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EDITORIAL

Mudar a estratégia para derrotar o bolsonarismo

O retorno da extrema direita às ruas e a queda da popularidade do governo Lula acendem sinal de alerta. É preciso reorientar a linha política

Editorial Esquerda Online
Ricardo Stuckert (Lula) e Rovena Rosa/Agência Brasil (Fundo)

Há uma conjuntura desafiadora no país. Apesar do crescente cerco do STF a Bolsonaro e demais golpistas, a extrema direita se mantém com enorme força política, voltando a ocupar as ruas. Embora os indicadores econômicos sejam positivos, com crescimento do PIB e diminuição do desemprego, há queda da popularidade de Lula, revelando aumento da insatisfação popular. Ainda que a esquerda tenha vencido a eleição presidencial, há inegável dificuldade de mobilização social no seu campo. Se bem que venceu no voto o projeto de mudanças progressivas, há muitos obstáculos aos avanços num Congresso dominado pelo centrão e perante as amarras impostas pelo arcabouço fiscal.

O fato é que a receita adotada até aqui pelo governo está curta, sendo incapaz de diminuir a influência da extrema direita na sociedade e alavancar a aprovação de Lula. O perigo do bolsonarismo segue vivo, mesmo com a derrota do golpe de 08 de janeiro e os processos judiciais em curso. Fortalecido pelo ato na Paulista em fevereiro, Bolsonaro convocou dias atrás manifestação golpista no Rio de Janeiro, dia 21 de abril.

Refém no Congresso das chantagens de Artur Lira, o governo aposta todas fichas na gestão econômica conservadora de Fernando Haddad, que tanto agrada ao mercado, e na firme ação de Alexandre de Moraes contra Bolsonaro e os golpistas. Mas isso não vem sendo suficiente. Vale notar que, a piora na avaliação do governo, se não for revertida a tempo, pode afetar negativamente a esquerda na batalha contra o bolsonarismo nas eleições municipais. Consciente da situação complicada, o governo debate internamente a correção de rumos.

Que rumo adotar?

Qual deve ser a nova orientação do governo Lula? Há, na esquerda, setores que defendem que, diante das adversidades postas, é necessário aumentar as concessões ao centrão, mercado financeiro, militares e agronegócio.

Essa avaliação está na base de algumas políticas do governo que não contribuem nem com o aumento da popularidade governo, nem com o enfrentamento necessário ao bolsonarismo. Por exemplo, o ajuste fiscal, a proposta de reajuste zero para o funcionalismo, o silêncio de Lula no aniversário de 60 anos do golpe de 64 e o estímulo às parcerias público-privadas, que resultam em privatizações, vão na contramão do programa que elegeu Lula. Essa estratégia de concessões permanentes à direita desconsidera a importância da construção de mobilizações em defesa de medidas populares, contra as quais o centrão de Lira e a extrema direita agem sistematicamente no Congresso.

Pensamos diferente. Diante dos perigos colocados na conjuntura, consideramos que é preciso um giro do governo Lula em sentido oposto, uma nova estratégia. A primeira e mais importante linha de mudança deve ser a reorientação da política econômica, que está asfixiada pelo arcabouço fiscal.

É necessário entregar melhorias concretas e robustas ao povo trabalhador, para, assim, recuperar apoio popular e avançar sobre a base bolsonarista. Precisa-se de mais medidas como o programa Pé de Meia, anunciado essa semana, que vai beneficiar estudantes pobres do ensino médio.

No 1° de maio, Lula poderia anunciar novo aumento real no salário mínimo, reajuste no Bolsa Família, aumento salarial para os servidores em greve e isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.

No 1° de maio, Lula poderia anunciar novo aumento real no salário mínimo, reajuste no Bolsa Família, aumento salarial para os servidores em greve e isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil. Um plano efetivo para baixar o preço dos alimentos básicos também seria muito importante. Essas medidas seriam muito bem recebidas na classe trabalhadora, especialmente nas camadas de menor renda.

O segundo aspecto de mudança se refere à adoção de uma linha ativa do governo Lula na promoção de campanhas de conscientização política e ideológica junto ao povo. Isso passa, entre outras coisas, pela construção da mobilização popular para sustentar a aprovação de medidas sociais e democráticas progressivas. Um dos desafios na disputa pela consciência das massas é, por exemplo, manter e ampliar a maioria social favorável à prisão de Bolsonaro e dos generais envolvidos na tentativa de golpe de Estado. Sem anistia!

Disputar o povo contra as ideias do bolsonarismo

Enquanto Bolsonaro atua para preservar sua base social intacta, coesa e mobilizada, o governo se mantém completamente distante da disputa pelas ruas. Atuando meramente no plano institucional, acaba por reforçar o quadro de desmobilização reinante no campo da esquerda e a falta de coesão política na base social de apoio. Lula não convocou um ato popular até aqui. Além disso, ao passo que o bolsonarismo mantém carga máxima na sua eficiente e ampla rede comunicação, o governo é tímido na disputa política e ideológica, tendo uma política de comunicação débil e envelhecida.

O Brasil atual é muito diferente do período dos primeiros governos do PT, quando a oposição era liderada pelo frouxo PSDB. Agora existe uma extrema direita influente e raivosa, com sólida implantação social e conexões internacionais. Essa força fascista mobiliza sua base social em torno de bandeiras políticas e ideológicas bem definidas e a organiza cotidianamente nas redes sociais, em igrejas evangélicas e nos quartéis. O bolsonarismo atua no plano institucional e eleitoral, mas não abre mão da disputa ideológica na sociedade e da luta direta nas ruas.

Por isso, é um grave equívoco acreditar que somente com pequenas melhorias econômicas e a ação do STF será possível derrotar a extrema direita e garantir a reeleição de Lula.

Por isso, é um grave equívoco acreditar que somente com pequenas melhorias econômicas e a ação do STF será possível derrotar a extrema direita e garantir a reeleição de Lula. Um giro à esquerda se faz necessário, com medidas concretas voltadas ao povo trabalhador, intensa disputa  ideológica e construção de mobilização popular.