Editorial 23 de janeiro |
Desde que surgiu como um veículo de debate e organização da esquerda socialista, há mais de um ano, o Esquerda Online tem se posicionado contra a condenação sumária de Lula, baseada unicamente em delações de presos e “convicções” de procuradores. Consideramos desde o início que a ofensiva do Poder Judiciário contra o petista nada mais é do que uma tentativa de resolver a crise política do país por fora dos mecanismos da própria política. Ou, dito de forma mais popular: derrubar Lula no tapetão. Junto com isso, sempre afirmamos que rejeitamos o projeto petista e que é necessário construir uma alternativa política à esquerda do PT, com um programa que aponte para o questionamento da ordem social e política vigente, e por meio de uma candidatura que expresse a luta do povo trabalhador brasileiro.
Pois bem, o Tribunal Regional Federal (TRF-4) marcou o julgamento de Lula em segunda instância para esta quarta-feira, 24 de janeiro. O que fazer agora? Como se posicionar? Há um forte debate sobre este tema dentro da esquerda: desde os que defendem o projeto político de Lula e querem vê-lo não apenas livre, mas governando o país novamente, até aqueles que apoiam sua condenação mesmo sem provas, passando, é claro, por aqueles que acham que a esquerda socialista não deveria nem estar discutindo esse tema porque isso, supostamente, não nos diz respeito.
Ignorar o segundo ato do golpe: um grave erro
Partimos da compreensão de que a derrubada de Dilma Roussef foi um golpe parlamentar, aplicado de maneira consciente por um setor da burguesia que queria um governo ainda mais subordinado aos seus interesses, sem qualquer ligação com a classe trabalhadora e o movimento de massas. Temer se demonstrou a figura ideal para essa primeira fase do golpe: com maioria parlamentar e sem dever qualquer satisfação à população, pôde aplicar uma série de ataques impensáveis há pouco tempo atrás.
Mas todos sabiam que o governo Temer teria fôlego curto. Todos perceberam rapidamente também que Lula e o PT não estavam mortos e poderiam voltar ao poder via novas eleições, como aconteceu com outros governos de colaboração de classes na América Latina nos últimos anos. Por isso, o golpe precisou de uma segunda fase: eliminar, via Poder Judiciário, a possibilidade de um novo governo Lula. Por que? Por uma série de motivos. Os principais: porque o projeto neodesenvolvimentista do PT já não satisfaz a maior parte da burguesia; porque Lula seria eleito com uma grande expectativa de anulação das contrarreformas até agora implementadas; porque o PT tem uma base social pobre e trabalhadora para a qual deve prestar contas de tempos em tempos, ou seja, precisa fazer concessões sociais e econômicas, distribuir um pouco de renda etc. Nada disso está nos planos da burguesia neste momento.
Por isso, é um grave erro achar que a condenação de Lula não diz respeito à esquerda socialista. Diz, e muito. Queremos derrotar o projeto petista politicamente, nas lutas e nas urnas. Mas para isso, precisamos debater com esse projeto. A condenação de Lula, além de impedir esse debate, aprofundará as características autoritárias e anti-democráticas do atual regime político do país. Será aberto um grave precedente: uma eleição presidencial será decidida por três juízes de segunda instância em um tribunal regional.
O que virá depois disso? Uma radicalização da Lei da Ficha Limpa para impedir que lutadores sociais presos em manifestações possam ser candidatos? Uma “lava-jato dos sindicatos”? A militância voluntária em tempos de campanha eleitoral será considerada “caixa 2”, condenando assim os candidatos da esquerda ideológica? Não se pode saber agora. Mas certamente a condenação de Lula é mais uma porta aberta para a criminalização total e absoluta da política e das lutas sociais.
PT deve fazer uma luta democrática, e não eleitoral
Em nossa opinião, a luta contra a condenação de Lula é uma luta democrática. Não tem nada a ver com a defesa do balanço dos 13 anos de governo petista e muito menos com a defesa de um novo mandato para Lula. Por isso, já afirmamos inúmeras vezes que a melhor coisa a se fazer seria organizar uma ampla campanha com todas as forças políticas que se colocam contra esta segunda fase do golpe, com a participação inclusive de outros pré-candidatos a presidente e partidos adversários do PT. Assim, seria muito mais difícil para a imprensa e o Poder Judiciário dizer que a defesa de Lula é feita apenas por petistas que querem vê-lo presidente novamente.
Mas, infelizmente, a direção petista insiste em misturar a campanha democrática pelo direito de Lula ser candidato com o apoio político para a candidatura de Lula em 2018, prejudicando a unificação em torno dessa importante luta e a construção de uma forte campanha democrática em defesa do direito de Lula ser candidato.
A gravidade do momento exige que o PT convide todos os partidos que estão contra a continuidade do golpe em curso, pré-candidatos que estão na disputa das eleições presidenciais, centrais sindicais e todos os movimentos sociais para uma campanha unificada, não em apoio político à candidatura de Lula, mas em defesa do direito democrático de Lula ser candidato.
De nossa parte, nos comprometemos em colocar todas as nossas forças em tal luta. Porque ela interessa aos trabalhadores e a toda a esquerda.
24 de janeiro: Estaremos nas ruas de São Paulo pelo direito de Lula ser candidato
Está sendo convocado pelas Frente Brasil Popular e Frente Povo sem Medo, neste dia 24 de janeiro, às 17 horas na Praça da República, em São Paulo, um ato em defesa da democracia e pelo direito de Lula ser candidato.
Desta vez, felizmente, foi possível construir uma unidade mais ampla em torno do ato. Nós do Movimento por uma Alternativa Independente e Socialista, corrente interna do PSOL, estaremos presentes neste ato, junto com a Frente Povo Sem Medo e os trabalhadores sem teto do MTST.
Defenderemos no ato o direito de Lula ser candidato, apesar das diferenças políticas e programáticas e de que nas próximas eleições estaremos engajados na candidatura do PSOL à presidência da república. Conjuntamente com isso, defenderemos a necessidade da unidade das centrais sindicais, partidos políticos e movimentos para também construir uma nova greve geral para barrar a Reforma da Previdência.
Faremos o que a esquerda socialista sempre fez em sua história: marcharemos por uma causa justa ao lado de forças políticas com as quais não temos acordo estratégico. Porque é preciso estar do lado certo. E o lado certo é na luta contra mais esse capítulo do golpe.
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