Este texto se propõe a ser uma provocação inicial objetivando um continuo aprofundamento das análises a partir de questionamentos de verdades únicas.
Muitas vozes se levantam para dizer que a esquerda, principalmente o Partido dos Trabalhadores, abandonou as bases. Isso significa que as estruturas partidárias e organizações políticas pararam de investir recursos, tempo e pessoas na manutenção dos trabalhos de base.
Por vezes vemos essa análise vinculada ao marco temporal da chegada do Lula à presidência, e culpabilizando a retirada das lideranças de suas bases para assumirem cargos na burocracia estatal.
Essa análise faz sentido e encontra exemplos na realidade que evidenciam que esse fenômeno ocorreu. Mas será que esse fenômeno sozinho dá conta de explicar as dificuldades na manutenção das bases? Será que houve uma burocratização geral das lideranças encastelando todas em cargos?
Acho difícil sustentar respostas simples para problemas complexos, e também acho que as proporções precisam ser resguardadas.
O PT é visto pelo mundo como maior partido de esquerda da América Latina, é o segundo maior partido do Brasil em número de filiados. De acordo com pesquisa da Opará Eleições de 2024, o PT disputou candidaturas ao legislativo municipal em 3115 cidades, das 5570, em contraste o PSOL que esteve presente em 475.
Com esses números refletindo a extensão é difícil imaginar que todas as lideranças foram burocratizadas em cargos pois não há cargos para cobrir esse tamanho.
Também é difícil imaginar que houve um desinvestimento geral nos trabalhos de base e que o partido continuasse a ter a inserção social que possui.
Se é difícil imaginar tamanho cenário de desmonte em contraste com a realidade do partido, será que além do prejuízo de alguns trabalhos e da burocratização de algumas lideranças não houve a perda de espaços para outras forças, inclusive reacionárias, que disputam os mesmos territórios?
Será que as pastorais católicas e as comunidades eclesiais de base foram abandonadas ou os movimentos oriundos da renovação carismática aumentaram sua influência nesses espaços?
Será que as associações de bairro foram abandonadas ou a influência dos partidos da direita tradicional desmontaram ou tomaram esses espaços?
Será que as periferias foram abandonadas ou o crescimento da violência e a influência e controle de grupo armados sobre os territórios impossibilitaram alguns trabalhos?
Essas e outras questões refletem as dinâmicas de disputa política da classe e abrem para refletir mudanças nas condições objetivas da realidade como condições de trabalho, aumento do controle do nosso tempo pelo capital, questões que impõem outras tarefas e formas de organização.
Acredito que antes de anunciar uma morte da esquerda e centrar a responsabilidade sobre os desafios que enfrentamos em nós mesmo, nos nossos erros, onde parece que a solução é simplesmente ressuscitar uma esquerda ideal, talvez seja mais interessante reconhecer os erros como mais um dos elementos que ajudam a explicar onde estamos.
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