e racistas. Ampliou-se a violência no campo contra indígenas, quilombolas, assentados, seringueiros etc.
Por outro lado, e isso merece especial atenção, a indignação e perplexidade com relação à violência policial, ou mesmo de grupos organizados, tem se reduzido. A Comissão de Combate à Intolerância Religiosa tem registrado, nesse ano de 2019 o aumento dos ataques a terreiros de religiões de matriz africana. Uma prática que merece de nós uma alerta nesses casos, é o surgimento de facções de traficantes evangélicos, armados, que tem realizado tais ataques. Como o caso do chamado “bonde de Jesus” no Rio de Janeiro.
Outra acontecimento de enorme gravidade, ao apagar das luzes de 2019, foi a ação terrorista de um grupo integralista à Produtora Porta dos Fundos. Um grupo abertamente fascista, diz defender a família e a religião ostentando duas bandeiras que mereciam, só em serem mostradas, o mais veemente repúdio: a bandeira da vergonhosa e assassina monarquia brasileira, erguido sobre o sangue e a escravização de indígenas e negros durante quase 400 anos; e a bandeira do integralismo, versão brasileira do ideário de Hitler e Mussoline, que protagonizaram os episódios históricos de maior terror do século passado. Utilizando a defesa da “honra” de Cristo ressuscitam o que de mais infernal a humanidade já produziu.
Em 2019 a degeneração política reacionária deram sinais de avanço. Só há uma forma de frear a marcha lenta e contínua do neofascismo brasileiro. Só a retomada das lutas sociais de ruas pode mudar a dinâmica regressiva dos acontecimentos em nosso país. Não é possível saber ao certo quando esses sujeitos sociais (trabalhadores, juventude, movimentos sociais) conseguirão se reerguer e travar essa luta à altura dos desafios colocados, diante do despertar da múmia fétida do fascismo. Mas uma coisa é certa, aqueles que entendem a gravidade do que tá acontecendo precisam se mover.
Em 2020 todos os que tiverem consciência dessa encruzilhada em que nos encontramos, precisam batalhar para construirmos instrumentos que nos possibilite levantar um front de defesa e de combate. Alguns já pagaram com vida em 2019. Termino essas linhas prestando a alguns deles uma homenagem (assassinados políticos, os que consegui encontrar informações). Em nome dos mártires de ontem e de hoje, em 2020 precisamos reforçar a resistência para preparar a derrota dos inimigos da liberdade, antes que seja tarde demais.
. Mestre Moa do Katendê, capoeirista e fundador do bloco afro Badauê. Assassinado com 12 facadas em 8 de dezembro de 2018 por não ter votado em Bolsonaro. Presente!
. João Maria Figueiredo, liderança dos Policiais Antifascistas no Rio Grande do Norte, assassinado em 4 de janeiro de 2019. Presente!
. Cacique Francisco de Souza Pereira, Manaus (AM), da etnia Tukano. Assassinado em 27 de fevereiro na própria residência, na frente de familiares. Presente!
. Dilma Ferreira Silva, coordenadora do Movimento Atingidos por Barragens, assassinada com requintes de crueldade junto com seu marido e um amigo do casal, no assentamento Salvador Allende, no Pará. 22 de março. Presente!
. Cacique Willames Machado Alencar (“Onça Preta”), liderança indígena. Morto com cinco tiros na ocupação Cemitério dos índios, Manaus. 13 de julho. Presente!
. Emyra Waiãpi, liderança indígena. Assassinado na terra indígena Waiãpi/Aldeia Mariry, em Pedra Branca do Amapari (AP). Em 22 de julho. Presente!
. Carlos Alberto Oliveira de Souza, (“Apurinã”), liderança indígena. Morto por disparos de homens encapuzados, na comunidade Conjunto Cidadão, Manaus. 6 de agosto. Presente!
. Paulo Guajajara, liderança indígena, atuava como guardião da floresta. Assassinato na terra indígina Araribóia, Maranhão, em 1 de novembro. Presente!
. Josimar da Silva Conde, seringueiro e presidente do PSOL em Xapuri (cidade de Chico Mendes), Acre. 21 de novembro. Presente!
. José Izídio Dias (Sr Vermelho), liderança do Quilombo Rio dos Macacos, na região metropolitana de Salvador, encontrado morto em sua casa com marcas de violência sofridas a machado. 25 de novembro. Presente!
. Humberto Peixoto Lemos, liderança indígena da etnia Tuyuca, morreu no hospital de Manaus após ser agredido a pauladas, em 2 de dezembro. Presente!
. Cacique Firmino Silvino Prexede Guajajara (Terra Indígena Cana Brava) e Cacique Raimundo Guajajara (Terra Indígena Lagoa Comprida) assassinados à beira da BR-226 em 7 de dezembro. Seus corpos foram esquartejados. Presentes!
Tantos outros anônimos/as. Presente!
Fontes dos dados: Cimi, CPT, APIB, CCIR, ISP-RJ.
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