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MOVIMENTO

A venda da sede da CUT e lições sobre a independência de classe

Por: Caue Campos, de Campinas, SP
Roberto Parizotti/CUT Nacional

Recentemente, a grande mídia noticiou a possibilidade de a CUT vender sua sede central, no Brás, em São Paulo. É uma sede histórica, na qual a principal central do país está há mais de 20 anos, e estaria avaliada em R$ 40 milhões. Para piorar, a venda possivelmente seria feita com a Igreja Mundial do Poder de Deus, do pastor Valdemiro Santiago.

Sem dúvida alguma, isso é resultado do fim do imposto sindical, promovido pela reforma trabalhista aprovada no ano passado, como desencadeamento do golpe institucional. Não é só a CUT que sofre as consequências do financiamento estatal aos sindicatos. Outros sindicatos já estavam vendendo propriedades e, para aqueles que acompanham a vida sindical brasileira, já é visível a imobilidade das principais centrais sindicais e sindicatos do país – falta dinheiro para desenvolver as campanhas.

A criação da CUT, na década de 1980, foi uma vitória da classe trabalhadora, e um passo fundamental para a superação do velho peleguismo da CGT e de Joaquinzão. Sem dúvida, essa sede e a estrutura da CUT também são conquistas da classe trabalhadora. Toda a estrutura dos sindicatos, quando utilizada em defesa dos direitos dos trabalhadores e para sua organização, é uma arma poderosíssima, que devemos defender.

Acontece que o sindicalismo brasileiro foi moldado a partir de três características advindas ainda dos tempos de Getúlio Vargas: a investidura, a unicidade e o imposto sindical. A primeira dá ao Ministério do Trabalho e Emprego determinar quais sindicatos são oficialmente representativos, através da “Carta Sindical”; a segunda que apenas um sindicato represente uma categoria em determinada região; e, por último, a cobrança de um dia de trabalho dos trabalhadores pelo Estado em forma de imposto, repassado aos sindicatos.

Estas três características transformam o sindicalismo brasileiro altamente dependente do Estado, sofrendo com as flutuações dos regimes políticos – mais ou menos autoritários, mais ou menos aberto ao diálogo com os movimentos sociais. Quando da ditadura militar, os sindicatos ficaram a beira da inoperância; já com os governos Lula e Dilma fortaleceram sua estrutura e canais de diálogos – sem conseguir se colocar contra os ataques promovidos por esses governos.

Historicamente a CUT e o PT se colocaram contra essas três características, principalmente a unicidade e o imposto sindical. Mas, contrariamente, em 2008 Lula aprovou a Lei das Centrais Sindicais (Lei n.º 11.648/08), que aumentou a dependência das entidades sindicais (federações, confederações e centrais) ao imposto sindical.

O problema dessa dependência é que os sindicatos e sindicalistas adaptam-se com esse recurso e esquecem-se das campanhas e outras formas de financiamento do movimento, sem depender do Estado e de empresas. Desta forma, como acontece agora com o governo Temer e com futuro governo Bolsonaro, quando o financiamento e os canais de diálogo são cortados, vida e a resistência dos trabalhadores tornam-se ainda mais difíceis.

Quando da negociação para aprovação da reforma trabalhista, Paulinho da Força Sindical aceitou apoiar a reforma, mesmo com o fim do imposto sindical (que a Força nunca foi contra), a partir da promessa de Temer que logo voltaria. Hoje, parece claro, que nem Temer, muito menos Bolsonaro, tem qualquer interesse em voltar com o imposto.

Fica a questão aos dirigentes da classe trabalhadora: que fazer? Não há nenhuma novidade para esquerda socialista: independência financeira da classe trabalhadora e suas entidades. Não podemos depender um centavo do Estado capitalista, seja nossos partidos, sindicatos ou movimentos sociais. Precisamos retomar – ainda que tardiamente – a cultura do autofinanciamento; campanhas e outras formas de organização são prementes. Os tempos que se avizinham exigirão muita luta e resistência de nossa parte e isso não se faz sem recursos.

Foto: Vagner Freitas, presidente da CUT. Roberto Parizotti/CUT Nacional

 

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