Editorial de 29 de março de 2022
As federações partidárias entram em cena pela primeira vez nesta eleição. Para os partidos menores, pode ser a salvação do pesadelo da cláusula de barreira que entrou em vigor com a Emenda Constitucional 97/2017, mais uma medida aprovada junto ao golpe e um severo pacote de retrocessos.
A cláusula divide os partidos entre quem preserva fundo partidário e tempo na TV e na rádio e quem perde esses direitos, em um tipo de semi legalidade partidária. Em perspectiva, nas eleições de 2018 [1], dos 35 partidos registrados no TSE, 14 não ultrapassaram a barreira: PCdoB, PSTU, PCB, PPL, PCO, Rede, Patriota, PHS, DC, PMB, PMN, PRP, PRTB e PTC.
Assim, a cláusula facilita a vida política burguesa em dois sentidos: de um lado, coloca partidos de esquerda, que possuem uma base de trabalhadores e da juventude, em uma semi ilegalidade; de outro, facilita a governabilidade, sustentada na anomalia de existirem dezenas de partidos do baixo clero da direita e do centrão.
O PSOL lutou bravamente contra a barreira e deve seguir denunciando seus efeitos, para que seja revista nas próximas eleições. Mas, embora as federações possam cumprir um papel progressivo frente a uma legislação rígida, o partido não deve fazer uma a qualquer custo. O partido irá decidir sobre fazer ou não uma federação com a Rede Sustentabilidade. Trata-se de um erro importante aprovar isto.
A Rede foi fundada em 2013, apresentando-se como um partido que não é nem de esquerda, nem de direita, mas sim um partido moderno, que não seria nem oposição, nem situação [2]. Considerando que a sua legalização só se deu apenas dois anos depois, Marina Silva filiou-se ao PSB em 2014, sendo uma candidata à presidente bem votada no primeiro turno e que, no segundo turno, chamou o voto em Aécio Neves contra Dilma Rousseff [3]. Em 2016, a Rede apoiou o golpe parlamentar [4]. Em 2022 estão divididos: há uma maioria em favor de Lula e uma minoria expressiva em favor de Ciro Gomes. Nos estados, também irão se dividir entre os candidatos da federação e outras campanhas, como a do Kalil do PSD em Minas Gerais, a do Helder Barbalho do MDB no Pará e a do João Azevedo do PSB na Paraíba. Este grau de diferença política anuncia para a federação um futuro de fragmentação, disputa e insere novas deformações ao PSOL.Um erro porque o PSOL reúne condições para ultrapassar, mais uma vez, a barreira em 2022. Em 2018, o partido fez 1,98% dos votos válidos em nove estados e agora é necessário atingir 2%. Portanto, não estamos diante de uma luta de vida ou morte pela legalidade plena agora, como é o caso da Rede que conta com uma deputada federal e um senador. O que pesa, então, para tomar a decisão, são critérios políticos e de programa.
Para piorar, a Rede orienta seu programa pela defesa do “progressismo sustentabilista”, um conceito incompatível com as noções básicas utilizadas no PSOL de socialismo, ecossocialismo e classismo. Isso porque a Rede não é um partido do campo dos e das trabalhadoras. É uma organização-legenda de natureza pequeno burguesa, com vínculos a setores burgueses. Por isso, não identificamos na Rede um partido aliado para lutar ombro a ombro ou mesmo votar no Congresso Nacional sobre todos os temas que digam respeito à defesa dos direitos da classe trabalhadora, incluídos aqui os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.
Portanto, é enorme o custo político e programático de se associar à Rede em uma federação que carrega algum grau de perda de autonomia para os integrantes e dura ao menos quatro anos. O PSOL ganhará pouco em termos eleitorais, mas servirá de bóia de salvação para um partido alheio ao seu campo de classe. Em termos práticos, o PSOL ajuda a “salvar” um projeto de partido pequeno-burguês que faliu e assume responsabilidade sobre seu espólio, sendo ainda um partido com deformações importantes na relação com governos, em seu programa e nas eleições. Trata-se de um grave erro.
[1] Em 2018, os partidos precisavam fazer 1,5% dos votos válidos (equivalente a 1.475.085 votos) para deputado federal distribuídos em 9 estados, de modo que em cada um dos estados deveria ter pelo menos 1%; Alternativamente, poderiam eleger 9 deputados federais em pelo menos 9 estados.
Em 2022, a regra é de 2% dos votos válidos em 9 estados (sendo que em cada um o mínimo é de 1%) ou eleger 11 deputados federais em pelo menos 9 estados.
Assim, a cláusula aumenta progressivamente até 2030, cuja previsão é de exigência para que os partidos alcancem 3% dos votos válidos em 9 estados (sendo que em cada um, o mínimo é de 2%) ou eleger 15 deputados federais em pelo menos 9 estados.
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