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BRASIL

“Gestor” até a página três: Tarcísio pede e ganha aumento de 50% em São Paulo

Henrique Canary, de São Paulo (SP)
Reprodução/Redes sociais

A Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou nesta terça, 29, em regime de urgência, o PL 592 de 2022, que estabelece um aumento de 50% no salário do governador, vice-governador e secretários de Estado. O texto segue agora para a sanção do atual governador Rodrigo Garcia, que já manifestou apoio à medida.

Os salários do alto escalão estavam congelados desde 2019, quando João Dória concedeu a si mesmo o aumento como uma de suas primeiras medidas de governo. No entanto, o argumento da defasagem não vale aqui, já que o índice aplicado é nada menos do que o dobro da inflação do período (IPCA), que ficou em 25,63%. Com o aumento, os salários do primeiro escalão passam a ser: governador – de R$ 23.048,59 para R$ 34.572,89; vice-governador – de R$ 21.896,27 para R$ 32.844,41; secretários – de R$ 20.743,72 para R$31.115,58. A medida terá impacto de R$ 1,7 bilhão na folha de pagamento do Estado, já que outros salários da nata do funcionalismo público acompanham o salário do governador.

O mais interessante nessa história é que tudo partiu do próprio Tarcísio de Freitas, governador eleito de São Paulo, que nem mesmo assumiu o cargo, mas já está preocupado com quanto vai ganhar. É o mesmo Tarcísio que se apresentou durante toda a campanha eleitoral como um “gestor”, sem interesses pessoais e alheio ao jogo político. Tudo conversa fiada. Em 17 de novembro, em reunião de sua equipe de transição, Tarcísio defendeu abertamente o aumento do seu próprio salário: “A gente tem que ter muita responsabilidade, porque quando se fala em aumento de salário do governador se fala na baliza para o teto do funcionalismo. E isso impacta uma série de carreiras e impede que uma série de profissionais tenha aumento real”. Ora, cada palavra dessa declaração é uma pérola. Em primeiro lugar, Tarcísio começa falando em “responsabilidade” simplesmente porque essa é a palavra que o mercado gosta de ouvir. Quem começa uma frase com essa palavra, pode falar qualquer atrocidade que será sempre perdoado. Mas é pura hipocrisia porque sua proposta não tem nada de responsável. Em seguida, confessa que sua preocupação é com o teto do funcionalismo, não com o piso. Ou seja, está legislando em benefício daqueles que já ganham o máximo permitido por lei e só estão impedidos de ganhar mais porque o teto não sobe. Nenhuma palavra sobre quem ganha abaixo ou próximo do piso, ou seja, sobre a imensa maioria do funcionalismo público.

Outro fato interessante é a incrível solidariedade da Assembleia Legislativa de São Paulo quando o assunto é o salário do governador, vice e secretários. O PL obteve 56 votos a favor e apenas 6 contra. Entre os que votaram contra, estão os deputados do PSOL Carlos Gianazzi e Mônica Seixas, que justificaram seu voto exatamente com o argumento de que o aumento não incide sobre a base do funcionalismo, mas apenas sobre sua elite.

Ou seja, Tarcísio nem ainda começou sua gestão, mas já conseguiu promover um aumento do abismo salarial no interior do funcionalismo público estadual. Enquanto isso, segue a incerteza entre professores da rede pública, trabalhadores da saúde, institutos como o Butantã, universidades estaduais e todos aqueles que trabalham de verdade e garantem o funcionamento do Estado.