As eleições municipais no Rio de Janeiro se aproximam, em um quadro ainda bastante frio do ponto de vista do debate entre a população em geral. O cenário eleitoral vai se desenhando em torno a 3 principais candidaturas:
- Eduardo Paes (PSD), atual prefeito e representante de uma ampla coalizão de partidos, a maioria de direita.
- Tarcísio Motta (PSOL), deputado federal e professor. Contará com uma aliança com a Rede e, provavelmente, com o PCB, além do apoio de importantes movimentos sociais e de setores de partidos de esquerda.
- Alexandre Ramagem (PL), principal pré-candidato bolsonarista, deputado federal e ex-diretor da Abin, quando foi pivô dos escândalos relacionados ao uso ilegal de Bolsonaro da agência de inteligência.
As pesquisas de intenção de voto, guardadas as variações entre institutos e período de coleta das amostragens, indicam, em geral, favoritismo para Paes, deixando em aberto seu adversário em um potencial segundo turno.
Em todo o Brasil, as eleições municipais oferecerão um primeiro recenseamento das forças políticas, após o fim do governo Bolsonaro. O Rio, capital das milícias e berço do bolsonarismo, será um teatro importante dessa disputa. Está chegando a hora da esquerda ir às ruas apresentar suas bandeiras e lutar pelo voto do povo carioca, para levar Tarcísio ao segundo turno.
A primeira e mais importante tarefa: combater o bolsonarismo!
O fato do candidato bolsonarista aparecer atrás nas pesquisas, neste momento, não pode provocar uma ilusão de ótica na militância da esquerda. O bolsonarismo não é apenas uma matriz das preferências eleitorais e suas flutuações, mas sim um movimento massivo e organizado. Nós já aprendemos, e de forma bastante amarga, que o voto bolsonarista é verticalizado e coeso, suficiente inclusive para eleger figuras que, antes das eleições, eram ilustres desconhecidos.
As condições para o crescimento da candidatura de Ramagem não estarão mais colocadas? Infelizmente, essa não parece ser uma boa aposta. A frente entre setores da burguesia, igrejas neopentecostais e milícias segue ativando e mobilizando o movimento neofascista, oferecendo-lhe suporte econômico, ideológico e territorial. Não há qualquer indício de que tal sustentação social para o bolsonarismo esteja se erodindo, no Rio de Janeiro – muito ao contrário.
É possível derrotar a extrema direita, com a condição de que a esquerda carioca esteja preparada para o combate, colocando no centro da estratégia eleitoral a luta contra o bolsonarismo, representado na candidatura de Ramagem. É a partir dessa localização que é possível demonstrar pacientemente que a prefeitura de Eduardo Paes, com seu modelo de cidade-negócio, não é uma trincheira segura de contenção da extrema direita.
Eduardo Paes merece a confiança do eleitor da esquerda?
Frente à evolução desastrosa do cenário político no Brasil dos últimos anos, os mais lúcidos dos eleitores de esquerda sabem muito bem que nada é pior que a ameaça expressa por Bolsonaro e seus seguidores. Por isso, é bastante compreensível que, partindo desse ponto de vista, haja eleitores de esquerda inclinados, desde já, a votar em Paes, com maior ou menor entusiasmo. Queremos, portanto, dialogar com esse sentimento, porque, como dito, compreendemos. Mas não podemos concordar.
Paes é um político da direita tradicional já em seu terceiro mandato de prefeito. Suas gestões estiveram sempre identificadas com um modelo de cidade como um negócio ou, mais bem dito, cidade para os que nela fazem seus negócios. Seu projeto político se assenta em uma associação com o grande empresariado, cujos interesses mais de fundo não pode contrariar.
Essa contradição esteve presente neste último mandato, quando, por exemplo, a bancada do PSOL na Câmara enfrentou medidas da prefeitura como a aprovação das contas do ex-prefeito Crivella, uma proposta de plano diretor desenhado ao gosto da especulação imobiliária ou, ainda, o projeto pelo armamento da guarda municipal.
A situação dos serviços públicos em nossa cidade são uma comprovação da opção de Paes pelo modelo neoliberal. Para ficar num exemplo, a rede municipal de educação, uma das maiores do mundo, sofre com uma crise estrutural em grande parte de suas escolas, os profissionais de educação sofrem com o arrocho salarial, existe uma expressiva falta de professores e outros profissionais, mas a atual prefeitura não convoca os concursados, avançando na terceirização e precarização dos trabalhadores da educação. As merendeiras e cozinheiras sofrem com falta de pagamento e precarização das relações de trabalho.
O problema, portanto, não é apenas que Eduardo Paes não tenha compromisso com um projeto sintonizado com as demandas populares – o que já seria bastante sério. Mas o fato de que, diante da presença da extrema-direita, sua prefeitura, ao implementar medidas em desfavor das condições de vida do povo trabalhador, termina, em última instância, reforçando os ressentimentos por onde o bolsonarismo se constroi.
Com Tarcísio Motta, lutar para levar à esquerda ao segundo turno
O PSOL apresentará a candidatura de Tarcísio Motta, um candidato de reconhecida trajetória parlamentar e nas lutas dos movimentos sociais. Ao mesmo tempo, o partido vem defendendo a formação de uma frente que unifique toda a esquerda em uma mesma candidatura. Uma reviravolta de última hora seria tão bem vinda quanto encontraria o PSOL de portas abertas a essa hipótese.
Em várias capitais e cidades importantes, existe uma dinâmica muito positiva de construção de frentes de esquerda, como, por exemplo, em São Paulo e Belém (onde o PSOL vai encabeçar alianças com apoio do PT e outros partidos de esquerda) ou Belo Horizonte e Porto Alegre (onde o PT vai encabeçar alianças com apoio do PSOL e outros partidos de esquerda).
Contudo, a esta altura, é notório que nas eleições da cidade do Rio de Janeiro a hipótese mais provável é que a esquerda, infelizmente, se apresente dividida. Prevalece na direção do PT e demais partidos federados a continuidade da estratégia representada pela presença na última gestão da prefeitura, a ser renovada pela aliança eleitoral com Eduardo Paes – ainda que, mesmo com a desistência do deputado federal Pedro Paulo (PSD), o prefeito não pareça disposto a oferecer a vaga de vice em sua chapa a um partido de esquerda.
Há, em todo caso, uma dissidência no interior do Partido dos Trabalhadores no que diz respeito a essa política, no que se destaca o papel do deputado federal Lindbergh Farias. É um fato muito positivo que uma parcela da militância petista venha pautando a necessidade de uma frente de esquerda – o que poderá desembocar, na campanha eleitoral, em um movimento de “petistas com Tarcísio”, somando forças para levar a esquerda, com suas bandeiras e propostas, ao segundo turno.
Há, ainda, importantes movimentos sociais que também formalizaram o apoio a Tarcísio. Além do PSOL, a Rede e o PCB, Lindbergh e os petistas com Tarcísio, o MST, MTST, MNU, CMP, MNLM e MUCA devem ser parte ativa em todos os aspectos da campanha eleitoral. Podemos e devemos construir uma frente de esquerda possível, para ampliar a luta para colocar Tarcísio no segundo turno. Além da importância em termos puramente eleitorais, essa aliança pode construir e fortalecer pontes valiosas no sentido da unidade da esquerda, durante e depois das eleições para enfrentar a extrema direita.
As recentes eleições legislativas na França mostraram que é a unidade da esquerda e dos movimentos sociais, com um programa conectado com as transformações exigidas pela maioria da população, que é o melhor caminho para derrotar a extrema direita, apresentando também uma alternativa ao neoliberalismo representado pela direita tradicional.
Por um Rio de direitos, contra o bolsonarismo e o projeto neoliberal
Em um processo de longa duração, o Rio vem há décadas reduzindo seu peso econômico relativo no cenário nacional. Soma-se a isso o esgotamento de um modelo que teve como apogeu os megaeventos, com a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Por sua vez, o avanço territorial e institucional das milícias, e a consequente deterioração da política fluminense, completam um quadro de hierarquias e desigualdades cada vez mais rígidas e aparentes.
O Rio é, hoje, uma cidade mais cara, mais desigual e mais violenta, em todos os sentidos – o que rebaixa as condições de vida da classe trabalhadora e exaspera as classes médias. Não se pode inverter essa situação e tampouco minar as bases de crescimento do bolsonarismo em um consenso com o grande empresariado carioca.
Para garantir direitos e serviços públicos de qualidade, será preciso contrariar interesse dos que lucram com o sucateamento e a privatização, seja da saúde, da educação, do transporte ou da assistência social. Para construir moradia digna, não se pode atender ao mesmo tempo os que acumulam com a especulação imobiliária. Para fortalecer a cultura de um ponto de vista popular; para lutar contra as opressões machista, racista e LGBTfógbica ou, enfim, para elevar as condições de vida da maioria do povo, será preciso independência e muita organização popular.
São as bandeiras de luta da esquerda e dos movimentos sociais que precisam estar articuladas em um programa de mudança efetiva para o Rio de Janeiro, em favor da população trabalhadora.
Ver esta publicação no Instagram
Comentários