Por Luana Barbosa e Victoria Ferraro, estudantes da Unicamp, Campinas, SP
No dia 10 de Maio de 2016 estourou uma das maiores greves da história da Unicamp. O mote dela era “Cotas Sim, Cortes Não, Contra o Golpe, por Permanência e Ampliação!”. Durante 3 meses houve uma intensa disputa pela pauta das Cotas, que foi tomada como prioritária pelo Movimento Estudantil.
Após incessantes negociações, o movimento saiu com uma grande vitória. Foi acordado com a Reitoria a formação de um Grupo de Trabalho (GT) e a realização de três audiências públicas cujos temas seriam: Perspectiva histórica e o papel da Universidade Pública no Brasil, Experiências Nacionais e Internacionais do Projeto de Cotas e PAAIS, seus alcances e limites, e após as audiências iria para votação no Conselho Universitário (CONSU) um projeto de cotas étnico – raciais na Unicamp. Durante as discussões ficou evidente o acúmulo que o Movimento Negro possuía para disputar este projeto. Ao fim do processo das audiências o GT apresentou um projeto de cotas étnico – raciais para a Unicamp que consiste em reservar 50% das vagas para estudantes oriundos de escolas públicas e com renda per capita de até 1,5 salários mínimos, 37,2% (porcentagem de pretos e pardos no estado de SP) para pretos e pardos, e a criação de até duas vagas por curso para indígenas.
São nesses marcos que nessa terça-feira, 30 de maio, o Conselho Universitário votará o princípio de Cotas. A Unicamp possui mais de 10 anos de atraso em relação às primeiras instituições de ensino que implementaram as ações afirmativas. Esta Universidade é historicamente branca e possui essência elitista. Durante décadas se recusou a pagar sua dívida histórica para com a população negra. Convém que não nos esqueçamos que Campinas foi a última cidade do Brasil a abolir a escravidão, convém que não nos esqueçamos que Barão Geraldo, distrito onde a Unicamp fica, foi um grande escravocrata, convém que não nos esqueçamos que a população negra só adentra o feudo que esta Universidade se tornou em funções precarizadas, convém que a branquitude construiu a “excelência” sobre as costas e sangue de negras e negros, que jamais entraram aqui e são constantemente invisibilizados. Convém que conselheiros, professores e a branquitude da Unicamp compreendam que historicamente têm tirado proveito da desigualdade social, econômica, epistemológica e política decorrentes da era escravocrata. O ambiente universitário barra através do Racismo Institucional a entrada da população negra, não garante a permanência dos poucos que passam pelo filtro social que é o vestibular, pune aqueles que lutam por melhorias e faz questão de manter sua estrutura elitista e europeia. A Universidade continua sendo feita por pessoas brancas e para elas. A única maneira de efetivamente revertemos este sistema é começarmos a pagar a dívida histórica que as Cátedras da Academia têm para com a negritude. A entrada em massa da população negra na Universidade Estadual de Campinas também atinge um ponto muito importante dentro da Academia, a disputa epistemológica. A negritude terá mais força para questionar como o conhecimento é passado, quais autores regem a produção acadêmica e a inversão de quem é o objeto de pesquisa e quem é o pesquisador. Lutamos para que negras e negros possam ter o acesso à acumulação e sistematização do conhecimento. Queremos representatividade nas cadeiras universitárias, queremos o direito de falarmos por nós mesmos e por contarmos sob a nossa ótica como é a nossa história. Nossos corpos e mentes nos espaços importam!
Também é importante lembrar que, a Unicamp junto com a USP, as universidades de “excelência” no país, comparadas com outras universidades federais e estaduais, são retaguarda na discussão e implementação de cotas étnico – raciais. A aprovação de cotas na Unicamp no CONSU do dia 30, fortalece também a luta por cotas na USP e representa uma derrota para o governo do estado de SP que mantém nessas duas universidades redutos racistas.
Sabemos que a aprovação do principio de cotas no CONSU é só o começo de uma luta por verdadeira inclusão. Ainda teremos que lutar pela consolidação do projeto proposto pelo Grupo de Trabalho da Frente Pró-Cotas, pelo bom recebimento e permanência da população negra que está por vir, pelo fim do Eurocentrismo acadêmico e contra o racismo e suas capilaridades. Além disso, vários estudantes que participaram da greve estão sofrendo processos disciplinares, inclusive o único processo que já resultou em uma punição (suspensão por dois semestres) é de um estudante negro, Guilherme Montenegro.
No dia 30 de Maio de 2017, convidamos todas e todos ao Ato Nacional por Cotas na Unicamp. Ele acontecerá em frente ao Conselho Universitário da Unicamp. Que a partir deste dia a Universidade se Pinte de Povo!
No dia 29 também ocorrerá um festival cultural que além de várias atrações, vai contar com a presença da Preta Rara e MC Linn da Quebrada!
Confira a programação no evento:
https://www.facebook.com/events/505210786500559/permalink/507040802984224/?ref=22&action_history=%5B%7B%22surface%22%3A%22timeline%22%2C%22mechanism%22%3A%22surface%22%2C%22extra_data%22%3A%5B%5D%7D%5D
“Não temos tempo para abrir mão de qualquer instrumento de luta. Se os brancos podem abrir mão do conhecimento sistematizado, eles que abram mão. Não deixarei nenhum dos nossos abrir mão do que a humanidade produziu e tomar este conhecimento para transformar a sua e a nossa realidade. Eu afirmo que, em nossas mãos, o conhecimento sistematizado pode tomar uma dimensão revolucionária. É tudo nosso e nada deles!” (Pinho, 2015).
COTAS SIM, COTAS JÁ! QUEM LUTA PELA EDUCAÇÃO NÃO MERECE PUNIÇÃO!
Arte: Helen Aguiar
Comentários