EDITORIAL 09 DE JANEIRO | O massacre de presos em Manaus e Roraima na semana passada e agora os quatro assassinatos ocorridos em Roraima na noite de ontem escancararam mais uma vez a barbárie prisional no Brasil. Enquanto escrevemos este editorial, já passa de cem o número de mortos em presídios brasileiros em menos de um mês.
Não bastassem os dados em si, tivemos que ouvir o secretário nacional de Juventude do governo Temer, Bruno Julio (PMDB-MG) declarar que “Tinha era que matar mais. Tinha que fazer uma chacina por semana”. Isso porque Bruno Julio acha que “Esse politicamente correto que está virando o Brasil está ficando muito chato”. O agora ex-secretário de Juventude de Temer deve achar que contar mortos é algum tipo de diversão. O caso é revoltante, mas não chega a surpreender, dada a natureza reacionária do atual governo golpista e ao fato de que vivemos no país em que os responsáveis pelo massacre do Carandiru foram soltos por falta de provas.
No episódio de Manaus, a privatização da gestão prisional revelou também sua verdadeira natureza: corrupta, ineficiente e irresponsável. Segundo o próprio governo do Amazonas, apenas em 2016 foram repassados mais de R$ 300 milhões à Umanizzare por serviços de administração e segurança em seis peniteciárias do Estado. No entanto, logo depois do massacre, a empresa declarou que não tinha qualquer responsabilidade sobre o caso, uma vez que sua única função dentro dos presídios seria garantir os serviços de hotelaria elaborar atividades recreativas para o detentos.
Tudo isso não revela mais do que um quadro insustentável em termos de política de segurança pública. A população carcerária do Brasil acaba de atingir a incrível cifra de 607 mil detentos. Já há algum tempo o país se mantém no quarto lugar no ranking dos países com maior população carcerária do mundo, atrás apenas de Estados Unidos (2.217.000 presos), China (1.657.812 presos) e Rússia (642.444 presos). A taxa de encarceramento no país, ou seja, a proporção de presos para a população em geral, é também extremamente alta, com cerca de 300 presos para cada grupo de 100 mil habitantes.
E não são apenas os números absolutos e relativos que impressionam. Também a evolução do quadro prisional brasileiro é alarmante. Em 2000, o país tinha uma população carcerária de 232.755 detentos. Ou seja, o número de presos quase triplicou em 15 anos. Somente estes dados deveriam ser o suficiente para desmentir a ideia de que o Brasil é o “país da impunidade”. Ao contrário, somos um país extremamente punitivista. Mas o Brasil não se tornou um lugar mais seguro com o aumento vertiginoso da população carcerária. Isso também deveria nos fazer refletir.
Para começar a se aproximar de fato da raíz do problema, é preciso analisar não apenas os números, mas o perfil dos presos brasileiros: quem está preso e por quais crimes. O tráfico de drogas é o crime que mais encarcera no Brasil. Em 2005, os condenados ou que respondiam a processos por esse crime eram 31.520 pessoas. Uma década depois, esse número passou para 138.366, ou seja, um aumento de 339% para um único crime. Apenas o tráfico internacional de entorpecentes cresceu mais: cerca de 446% no mesmo período. Ou seja, o salto da população carcerária brasileira nada mais é do que mais um resultado da chamada “guerra às drogas”.
As medidas propostas pelo governo golpista de direita para resolver a crise carcerária (encarceramento em massa, proliferação dos presídios e endurecimento da legislação) não vão solucionar o problema. Ao contrário, seu único efeito é a intensificação do massacre da juventude pobre e negra da periferia, ou pelas mãos do tráfico ou pelas mãos do Estado e sua polícia. Quer dizer, é mais explosivo na bomba-relógio armada dentro e fora dos presídios brasileiros.
Para se ir à raiz do problema é preciso discutir a legalização das drogas. A política de “guerra às drogas” demonstrou a sua completa falência no Brasil e no mundo, levando vários países a regulamentar a produção, o comércio e o consumo dessas substâncias ou pelo menos a discutir seriamente o assunto.
É preciso colocar a produção e o comércio das drogas hoje ilícitas nas mãos do Estado, e tratar os casos de abusos ou quaisquer outros efeitos negativos do consumo única e exclusivamente como problemas de saúde pública.
Estas medidas, certamente, não resolvem de todo o problema da barbarie prisional e a lamentável situação da segurança pública no país, da qual é vítima, em primeiro lugar, a classe trabalhadora. Mas são um importante começo, e tocam num de seus aspectos primordiais.
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