No Brasil, o início de 2023 condensou acontecimentos que trazem à tona os desafios do novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva. De um lado, a mudança governamental concretiza a decisão da sociedade, após quatro anos de seguidos ataques ao regime democrático e às suas instituições. Por outro, os atos golpistas de 8 de janeiro mostram que a ameaça fascista está longe de ser extinta. Olhar a comunicação é fundamental para se entender como chegamos até aqui e, ainda, pensar os desafios do novo governo na reconstrução da democracia brasileira.
O terceiro mandato de Lula começou informalmente antes da posse de 1 de janeiro. Ainda em novembro, foi instaurado um governo de transição que reuniu centenas de pessoas, entre militantes partidários, especialistas e integrantes de movimentos sociais, que avaliaram as políticas desenvolvidas por Jair Bolsonaro e formularam propostas para o novo governo. A transição inaugurou a disputa de narrativas com o campo progressista em uma condição distinta, agora não mais como oposição. Anúncios de desmonte de políticas de proteção social e ambiental e promessas de publicização de atos que Bolsonaro havia posto em sigilo marcaram esse período, que culminou com uma festiva posse, acompanhada por cerca de 300 mil pessoas na capital federal, Brasília. Mesmo a mídia corporativa, bastante atacada pelo ex-presidente, rendeu-se diante da esperança de retomada da normalidade democrática, restringindo as críticas à agenda econômica de Lula.
As fraturas sociais que acompanham nossa história e que foram acentuadas nos últimos anos, contudo, ficaram evidentes nos eventos em torno do dia 8 de janeiro, quando milhares de bolsonaristas adentraram e depredaram as sedes dos Três Poderes da República, contanto, para tanto, com apoio de instituições, particularmente das Forças Armadas, que muitos deles ansiavam que pudessem encampar uma tomada do poder. No dia seguinte, enquanto centenas de pessoas eram presas em Brasília, apoiadores de Bolsonaro danificaram torres de energia elétrica em, pelo menos, três estados (São Paulo, Paraná e Rondônia). No fim do mês, um homem morreu após atear fogo ao próprio corpo, em protesto contra o Supremo Tribunal Federal (STF).
Ainda que um possível golpe tenha sido frustrado, a destruição dos prédios e a autoimolação diante do STF são reveladoras do desgaste dessas instituições, que foram alvos do ex-presidente ao longo de seu mandato. Segundo a agência de checagem Aos Fatos1, em 1.459 dias como presidente, Bolsonaro deu 6.685 declarações falsas ou distorcidas. As três desinformações mais repetidas foram: “Qual a corrupção no meu governo? Não tem, tem acusações vagas, levianas.”; “Eu fui desautorizado pelo Supremo Tribunal Federal [durante a pandemia de Covid-19]” e “Eu sempre falei que você deve combater sim o vírus, mas também combater o desemprego em nosso país.”. As duas últimas explicariam a desastrosa condução da pandemia e levam à responsabilização do STF por isso, inclusive pelo impacto econômico. As imagens da Suprema Corte não nos deixam esquecer que os discursos também constroem realidade.
Logo após as manifestações golpistas, de acordo com a pesquisa Atlas, realizada com 2.200 respondentes a partir do ambiente digital, 75,8% dos respondentes disseram discordar da ação dos manifestantes e 53% consideraram a ação completamente injustificada. Também o Datafolha identificou que o percentual daqueles que condenaram o ataque era de 93%. Apesar da rejeição às manifestações, cujas imagens circularam amplamente em todas as mídias, o percentual de brasileiros a favor de uma intervenção militar para invalidar os resultados eleitorais, segundo a mesma pesquisa Atlas, era de 36%, ao passo que os contrários somavam 54%. A partir dos atos, o Datafolha questionou a população sobre mudança de opinião em relação a Jair Bolsonaro: 80% responderam que não mudaram. Apenas 11% afirmaram ter mudado para pior.
Analisando esses dados, o cientista político Leonardo Avritzer2 aponta que a rejeição aos atos não se expressa em rechaço a um possível golpe militar ou mesmo a Jair Bolsonaro. Para ele, “o futuro da democracia no Brasil depende da capacidade da opinião pública de transitar da condenação de atos democráticos pontuais para o afastamento daqueles que são os responsáveis pelo caldo de cultura que provocou esses ataques”. Tudo indica que a extrema direita ganhou enraizamento social, com forte caráter popular, e que continuará pressionando e tentando desestabilizar o novo governo.
O primeiro mês do governo Lula
O governo Lula busca produzir tal deslocamento, combinando discursos críticos e a apresentação de uma agenda positiva, ainda que essencialmente simbólica até agora, no que tange às condições materiais de vida da maioria da população. Após os ataques aos Três Poderes, passou a controlar momentaneamente a segurança do Governo do Distrito Federal e aumentou o tom de exigência de punição dos participantes. Simultaneamente deflagrou agendas importantes para o país e que demarcam diferença em relação ao antecessor, como a atenção aos povos indígenas, com visita aos povos ianomâmis, e de integração latino-americana, retomando a participação brasileira na União das Nações Sul-Americanas (UNASUR), da qual Bolsonaro havia retirado o Brasil.
No campo da comunicação, contudo, as respostas ainda são tímidas e contraditórias. A fim de ampliar sua base de apoio no Congresso Nacional, o governo Lula entregou o Ministério das Comunicações para o União Brasil, partido de direita que apoiou Bolsonaro. O ministério é responsável pela definição da política de comunicação que organiza o setor, portanto não deve haver, como não houve nos governos petistas anteriores, mudanças estruturais no setor. O Partido dos Trabalhadores (PT) ficou à frente da Secretaria de Comunicação (Secom) do governo, que possui status ministerial e tem a responsabilidade de desenvolver a comunicação governamental. A partir da transição e tendo em vista o contexto político, novas instâncias e ações foram propostas para a secretaria, com vistas à disputa de narrativas nas redes sociais. Caberá à Secom também propor políticas para o ambiente digital, como enfrentamento à desinformação. Tais iniciativas ainda estão sendo organizadas, ao passo em que mecanismos de comunicação desenvolvidos pelo PT durante a campanha, como grupos de apoio e de checagem de informações, perderam fôlego.
Também buscando atuar no combate à desinformação, a Advocacia-Geral da União criou, no segundo dia de governo, a Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia. O órgão objetiva defender a democracia e combater a desinformação usada como arma política contra os atos públicos. Após o 8 de janeiro, o governo anunciou que adotaria medidas de combate à desinformação e de responsabilização dos envolvidos. Tal resposta seria apresentada ao Congresso pelo Ministério da Justiça, com um tom punitivista. Como o Brasil não dispõe de uma lei que defina desinformação, garanta transparência e devido processo em relação à moderação de conteúdos nem mesmo um órgão regulador do setor, a proposta suscitou preocupações e levou o governo a recuar.
Além do problema em relação à política para o setor e da falta de nitidez sobre caminhos para combater o problema, a avaliação do papel das redes também merece ser ponderada. De um lado, a preocupação apareceu em todos os discursos na posse, seja de Lula ou dos presidentes da Câmara e do Senado. Por outro lado, Lula chegou a falar em entrevista à Globo News, a primeira após os ataques, que as pessoas foram surpreendidas pelos atos. Ao contrário, além da manutenção de grupos em frente a quartéis, especialmente na capital federal, havia farta informação nas redes de que a organização de atos antidemocráticos estava em curso, o que evidencia que ou faltou essa informação chegar ao presidente ou a convocatória não foi levada a sério.
A construção do “mito” e o uso da desinformação como estratégia política
As raízes do pensamento conservador devem ser buscadas na larga tradição autoritária do Brasil, o último país do continente americano a abolir a escravidão. Um país que concedeu anistia aos militares que impuseram uma ditadura entre 1964 e 1985 e que nunca encarou esse legado, inclusive em relação às Forças Armadas, de onde emergiu Jair Bolsonaro. Depois de mais de duas décadas como parlamentar, Bolsonaro foi eleito em 2018 reunindo especialmente os evangélicos fundamentalistas, a burguesia ultraliberal e os militares. Vale notar que os últimos anos registraram crescimento do número de brasileiros evangélicos, que hoje somam mais de 30% da população (65 milhões de pessoas). Sua influência se dá por vários caminhos, inclusive a partir da mídia, com forte presença tanto na radiodifusão quanto na internet. Ao longo de todo o governo, esses setores operaram para ganhar mais espaço na sociedade, contando, para tanto, com enorme instrumentalização da máquina do Estado e de suas políticas para benefício, inclusive eleitoral, dos bolsonaristas.
O bolsonarismo conta com apoio de parcela da direita tradicional, mas se distingue dela. Não são as famílias tradicionais que o animam. Trata-se de uma extrema direita que ganhou adesão popular, em um contexto de crise social e econômica, para a qual a esquerda não conseguiu dar respostas. Parte da revolta popular que, em 2013, tomou as ruas do Brasil, em processos semelhantes ao que vimos com a Primavera Árabe e com a ocupação de praças na Espanha e nos Estados Unidos, foi capturada por essa extrema direita, que se apresentou “contra tudo que aí está”. A isso deve ser somada a manipulação midiática do sentimento anti corrupção a partir da Operação Lava Jato, deflagrada em março de 2014, inicialmente com a investigação de esquema de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. A associação entre a Lava Jato e os grupos midiáticos hegemônicos, que veio à tona, anos depois, com o vazamento de conversas entre os principais representantes desses agentes, produziu um agendamento negativo contra a esquerda e, particularmente, contra o PT, então no governo federal.
Esse esforço de agendamento contra a política e a esquerda, especialmente, encontra na sociedade brasileira terreno fértil. Foi assim antes do Golpe Militar de 1964, quando a chamada Rede da Democracia, formada pelas empresas jornalísticas O Globo, Jornal do Brasil e Diários Associados, em 1963, assumia a representação e a expressão da opinião pública e desqualificava instituições clássicas como partidos, sindicatos e mesmo o Congresso Nacional, ao passo que construía uma imagem positiva da própria imprensa, então apresentada como representante dos “tradicionais valores da sociedade brasileira ancorados na defesa da liberdade e da propriedade privada”, conforme o historiador e cientista político Aluysio Castelo de Carvalho. A Rede era liderada por João Calmon, então deputado federal, presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), até hoje a principal associação dos radiodifusores.
Com a ditadura, foi conformado um sistema de comunicação extremamente concentrado, essencialmente privado, atrelado aos interesses da burguesia e, por isso, fechado ao debate público e à participação democrática. Mesmo com a retomada da democracia na década de 1980, a mídia seguiu operando a construção de um discurso adversário em relação à democracia, expresso na crítica permanente à política e aos políticos. O mesmo posicionamento foi verificado nos últimos anos, com raras exceções – como durante o governo de Fernando Henrique, quando a imprensa adotou uma postura complacente com o poder central e seu projeto neoliberal. Diferente tratamento foi conferido aos governos Lula e Dilma Rousseff. O impeachment de Dilma foi legitimado perante à opinião pública pela divulgação seletiva das acusações, especialmente das denúncias de corrupção; pela exaltação e convocação para protestos favoráveis à destituição da presidenta; e pela fixação de argumentos por meio da repetição e da eliminação do contraditório. Com o impeachment, abriu-se espaço para a efetivação de uma agenda ultraliberal que não seria consagrada pelas urnas. O que não se imaginava era que, dos escombros resultantes das políticas de austeridade e da fragmentação social, emergiria um grupo que não protagonizava os acordos tradicionais e que passaria a atacar a própria imprensa tradicional, buscando superá-la como instância de mediação social.
Tais mudanças sociopolíticas ocorrem em um momento de transformação nas próprias comunicações, com crescente centralidade da Internet como nova estrutura de mediação social. Na segunda década dos anos 2000, houve a proliferação de dispositivos móveis e de redes sociais, acompanhamento também a ampliação dos índices de conexão da sociedade brasileira. Embora os critérios do que seja acesso devam ser considerados, a internet foi acessada por 81% da população brasileira em 2021, segundo a pesquisa TIC Domicílios. Isso se deu sobretudo de forma precária, com acesso à Internet majoritariamente a partir de dispositivos móveis e com navegação limitada por pacotes de dados de baixo volume, além da prática de zero rating (acordos que fazem com que os usuários usem, sobretudo, redes sociais, pois não há desconto na franquia de dados). Os novos ambientes digitais potencializaram a substituição de partidos políticos e outras organizações típicas da democracia liberal, viabilizando, ademais, maior inserção política da população historicamente alijada do debate público. A partir de 2013, grupos passaram a utilizar esses mecanismos para convocar e divulgar protestos, bem como disputar os rumos da insatisfação social.
Desinformação como estratégia política
Ainda que a mentira, a descontextualização e a omissão de fatos sejam problemas associados à histórica luta em torno da informação, a desinformação passou a ser utilizada, de forma deliberada, estratégia política central para a obtenção de ganhos políticos e econômicos. A extrema direita de Jair Bolsonaro, seguindo e se apropriando de experiências desenvolvidas em outros países, sobretudo os Estados Unidos, constituiu um sistema de comunicação complexo voltado à disseminação de desinformação. São sites, canais de YouTube com centenas de milhares de seguidores, páginas em redes sociais e grupos organizados em sistemas de mensageria (primeiro WhatsApp, depois também Telegram) voltados ao ataque às instituições e à esquerda, por um lado, e à construção de uma cultura política em torno de valores conservadores, por outro.
O próprio Bolsonaro e seus filhos são fundamentais na organização das narrativas, pois adotam uma estratégia de comunicação digital direta, operando uma lógica de ruptura com as instituições mediadoras constituídas pelo próprio Estado Democrático de Direito, minando outros agentes políticos como a mídia e o STF, a fim de se legitimar e fazer com que a sua visão de mundo seja a visão de um mundo abraçada pelos receptores dessa desinformação. Esse movimento era pouco claro para os setores progressistas em 2018, que foram, então, surpreendidos com a eleição de Bolsonaro. Vale notar que, então, considerava-se a presença na radiodifusão central para os candidatos. No Brasil, o tempo é distribuído de forma desigual para os candidatos no primeiro turno. Bolsonaro, que também não tinha apoio dos partidos tradicionais, dispunha de apenas 8 segundos. Fernando Haddad, candidato do PT, teve 2 minutos e 23 segundos. Naquele momento, ganharam destaque narrativas sobre corrupção e sobre um “kit gay” que teria sido distribuído por Haddad, quando ministro da Educação.
No governo, Bolsonaro montou o que ficou conhecido como “gabinete do ódio”, promovendo desinformação desde o centro do governo federal, ao passo que atacava a mídia e o frágil sistema de comunicação público, passando a instrumentalizá-lo a seu favor. O então presidente manteve o contato direto com a população, especialmente por meio do Twitter e de lives no YouTube. Seu grupo manteve forte presença no Tik Tok, ainda pouco ocupado pelo setor progressista, e mesmo em plataformas menos conhecidas, como Twitch. Contou, ainda, com apoio de parte da mídia, como das emissoras de TV Record e SBT, e da rede de rádios Jovem Pan.
Em torno da família Bolsonaro, foi formado-se um grupo que parece viver uma dissonância cognitiva, reforçada pelos mecanismos das redes sociais que os mantêm aprisionados em bolhas algorítmicas, sem exposição ao contraditório, e em um tipo de discussão onde há tudo, menos diálogo. Uma construção que facilita a distinção, típico do fascismo e largamente utilizada por Bolsonaro, entre “Nós” x “Eles”. O “Nós”, no caso, seriam os patriotas, defensores da família e da liberdade. O “Eles”, os esquerdistas corruptos e adeptos da libertinagem. Essa distinção causou a compactação de um grupo de apoiadores que permaneceu fiel, apesar, inclusive, da política negacionista que ocasionou milhares de mortes durante a pandemia do novo coronavírus.
Nas eleições de 2022, esse recurso também foi utilizado, ainda que parte da população estivesse mais consciente da estratégia da desinformação. Os principais temas levantados pelo bolsonarismo no primeiro turno foram sobre corrupção e questionamentos sobre as urnas eletrônicas utilizadas na votação. Mas dificuldades se impuseram e podem ser apontadas como empecilhos para a criação de uma narrativa unificada em âmbito nacional, como as divisões que levaram a direita e o próprio bolsonarismo a aparecer mais dispersa nas eleições. No segundo turno, unificada em torno de Bolsonaro, a estratégia de desinformação ganhou força. Além do tema da corrupção, ganharam projeção conteúdos sobre valores e religião.
A esquerda, que já vinha progressivamente ocupando o Twitter, ganhou mais adesão nas demais redes. O Observatório das Eleições3 monitorou vários momentos nas eleições e notou crescente presença no Instagram e no Facebook – embora em relação a este deva ser notado que, ainda que figure como um dos principais espaços de obtenção de informações políticas para a população, é considerado obsoleto por parte da esquerda. Esta, ademais, perde frequentemente no YouTube, apesar de esforços de produção de jornalismo independente nessa plataforma.
No segundo turno contra Lula, houve maior afinação, mas também a esquerda, liderada especialmente pelo deputado federal André Janones nesse campo, atuou para unificar discursos e disputar a agenda pública. Janones virou o principal estrategista de Lula nesse campo. A partir dele, foram formadas correntes de divulgação de conteúdos que conseguiram estruturar a disputa nas redes. O deputado também produziu narrativas de ataque, mobilizando especialmente denúncias de corrupção com tom sensacionalista, que mantiveram Bolsonaro ocupado em apresentar respostas e com menos capacidade de atacar.
Rumos do enfrentamento à direita na comunicação
Tudo indica que o governo Lula terá um mandato de enfrentamento à direita no Congresso Nacional e na sociedade, em geral. É preciso defender a democracia e, de forma mais profunda, disputar um projeto de sociedade que seja capaz de fazer frente ao da direita, com respostas não só simbólicas, mas na vida material da população. No campo da comunicação, urge enfrentar a ampla concentração midiática no Brasil, a ausência de pluralidade e de diversidade na TV aberta, ainda importante e, hoje, amplamente ocupada por discursos fundamentalistas e conteúdos que promovem leituras contrárias aos direitos humanos e à esquerda. Nós chegamos até aqui muito por conta também do cenário de comunicação que se constituiu no Brasil e é importante lidar com esses antigos desafios.
Quanto aos novos desafios, a desinformação que acontece na internet está associada à configuração que a internet tem hoje, pautada por interesses capitalistas das plataformas digitais e por um modelo de negócios que é baseado em uso de dados, em projeção de conteúdos, quaisquer conteúdos, sem que haja nenhum compromisso ético e político, cuja visibilidade se dá a partir do pagamento. Um cenário em que interessa às plataformas manter as pessoas vinculadas diretamente a um conteúdo como parte da disputa da atenção da população, o que acaba levando à projeção de conteúdos extremados que geram muitos comentários, muitos compartilhamentos, mesmo que sejam mentirosos.
Indo muito além do que o que foi feito nas comunicações nos primeiros governos petistas, cabe enfrentar a questão de forma estrutural. O relatório da transição apontou caminhos nesse sentido, a começar por um urgente debate democrático e multissetorial sobre regulação de plataformas, incluindo seu arranjo institucional convergente. Organizações da sociedade brasileira, como a Coalizão Direitos na Rede, que reúne dezenas de grupos, reivindicam a aprovação de projeto que estabelece mecanismos de transparência e devido processo na internet, atualmente em tramitação no Congresso Nacional. Temos acompanhado iniciativas nesse sentido, a exemplo das que se desenvolvem na União Europeia, que aprovou duas leis recentemente que tratam do tema da organização dos mercados e dos serviços digitais. O Brasil não pode continuar alheio esse cenário. Tem condições e mesmo urgência de colocar-se com perspectiva própria na proposição de uma regulação democrática que seja capaz de enfrentar a degradação do debate público e a instrumentalização das redes pela política fascista.
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