Por José Aleixo
O Comprehensive Economic and Trade Agreement (“CETA”) é uma tentativa de acordo de liberalização do comércio entre o Canadá e a União Europeia (UE), tendo as suas negociações começado, pelo que se sabe, em Maio de 2009.
Este possível acordo é parte integrante de um conjunto de possíveis acordos que estão em negociação entre EUA, Canadá e UE (CETA, TTIP e TiSA).
É normal que nunca tenhamos ouvido falar desses acordos. As suas negociações têm ocorrido, ao longo dos já vários anos, de forma secreta e antidemocrática entre as cúpulas da UE, dos dos EUA e do Canadá.
O que é o CETA?
Vejamos os seus principais traços, muito semelhantes aos restantes acordos referidos:
– Implementação de um sistema de legislação e de um sistema de arbitragem judicial autônomos, que se sobrepõe aos sistemas legislativos e judiciais nacionais (medida ainda em negociação).
– Restrição e eliminação de grande parte dos procedimentos e regulamentos, internos a cada Estado, de licenciamento de projetos de investimentos como forma de não prejudicar nem atrasar as respectivas atividades empresariais [Artigo 12.3, nº 7].
– Partilha antecipada de “regulamentos técnicos […] que possam ter impacto no comércio com a outra parte” [Artigo 21.4, alínea d)], mesmo que não tenham sido discutidos nos parlamentos nacionais.
– Criação de um Fórum de Cooperação Regulamentar (“FCR”), para o qual poderão ser convidados quaisquer dos participantes que tenham interesse nos negócios comerciais em discussão, e cujo papel não será submetido a qualquer tipo de controle ou monitoramento por outros organismos independentes e democraticamente eleitos [Artigo 21.6].
De onde vem e para que serve?
Não por acaso, esse conjunto de acordos começou a ser negociado depois do início da crise econômica. Fruto das gigantescas perdas financeiras, as principais potências capitalistas puseram-se de acordo em criar mecanismos para combater conjuntamente a crise. Isso incluiu, entre outras medidas, o aprofundamento dos acordos comerciais.
Olhando para os traços gerais do CETA, acima enunciados, ficam claras as intenções de todos esses acordos comerciais: (i) Controle e limitação da função legislativa dos governos nacionais, democraticamente eleitos; (ii) Minimização do papel dos tribunais nacionais em função de um sistema de arbitragem autônomo com a finalidade de garantir os interesses das multinacionais; e (iii) aprofundar os mecanismos de destruição do valor da mão-de-obra, principalmente na UE.
É simplesmente inacreditável. O que está sendo negociado nas nossas costas não são apenas acordos comerciais, mas acordos políticos e económicos que pretendem desregulamentar como forma de elevar o interesse empresarial a valor absoluto, em sacrifício do interesse público, das condições de vida dos povos e da soberania dos Estados. Acordos como esses dão, por exemplo, capacidade às multinacionais de acionar os Estados em tribunais especialmente criados para o efeito.
Os últimos acontecimentos
No fim de Outubro, para espanto geral, já 27 dos 28 Estados da UE tinham dado o seu acordo ao CETA, faltando apenas a Bélgica. Fruto da mobilização de alguns setores sociais contra este tipo de acordos, o CETA foi momentaneamente travado por exigências de um dos governos regionais belgas, a Valônia, tendo-se decidido que o CETA irá entrar sim em vigor mas de forma escalonada.
No início de 2017, serão removidas as taxas de importação para a maioria dos bens entre o Canadá e a UE, tendo ficado suspensa a entrada em vigor do sistema de arbitragem autônomo com a finalidade de garantir os interesses das multinacionais.
Esta parte do CETA só entrará em vigor com o acordo dos 28 Estados-membros da UE. No entanto, parece óbvio que não será uma das regiões da Bélgica a impedir de forma permanente a plenitude do acordo. Essa foi apenas a forma encontrada para começar a aplicar desde já o CETA, ainda que por partes, sem colocar em questão a sua aplicação plena no futuro.
Por fim, deve-se salientar que a forma como o CETA tem sido negociado e aceito, além dos efeitos já enunciados, tem ainda como objetivo que o acordo TTIP, entre os EUA e a UE, seja igualmente aprovado.
Aliás, apesar de este ser um tratado comercial entre a UE e o Canadá, a forte presença de capitais norte-americanos naquele país, faz com que este seja, em grande medida, um acordo em benefício dos EUA – uma espécie de Plano B face ao tratado com os EUA, o TTIP, que está mais atrasado.
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