Cinco observações rápidas sobre lgbtfobia, criminalização, STF e luta política
Publicado em: 15 de fevereiro de 2019
1- A discriminação a lésbicas, gays, trans e sexodiversos em geral é um traço estruturante da realidade brasileira e se reflete desde a baixa representatividade pública até os crimes de ódio, passando pela menor expectativa de vida, piores empregos, acesso limitado a políticas públicas e sofrimento escolar e familiar de crianças e jovens. É gravíssima e faz muita diferença na vida de milhões de pessoas. É um tema que continua subestimado e tive certeza disso quando, na Universidade, percebi o número de jovens que são ainda hoje rejeitados por suas famílias em razão de sua orientação sexual ou identidade de gênero.
2- A criminalização – o reconhecimento de certas condutas como criminosas – é uma característica da ação repressora do estado capitalista contemporâneo das menos percebidas. Ao escolher certas práticas como as mais inaceitáveis, o estado o faz normalmente de forma a reforçar o controle e a repressão aos “de baixo”. E, mesmo quando os crimes são instituídos em atendimento a demandas de proteção de direitos – a criminalização da tortura, para dar um exemplo – sua aplicação sempre termina por “selecionar” os mais vulneráveis. É assim que ter a criminalização como bandeira central para qualquer movimento por direitos é um equívoco. A luta contra a lgbtfobia e contra todas as formas de discriminação odiosa passa muito, muito mais pelo campo de outras políticas públicas, pelo reforço da autoorganização e pelo campo cultural e educacional.
3- O STF e o judiciário de forma geral são forças institucionais conservadoras no Brasil. Esta afirmação é hoje bem compreendida pela maior parte dos movimentos de luta por direitos, mas não o era até há poucos anos. Houve em certa medida uma “ilusão judicial” em alguns setores que acreditaram que poderiam – com base nos princípios mal concretizados da Constituição de 88 e nos recursos às estruturas judiciais – garantir os direitos que executivo e legislativo (e sociedade) não efetivavam. De outro lado, é legítimo aos que estão sendo massacrados o uso dos mecanismos disponíveis. O fato é que a “judicialização” das lutas por direitos – compreensível que possa ser – acabou por reforçar um poder não eleito, no qual forças reacionários se infiltraram competentemente e encontraram os sempre dominantes conservadores. Aqueles juízes e promotores democratizantes nossos amigos foram sempre e cada vez mais uma pequena minoria. Não faz sentido acreditar na salvação pelo judiciário, nem abrir mão de recorrer a ele quando isso pode trazer algum resultado (nem que seja o debate interditado em outros poderes eventualmente).
4- Hoje – “nesta terra, neste instante” – o Supremo analisa ações constitucionais que pedem que seja reconhecida à lgbtfobia o mesmo estatuto que o racismo em termos de proteção criminal. Feitas as severas críticas ao caminho, ao campo e ao mecanismo – ação, judiciário, criminalização – é forçoso reconhecer a importância simbólica e política que, neste contexto, teria que esta equiparação fosse reconhecida. Estamos diante do Congresso mais conservador da história da República e das maiores ameaças às bases LIBERAIS do regime político de 88. Seria um pequeno freio à marcha da insensatez que se dissesse que uma pessoa ser privada de direitos e possibilidades pela sua orientação sexual ou identidade de gênero é tão inaceitável que merece a resposta – tosca, simplista, insuficiente, ensejadora de novas distorções – tradicional que a sociedade hoje realmente existente dá a esses casos: a criminalização. Uma resposta contrária pode soar como uma autorização.
5- A liberdade de expressão e a liberdade religiosa estão e precisam estar salvaguardadas. Ninguém está propondo o contrário. Mas ninguém imagina que a liberdade religiosa possa abarcar a possibilidade de produzir extermínios, vilipêndios, charlatanismos, racismo. Ou será que alguém quer o chapéu de religiões pra isso?
#CriminalizaSTF
FOTO: Elza Fiuza/Agência Brasil
LEIA MAIS
Top 5 da semana

brasil
Prisão de Bolsonaro expõe feridas abertas: choramos os nossos, não os deles
colunistas
O assassinato de Charlie Kirk foi um crime político
brasil
Injustamente demitido pelo Governo Bolsonaro, pude comemorar minha reintegração na semana do julgamento do Golpe
psol
Sonia Meire assume procuradoria da mulher da Câmara Municipal de Aracaju
mundo