Sobre a Fidelidade Partidária e uma Reforma Política de fato

Christie Temporim de Almeida
Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Cleia Viana/Câmara dos Deputados Fonte: Agência Câmara de Notícias

No momento que esse texto é escrito, está sendo debatido e votado no Congresso Nacional um novo Código Eleitoral que prevê que parlamentares não possam utilizar compromissos firmados entre partidos e movimentos de renovação política para justificar votos diversos da orientação partidária para a bancada.

Independentemente do resultado dessa votação, ela coloca em pauta dois problemas de nossa democracia representativa, o primeiro é a personalização dos mandatos, o outro é o esvaziamento ideológico da maioria dos partidos do Brasil, com raríssimas exceções, talvez dois ou três em trinta e três possam ser apontados como partidos com plataformas e que as levam a sério.

Vejo os dois problemas como dois lados de uma mesma moeda e acredito que esteja aí, ou em parte nisso, o problema de nossa democracia representativa.

Atualmente, como os leitores politizados do presente artigo já sabem, ao votar no nome de X o que na verdade se está fazendo é votar no partido-coligação Y e desejando que X tenha uma boa votação dentro do grupo para assumir uma das cadeiras às quais o grupo terá direito ao fim da eleição, se este ultrapassar a cláusula de barreira e obtiver coeficiente eleitoral. Ao votar em X, entretanto, você pode estar automaticamente colocando W e Z nas cadeiras, que não concordam com X em nada, apesar de estarem na mesma lista de candidatos, por causa de o grupo não apresentar nenhum critério ou proposta sólida para admissão de candidatos ou a posterior ação dos eleitos. Isso não é um problema novo o Brasil, na primeira metade do século já havia partidos que tinham entre seus militantes membros do movimento negro e também fascistas racistas, isso por o partido ser anti-“tudo que está aí” e nacionalista.

A solução para esse problema já foi proposta, mas ideia foi meio que esquecida durante pororoca de chorume que invade nosso país após as eleições de 2014, dentro da contraproposta de reforma política apresentada por OAB, CNBB, UNE, CONTAG, UBES, PSOL, PT e PCdoB em maio de 2015, essa solução consiste em votar em separado as propostas dos grupos em disputa para o legislativo e os nomes a defendê-las na próxima legislatura, conforme as cadeiras conquistadas pela plataforma apresentada.

As propostas, a plataforma do grupo, devem ser discutidas e construídas entre os membros e apoiadores da lista a ser apresentada, uma construção coletiva, que politizaria mais o processo e aqueceria o debate antes mesmo da largada da campanha de fato. Um efeito positivo seria vacinar os eleitores contra notícias falsas a respeito de propostas dos grupos concorrentes, afinal, se não está nas propostas registradas não é uma proposta do grupo.

O que o Brasil ganha com isso? O inteligente se pergunta. Eu acredito que muito. Primeiramente os partidos terão algo palpável e de decisão recente, pré-campanha, para se apoiar ao processar eleitoralmente parlamentares infiéis, coisas que não temos agora.

O eleitor, parte mais interessada no assunto, também ganha, ele tem uma lista de coisas a cobrar de seus parlamentares, e até mesmo, em um Brasil com debate político mais qualificado, poderá pedir o recall das cadeiras dos parlamentares ou todo o grupo, se eles não seguirem o que eles mesmos propuseram. Seria o fim do cenário brasileiro em que um partido tem, ao mesmo tempo, em suas fileiras, socialistas, ruralistas e neofascistas.

Ganha o próprio Brasil no momento da campanha eleitoral ao desviar o foco das campanhas individuais e concorrentes dentro do mesmo grupo para o debate entre diferentes plataformas políticas para os Legislativos.

As possíveis implicações disso para o cenário político-partidário brasileiro podem ser discutidas aqui em uma outra oportunidade, mas creio que seriam positivas.

 

 

*Christie Temporim de Almeida é Cientista Social pela UFMG, servidor público.