Passados apenas cinco dias da votação no Senado argentino que recusou, por 38 votos contra 31, o projeto de lei que previa a legalização do aborto no país, morre mais uma mulher por consequências do aborto clandestino – Magdalena Villegas de Martínez, de 34 anos, morreu em Buenos Aires, deixando um bebê de 2 anos. Ela tentou fazer um aborto em sua casa, usando um talo de “perejil” (espécie de salsa). Esteve dois dias internada, em dois centros de saúde diferentes e faleceu na noite do dia 14, em um Hospital na Grande Buenos Aires. No hospital retiraram seu útero, mas não foi o suficiente para conter a infecção que se generalizou – morreu por sepse.
É impossível não voltar a memória Ingriane Barbosa, trabalhadora, mulher negra, que morreu recentemente em Petrópolis (RJ), exatamente nas mesmas condições de Magdalena. No caso, usou um talo de mamona e deixou 3 filhos.
O que mata essas mulheres não é o aborto, mas a situação de ilegalidade e clandestinidade. E como nestes dois exemplos, são as mulheres trabalhadoras, pobres que recorrem a métodos caseiros já que não tem nenhuma condição de pagar cifras altíssimas pelo procedimento em clínicas particulares.
Enquanto o aborto não for legal e seguro seguiremos contando nossas mortas, pois as mulheres não deixarão de abortar. Como diz Marta Dillon, do movimento argentino Ni Una a Menos, uma morte por aborto ilegal é feminicídio de Estado. Segundo o coletivo Jornalistas Argentinas, três mulheres morreram desde o dia da votação no Senado, em função de abortos clandestinos.
Na Argentina, segundo dados apresentados pelo ministro da Saúde, Adolfo Rubinstein, nos debates no Congresso, 47 mil mulheres precisaram de atendimento hospitalar por complicações decorrentes da interrupção de uma gravidez em 2016. Naquele ano, 43 morreram. No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, quatro mulheres morrem por dia nos hospitais brasileiros após buscarem ajuda por complicações de uma interrupção mal feita.
As mortes por aborto inseguro de mulheres latino-americanas contrastam com os dados divulgados recentemente sobre a queda de abortos realizados em Portugal, após 10 anos de legalização. Naquele país, o aborto clandestino chegou a ser a terceira causa de morte materna na década de 1970, e desde 2011 não registra nenhuma morte.
A maioria do Senado Argentino tem as mãos sujas de sangue
A Campanha Nacional pelo Aborto Seguro Legal e Gratuito e a Rede de Profissionais de Saúde pelo Direito de Decidir publicaram um comunicado, com o título “A clandestinidade mata”. Segue trecho: “Desde o 8 de agosto, cada morta e presa por abortar, é responsabilidade do Poder Executivo Nacional e dos 40 senadoras e senadores, integrantes do Poder Legislativo, que se abstiveram ou votaram contra nosso direito a vida, a saúde e ao reconhecimento de nossa dignidade”.
Protestos
Depois de uma longa jornada de luta, com milhões nas ruas no último dia 8, neste terça, 15, mais uma vez, o potente movimento argentino nos deu mais um importante exemplo. Voltaram às ruas com seus “pañuelazos” por Liz, como era conhecida Magdalena, e por todas nós.
A luta pela legalização e descriminalização do aborto ganhou a sociedade argentina e vem ganhando o debate no terreno dos argumentos no Brasil também, como ficou nítido nas audiências públicas do Supremo Tribunal Federal que debateram a ADPF 442, de autoria do PSOL e da Anis, que propõe a descriminalização do aborto em nosso país. Essa campanha deve seguir forte, com a mais ampla unidade entre os setores progressistas e democráticos da sociedade, até que seja Lei na Argentina, no Brasil e em toda a América Latina.
Nem Presa Nem Morta!
Educação sexual para decidir, anticoncepcionais para não engravidar, aborto legal e seguro para não morrer!
Que seja Lei!
LEIA MAIS
Coluna Silvia Ferraro: Quais conclusões podemos tirar da onda verde argentina
ESPECIAL
Pela vida das mulheres
Comentários