A natureza programática do Syriza é tema polêmico. Questões ligadas à permanência na zona do Euro, à dívida externa e à continuidade da Grécia na OTAN tem sido objeto de diferentes disputas internas. Elas são produto das divisões que ocorrem não apenas na esquerda grega, mas em toda sociedade. Afinal, após cinco anos de crise profunda, leituras polarizadas da integração do país à Europa não se restringem mais aos pequenos círculos políticos.[i]
Até 2012, era impossível falar de um programa unificado do Syriza, posto que os grupos integrantes da “coalizão da esquerda radical” tinham elaborações programáticas independentes. O primeiro programa unitário, apresentado nas eleições daquele ano, foi um acordo entre as correntes que começavam a se fundir. O texto sofreu sua primeira importante revisão no congresso de julho de 2013, tendo algumas modificações desde então.
A principal delas foi a introdução de um “programa inicial”, produto do discurso de Tsipras na Feira Internacional de Thessaloniki, em setembro de 2014. A feira, um evento tradicional da região dos Balcãs, convida todos os anos o líder do governo e da oposição (posto na época ocupado pelo atual primeiro ministro grego) para apresentarem suas perspectivas políticas à nação. Lá, Tsipras lançou suas diretrizes voltadas aos primeiros dois anos de gestão.
A tensão programática dentro do Syriza é compreensível. Ela expressa a pluralidade de diferentes tradições que estão ainda se integrando a um mesmo partido. Perspectivas como a do KOI, uma organização maoísta que defende a aliança entre os trabalhadores e a “burguesia nacional” contra o imperialismo, se soma às propostas radicais como as do DEA, Kokkino e APO, que afirmam reivindicar um programa de transição ao socialismo inspirado nas ideias de Leon Trotsky.
Synaspismos e o Eurocomunismo
A síntese programática mais importante para compreender o Syriza pré-2012 era aquela defendida pelo Synaspismos, principal organização a compor o novo partido. Em 2009, um novo programa foi adotado pelo grupo. Sintonizado à ala esquerda da direção, o documento, segundo Michalis Spourdalakis, ambicionava integrar elementos acumulados ao longo da experiência do Syriza para aproximar o Synaspismos ao resto da coalizão:
“Publicado mais tarde na forma de um livro com quase 400 páginas – uma pratica incomum ao programa de um partido político – ele lidava com quase todos os aspectos da vida pública e das políticas de Estado. O documento foi elaborado coletivamente por centenas de ativistas e especialistas tanto de dentro do Synaspismos e do Syriza quanto de fora dele. Na introdução de quarenta páginas em que as coordenadas ideológicas foram apresentadas, a visão de uma “sociedade de necessidades” foi sobreposta à existente “sociedade dos lucros”. Chamou-se também por uma reconquista do “espaço público” que se encontrava ameaçado por privatizações.” (SPOURDALAKIS 2012)
Assim como todos os documentos de sua história, o Synaspismos reivindica a tradição marxista. Soma-se a isto a proposta de defesa do “Socialismo no século XXI”. Outro ponto importante a se observar é a evolução do partido em torno da chamada “integração europeia”. Segundo Nikolaos Nikolakakis, durante os anos 90 e o início dos 2000, o partido defendia abertamente a União Europeia (EU):
“Como resultado de sua visão pro-integração, o partido votou a favor da ratificação do acordo de Maastricht em julho de 1992 [que fundou a UE]. Na decisão oficial do Comitê Central de Política, afirma-se sobre o tratado que o ‘Synaspismos foi fundado com uma força da esquerda europeia. Um dos principais elementos desta identidade é uma orientação europeia estável’.” (NIKOLAKAKIS, 2014)
Em 2010, porém, sob o impacto da radicalização da esquerda grega frente à crise, o partido realizou uma autocrítica em seu congresso. A decisão de apoiar o Tratado de Maastricht, mesmo que criticamente, foi avaliada como um erro programático grave, fruto de uma leitura incorreta do internacionalismo europeu. No mesmo documento, afirmou-se:
“A outra solução é a luta dos povos da Europa por mudanças na correlação de forças em cada e todo país, assim como a coordenação comum da luta por uma outra Europa. Uma Europa democrática e social, livre do monetarismo e a compulsão do capital.” (NIKOLAKAKIS, 2014)
O primeiro programa do Syriza
O primeiro programa unificado do Syriza, de 2012, além de beber na fonte do Synaspismos, se alimentava das ideias de todos os outros setores que compunham a coalizão. Ele possui diversos elementos de natureza anticapitalista. Chama atenção, entre outras coisas, o ponto 4 do programa, sobre a “reconstrução social e ambiental produtiva”. Defende-se nos dois primeiros subitens:
-
“Nacionalização/socialização dos bancos, e sua integração a um sistema bancário público sob controle social e operário, a serviço do desenvolvimento. A escandalosa recapitalização dos bancos precisa se encerrar imediatamente;
-
Nacionalização de todos os serviços públicos de interesse estratégico que foram privatizados até agora. Administração de bens públicos baseados na transparência, controle social e planejamento democrático. Apoio ao fornecimento de bens públicos.” (SYRIZA, 2012)
O ponto central do texto, porém, gravita em torno da questão da dívida com a Troika. A própria estatização dos bancos seria um coproduto da reestruturação financeira, que provavelmente não aguentariam o impacto das mudanças. Quanto à dívida, declara-se:
“A dívida nacional é primeiro, e antes de tudo, um produto das relações de classe, que são desumanas em sua própria essência. É produto da evasão fiscal dos ricos, do saque aos fundos públicos e gastos exorbitante em armas e equipamentos militares. Por isto, exigimos imediatamente:
- Moratória sobre o serviço da dívida;
- Negociações para seu cancelamento, com proteção a fundos de pensão e pequenos poupadores. Isto será viabilizado por todos os meios possíveis, como uma auditoria da dívida e a suspensão de seu pagamento.” (SYRIZA, 2012) (grifo próprio)
Não há menção direta e específica, no programa de 2012, a moeda única europeia. O retorno ou não ao Drachma, a moeda grega anterior ao Euro, está contido na formulação “por todos os meios possíveis”. A manutenção do Euro estaria, portanto, submetido às negociações com a Troika. Caso a mesma fracasse, “todos os meios possíveis”, incluindo a saída do Euro, estariam abertos. (KOUVELAKIS; BUDGEN, 2015)
Junto à questão financeira, diversas medidas econômicas e sociais do programa de 2012 entravam em choque com a ordem vigente na Grécia. Entre elas poderia se destacar a retomada do emprego por meio de intervenção estatal direta, a reposições do salário mínimo aos níveis anteriores aos acordos com a Troika, e uma série de medidas sociais que incluíam elementos como a estatização dos hospitais e a ocupação, pelos sem-teto, de prédios de propriedade dos bancos e do Estado.
No campo da política internacional, a questão de maior destaque é a chamada pelo “desligamento da OTAN e fim das bases militares estrangeiras em solo grego”. Junto a ela se soma a “abolição de toda cooperação militar com Israel” e uma política de paz voltada à Turquia, inimiga histórica da Grécia. (SYRIZA, 2012)
A questão do Euro
A formula sobre o Euro, ao lado da questão da dívida, é o ponto mais polêmico das discussões programáticas do Syriza. Houve, mesmo que de forma pouco clara, uma ruptura programática com a proposta de submissão da continuidade na moeda única às negociações com a Troika. Ao mesmo tempo, ela não se encontra de forma explícita nos Anais do congresso de 2013, que marcou a primeira revisão sistemática do programa. A expressão “por todos os meios possíveis” foi eliminada do documento de fundação do partido, mas a ambiguidade contida na sua proposta, mesmo que de forma menos comprometedora, se manteve:
“Assim como foi expresso no nosso antigo slogan “nenhum sacrifício pelo euro”, a prioridade absoluta do Syriza é impedir o desastre humanitário e cumprir demandas sociais, e não nos submeter às obrigações assumidas por outros que hipotecaram o país. Comprometemos-nos a derrubar qualquer ameaça ou chantagem dos credores por todos os meios que conseguirmos mobilizar, estando inteiramente preparados para lidar com qualquer futuro acontecimento, tendo clareza que em tal caso contaremos com o apoio do povo grego.” (SYRIZA, 2013)
O programa do Syriza, porém, assim como de qualquer outro partido, não se reduz aos textos aprovados em congressos. Ele também é a síntese das declarações e posicionamentos públicos de seus dirigentes, seus materiais publicados e toda uma gama de expressões de ideias que visam ser convertidas em ação. Segundo Stathis Kouvelakis, dirigente da Plataforma de Esquerda, principal corrente da oposição no partido, uma série de declarações dos dois principais economistas do Syriza, Giannis Dragasakis e George Stathakis, tem ido contra as deliberações congressuais. O mesmo se aplica a Tsipras:
“Quando, por exemplo, ele foi a Nova York e deu uma palestra no Brookings Institute, ele repetidamente se referiu ao “New Deal” e a Franklin Roosevelt. Quando em Austin, no Texas, ele disse que o Syriza jamais abandonaria o Euro, mesmo considerando que a posição do partido – e ele próprio afirmou isto mais tarde – era de que não queremos ficar incondicionalmente no Euro, sem ressalvas e tudo mais.” (KOUVELAKIS; BUDGEN, 2015)
Para Kouvelakis, as posições mais conservadoras em torno do euro no Syriza são influenciadas pelo euro-comunismo alemão:
“Um papel central [na difusão de posições pro-Euro] é desempenhado pelo Die Linke e o Instituto Rosa Luxemburgo. Eles cumprem o papel de difundir uma série de temas em torno de uma agenda por reformas internas na União Europeia, uma compreensão comum à crise e de que a forma para superá-la seria essencialmente ligada ao tema da redistribuição.
Por detrás disto existe a ideia que temos que mudar a correlação de forças diretamente no nível da União Europeia, evitando medidas unilaterais em escala nacional. Eles também empregam a estratégia de afirmar que o retorno ao Drachma seria uma regressão, pois expressaria nostalgia pelo velho Estado-nação e este tipo de coisa.” (KOUVELAKIS; BUDGEN, 2015)
A proposta de ambiguidade programática expressa na frase “por todos os meios possíveis” também tem seus críticos à esquerda. Eles existem dentro e fora do Syriza. Panagiotis Lafazanis, o atual ministro de Energia, Reconstrução Produtiva e Meio Ambiente e único representante da Plataforma Esquerda no alto escalão do governo, defende abertamente preparar um retorno à Drachma. (KOLKE, 2012) Já o Antarsya, por exemplo, adota como slogan “sair do Euro de forma anti-capitalista” no seu programa. Ele acredita que a ausência de posições públicas anti-Euro pela extrema esquerda, entre outras coisas, abrem espaço para a direita nacionalista e os neo-nazistas da Aurora Dourada.
Já os debatedores que reivindicam o slogan “nenhum sacrifício pelo Euro” gostam de ressaltar a natureza tática da medida. Uma pesquisa do jornal grego Kathimerini, alguns meses antes das eleições de 2012, quando o primeiro programa do Syriza foi formulado, afirmava que 66% população grega acreditava que o retorno ao Drachma seria algo ruim (THOMAS, 2011). A ambiguidade programática, portanto, teria seu rumo definido pela própria dinâmica da luta de classes. Frente a um possível ultimato da Troika, exigindo que caso o país rompesse com a austeridade teria de ser expulso do Euro, tanto as massas quanto o programa partidário poderiam evoluir a uma linha mais radical.
A revisão programática de 2013
Ao contrário do primeiro programa, de 2012, as reformas programáticas do congresso de 2013 foram produto de intensos debates entre delegados do partido. Nele, elementos importantes foram reafirmados, como que “o objetivo estratégico do Syriza é o socialismo do século 21 na Grécia e Europa”.
Ao mesmo tempo, formulações anti-capitalistas que colocavam o partido em choque direto com a Troika foram flexibilizadas pela ala majoritária do partido, ligada a Tsipras. A saída unilateral da OTAN, por exemplo, tornou-se a defesa da “dissolução” da entidade. A nacionalização do sistema financeiro foi substituída pela forma ambígua de melhor “controle social” sobre ele. No campo da dívida externa, a proposta por “cancelamento” foi alterada para “renegociação”, sendo também apresentada a ideia de uma divisão da dívida entre uma parte legitima e outra ilegítima. Esta foi a votação mais apertada para a direção majoritária, que viu 40% do congresso se opor a ela.
As propostas da plataforma de esquerda, que foram todas rejeitadas por uma média de dois terços do congresso, visavam “um comprometimento mais explícito que não permitiria interpretações moderadas” do texto. Neste sentido, segundo o DEA, “a votação do congresso em temas políticos não foi uma guinada à direita, mas a recusa de abandonar o status quo por declarações mais explícitas e radicais” (PRETOUS, 2013). As afirmações do grupo sobre a ausência de uma “guinada à direita”, porém, são rejeitadas pela sessão grega do Secretariado Unificado da Quarta Internacional, que integra o Antarsya, e alguns observadores internacionais presentes no congresso. (ARBEITERMACHT; SUCHANEK, 2012).
Independentemente deste debate, as quatro emendas apresentadas pela Plataforma de Esquerda continham elementos anticapitalistas inquestionáveis. Diziam as resoluções:
- Repudio total à dívida grega, apoio ao cancelamento de todos os empréstimos feitos com a Troika, e dispor-se unilateralmente a encerrar os pagamentos se este for o único meio possível para cancelar a dívida.
- Nacionalização sob controle operário de todo sistema financeiro e todos os setores estratégicos da economia, como meio necessário para satisfazer as necessidades dos trabalhadores e enfrentar os ataques dos capitalistas feitos contra a classe operária.
- Formação de um governo de esquerda disposto e preparado para romper com o Euro e a União Europeia. Isto deve ser um compromisso público para reverter a austeridade por “todos os meios possíveis”, incluindo a saída da zona do euro como forma de enfrentar as chantagens da União Europeia.
- Defender uma frente de partidos de esquerda, incluindo o KKE e o Antarsya, e rejeitar cooperação com qualquer força política ou político de peso que aceitou ou aplicou as políticas de austeridade, incluindo o DIMAR. Devemos buscar um governo de esquerda que não esteja disposto a alianças com a centro-esquerda, com “democratas” da direita ou partidos de direita contrários aos acordos com a Troika. (PERTOU, 2013).
O congresso e a democracia interna
A democracia interna do Syriza também foi bastante discutida no congresso, que naquele momento elaborava o estatuto da organização. Ponto polêmico proposto pela direção majoritária foi a tentativa de proibir a existência de grupos e seriamente restringir correntes internas. A medida atendia, segundo a principal figura pública da Plataforma de Esquerda, Stathis Kouvelakis, às pressões da imprensa para que a liderança do Syriza controlasse a esquerda do partido.
A proibição de grupos internos visava enfraquecer principalmente o DEA, organização que reivindica o trotskismo e representa o polo mais crítico a Tsipras. A proposta, porém, encontrou fortes resistências mesmo entre os setores mais à esquerda da direção majoritária. Figuras públicas como Manolis Glezos, líder da resistência à ocupação nazista durante a Segunda Guerra Mundial, por exemplo, fez um discurso duro contra Tsipras em defesa dos trotskistas. Segundo o DEA:
“A proposta [da maioria] foi emendada com uma resolução afirmando que a futura existência de grupos dentro do Syriza, e a forma com que poderão operar, será decidida apenas após ‘consultas mútuas’, que ocorrerão por um ‘período razoável de tempo’”. (PRETOUS, 2013)
Outro ponto preocupante foi o grupo de Tsipras ter insistido que ele fosse eleito presidente do partido diretamente pelo congresso, e não pelo comitê central que estava sendo selecionado. Colocou-se, portanto, o atual primeiro ministro grego acima de todos os órgãos partidários, ao qual em um regime democrático ele teria de prestar contas. Ao apresentar o Programa de Thessaloniki, por exemplo, Tsipras sequer sentiu necessidade de discuti-lo com a liderança do Syriza, dado que a forma pela qual foi eleito presidente do partido lhe permitia fazer isto.
O “programa inicial” de Thessaloniki
O programa apresentado na feira de Thessaloniki selecionou alguns pontos do documento aprovado no congresso como prioridades governamental do Syriza. O programa inicial está dividido em quatro temáticas: Enfrentar a crise humanitária; Retomar a economia e promover um sistema de impostos justos; retomar os empregos; transformar o sistema político para aprofundar a democracia.
Grande parte das propostas gira em torno de temas como subsídios à alimentação dos mais pobres, eletricidade gratuita aos que tiveram seu acesso à luz cortado por falta de pagamento (algo importante em um país com inverno rígido), passe livre para pobres e desempregados e outras medidas de assistência social. No campo da “Retomada dos empregos”, é proposta a reversão de todas as leis de proteção trabalhistas revogadas pelos acordos com a Troika, com peso especial ao retorno do direito a acordos coletivos e proibição de demissões em massa. A proposta mais audaciosa se localiza no campo da retomada dos empregos, propõem-se:
“Aumentar em 300.000 os empregos em todos os setores da economia – pública, privada, social – é o esperado efeito do programa de dois anos para a retomada dos empregos. Tal plano é indispensável para absorver os estruturalmente desempregados, particularmente aqueles com mais de 55 anos, assim como os jovens desempregados, que ficariam de fora de um possível crescimento econômico. Nosso plano é garantir recursos para expandir o seguro-desemprego a uma quantidade maior de beneficiados.” (SYRIZA, 2014)
Todas estas ideias partem do pressuposto de que o governo solucionará a questão da dívida com a Troika. Para tanto, no item que antecede os quatro pontos temáticos, “contexto para a negociação” exige-se:
- Eliminação da maior parte do valor nominal da dívida pública para que ela se torne sustentável no contexto de uma “Conferencia da Dívida Europeia”. Isto ocorreu na Alemanha em 1953. Pode também ocorrer no sul da Europa e na Grécia;
- Incluir uma “cláusula de crescimento” na reposição da parte remanescente da dívida, para que ela seja baseada em crescimento e não no orçamento;
- Incluir um período significativo de suspensão (moratorium) no serviço da dívida para salvar recursos para o crescimento;
- Excluir investimentos públicos das restrições no pacto para estabilidade e crescimento;
- Um “New Deal Europeu” de investimento público financiado pelo banco de investimento europeu;
- Flexibilização quantitativa pelo banco central europeu com compra direta de títulos soberanos;
- Por último, declaramos mais uma vez que o tema do empréstimo forçado exigido do Banco da Grécia pela ocupação nazista ainda é um tema em aberto para nós. Nossos parceiros sabem disto. Isto integrará a política oficial de nosso país desde nosso primeiro dia no poder. (SYIRIZA, 2014)
É inquestionável que o “programa inicial” de Thessaloniki carece dos elementos anticapitalistas presentes principalmente na proposta de 2012 do Syriza. Além do mais, expressões como “New Deal”, que sequer aparecem no programa oficial aprovado no congresso de 2013, ganham grifo na carta. O programa de Thessaloniki, apesar do conteúdo anti-austeridade, é de natureza claramente keynesiana.
O argumento da direção do partido é que o programa Thessaloniki é composto apenas de medidas imediatas e não negociáveis. O custo do programa, avaliado em 12 bilhões de euros, obrigará o governo a taxar grandes fortunas e desmontar oligarquias burguesas. O programa de Thessaloniki não se choca com o programa aprovado no congresso, e deve ser interpretado como expressão do primeiro momento do governo Syriza.
Entre seus apoiadores mais à esquerda, afirma-se que dentro dos marcos das políticas de austeridade, o programa Thessaloniki representa uma ruptura brusca com o curso anterior do país. Que sua aplicação é impossível sem o desencadeamento de um processo de radicalização que o empurre à esquerda, sendo o primeiro momento de uma guinada anticapitalista.
O programa do Syriza, para Kouvelakis, assim como boa parte da ala esquerda do partido, é, no mínimo, ambíguo. Segundo ele, “nem tudo está claro, sabe? Para colocar as coisas de forma delicada: há muito que precisa ser clarificado no programa do Syriza” (KOUVELAKIS; BUDGEN, 2015). Outros setores da esquerda grega, como o Antarsya e o KKE, consideram o partido e seu programa abertamente reformista. O debate programático, porém, não existe dentro de um vácuo político. As inflexões à esquerda e à direita do Syriza, ao seu modo, acompanharam a dinâmica do movimento de massas. Em 2012, quando o Syriza lançou seu programa mais à esquerda, haviam grandes mobilizações operárias, populares e estudantis. Quando Tsipras apresentou as ideias do programa inicial de Thessaloniki, elas praticamente não existiam mais. Por conta disto, o próximo artigo, Syriza: Partido e Luta de Classes, discutirá o contexto político e social no qual o programa do partido que governa a Grécia será aplicado.
Referências bibliográficas
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SAUDA; Aldo Cordeiro: Syriza: partido e movimento, Blog Convergência, 2/02/2015 http://blogconvergencia.org/blogconvergencia/?p=2830
SKOUFOGLOU, Manos: The Intervention of the FI in Greece, International Viewpoint, 14/01/2014 http://www.internationalviewpoint.org/spip.php?article3237
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[i] O presente artigo é o segundo de uma série de quatro. Além de Syriza: partido e movimento, os próximos artigos, Syriza: partido e política internacional, Syriza: partido e governo e Syriza: partido e marxismo, discutirão a localização da organização dentro da dinâmica da política europeia e nacional além da relação do partido com o marxismo grego.
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