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BRASIL

Já foi tarde: os crimes de Dallagnol

Famoso pelo slide de power point que usou para apresentar as acusações contra Lula, no contexto da operação Lava Jato, o agora ex-deputado federal chamou de “canetada” a votação unânime no TSE pela cassação do seu mandato

Henrique Canary, da redação
Marcelo Camargo/Agência Brasil

O Tribunal Superior Eleitoral cassou nesta terça, 16, por unanimidade, o mandato do ex-coordenador da Força Tarefa da Lava Jato no Ministério Público, o deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR). Dallagnol foi considerado culpado de fraudar a Lei da Ficha Limpa, lei essa tão cara aos defensores da luta contra a corrupção no país. Segundo o ministro Benedito Gonçalves, relator do caso no TSE, a fraude consistiu em um pedido de exoneração por parte de Dallagnol do MPF em novembro de 2021, 11 meses antes das eleições, num momento em que corriam contra ele no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) nada menos do que 15 processos disciplinares que poderiam resultar em sua demissão: “Ele se utilizou de subterfúgios para se esquivar de PADs [processos administrativos-disciplinares] ou outros casos envolvendo suposta improbidade administrativa e lesão aos cofres públicos. Tudo isso porque a gravidade dos fatos poderia levá-lo à demissão”, afirmou o ministro em seu voto.

Segundo a Lei da Ficha Limpa, condenações em órgãos colegiados resultam em inelegibilidade e os conselhos superiores, como é o caso do CNMP, se encaixam nessa definição. Vale lembrar também que Dallagnol já havia sido condenado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em um processo que avaliou o pagamento de diárias a procuradores da Lava Jato. Ou seja, já estava bem enrolado.

Vale lembrar também que Dallagnol já havia sido condenado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em um processo que avaliou o pagamento de diárias a procuradores da Lava Jato. Ou seja, já estava bem enrolado.

A ironia da história é que a emenda à Lei da Ficha Limpa que permitiu a condenação de Dallagnol foi feita em 2010 pelo então deputado federal Flávio Dino, hoje ministro da Justiça. À época, Dino apresentou uma proposta para que membros do MP aposentados compulsoriamente, que tivessem perdido o cargo e que pediram exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processos disciplinares também fossem impedidos de se candidatar. Esse ponto específico foi o que acabou sendo usado para basear a condenação de Dallagnol.

A acusação contra Dallagnol partiu do Partido da Mobilização Nacional (PMN) e da Federação Brasil da Esperança, que inclui o PT. Inicialmente, o pedido de cassação foi feito no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, que no entanto indeferiu o pedido. O PMN e a Federação Brasil da Esperança recorreram então ao TSE, que promulgou ontem a decisão. Cabe recurso ao STF, mas a cassação tem efeito imediato.

A condenação de Dallagnol é mais do que correta porque os processos que ele enfrentava no CNMP são exatamente a expressão das barbaridades impetradas pelos procuradores da Lava Jato em conluio com o juiz do caso, o hoje senador Sergio Moro. Como todos lembram, Moro e Dallagnol foram flagrados em conversas privadas que demonstravam a combinação de ações para prejudicar o PT e condenar Lula mesmo sem provas. Debateram diligências, operações policiais, notas para a imprensa, impediram Lula de dar entrevistas, burlaram a lei para grampear o telefone de uma presidente da república. Nada de sagrado ficou de pé diante da violência jurídica da Lava Jato.

A Lava Jato, muito mais do que uma grandiosa operação jurídico-policial, foi o prelúdio da vitória do fascismo no país. Ela acendeu a chama da vingança e do ódio de classe contra as empresas públicas, o PT e a esquerda em geral. É de Dallagnol a famosa tese, apresentada diante do power point que acusava Lula, de que se pode condenar alguém em base à convicção formada por um conjunto indiciário geral, ao invés de provas concretas, como deve ocorrer no direito romano adotado no Brasil. Mesmo que a famosa frase, “Não temos provas, mas temos convicção” jamais tenha sido dita, esta foi, de fato, a teoria sobre a qual sempre se basearam as condenações da Lava Jato e que ajudou a formar, consolidar, visibilizar e expandir o movimento fascista no Brasil.

A Lava Jato, muito mais do que uma grandiosa operação jurídico-policial, foi o prelúdio da vitória do fascismo no país.

O país passou por quatro anos de horror sob Bolsonaro, entre outras coisas, por causa de gente como Dallagnol e seus procedimentos ilegais. A campanha em torno à Operação Lava Jato, orquestrada desde o Departamento de Justiça norte-americano, com cursinhos e viagens a Washington pagos a juízes e procuradores, introduziu e desenvolveu na opinião pública brasileira a ideia de que a corrupção é o mal absoluto do país e que este mal está ligado à esquerda em geral e a Lula e ao PT em particular. Nada de desigualdade social, nada de atraso histórico, opressão, racismo, dependência e subdesenvolvimento. Tudo foi resumido à corrupção. Deu no que deu: uma enorme destruição das conquistas civilizatórias dos anos anteriores e ainda 700 mil mortes de brinde. O sangue escorrido pelo ralo nos anos Bolsonaro mancha também as abotoaduras de Deltan Dallagnol, um dos artífices de fato do fascimo brasileiro.

Ou seja, o dia ontem foi de festa para quem nunca caiu no canto da sereia do “Viva a Lava Jato!” e sempre denunciou a espetacularização da política e as injustiças promovidas pela operação. Ainda não vencemos o fascismo, mas um pouco de justiça foi feito.

O prêmio de melhor twitte sobre o assunto fica com a presidente do PT Gleisi Hoffmann: “Agora Deltan Dallagnol tem um power point pra chamar de seu! Cassado! Responde a processos administrativos pendentes como procurador, ou seja, é ficha suja. Também foi condenado pelo TCU por gastos com diárias e passagens na operação Lava Jato. Eita que dia hein?!”, ironizou a deputada federal em sua conta no microblog.

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