O tema do Dia Mundial do Meio Ambiente deste ano é a “Recuperação dos Ecossistemas”. A temática está dentro da campanha da ONU para a década, que tem como foco central a questão dos ecossistemas e sua degradação. De acordo com a ONU, “a humanidade usa 1,6 vezes a quantidade de serviços que a natureza pode fornecer de forma sustentável”. Isso significa que estamos continuamente explorando a natureza em taxas superiores a suas possibilidades de recuperação. Em termos da literatura marxista, opera uma ruptura metabólica: a imposição das necessidades e imperativos da sociedade capitalista sobre a natureza faz com que haja um distúrbio generalizado nos ciclos naturais, impedindo que os ecossistemas se regenerem.
A destruição dos biomas brasileiros
O Brasil tem um papel de destaque quando o assunto é diversidade ecológica. Na sua extensão continental o país abriga 6 biomas diferentes, a maior floresta tropical do mundo e uma das mais ricas biodiversidades do planeta. Infelizmente, o Brasil também se destaca pelo constante processo de degradação de todos os seus biomas e ecossistemas relacionados. Segundo dados do IBGE, o país perdeu 500 mil m2 quadrados de biomas em apenas 18 anos.
A Amazônia é um dos biomas que mais sofre com a devastação, sendo que metade de toda área perdida se dá na floresta. Apesar dos apelos de diversos setores da sociedade e da comunidade internacional, além das promessas vazias de Bolsonaro e Salles em fortalecer a preservação, as taxas de desmatamento da Amazônia apenas sobem: os dados do mês de maio apontam que houve um aumento de 41% do desmatamento em relação ao mesmo período do ano passado . O dado é alarmante, já que o mês de maio marca o início do período da seca, o que significa que um aumento do desmatamento nessa época tende a piorar o cenário de devastação e incêndios na Amazônia durante o ano. O ano de 2020 registrou o maior número de incêndios na Amazônia desde 2017, a conclusão lógica é de que com um contexto ainda mais degradado, as possibilidades de um quadro mais dramático aumentam exponencialmente – e é precisamente isso que os cientistas apontam.
Os outros biomas brasileiros também apresentam um avanço na devastação. A Mata Atlântica, bioma que apresenta a maior degradação em termos históricos, teve aumento na sua destruição durante o biênio 2019-2020 em 10 dos 17 estados que possuem registros do bioma – o que equivale a 36 campos de futebol a cada 24h . No Cerrado o desmatamento teve um aumento de 12,3% no ano passado, no contexto de um bioma amplamente degradado e no qual 43,8% da sua extensão é utilizada para agropecuária. Como uma demonstração de que a destruição vai de norte a sul, o bioma do Pampa – encontrado apenas no Rio Grande do Sul – registou no ano de 2020 a maior área queimada já registrada pelo INPE, sendo equivalente a 12 vezes o tamanho de Porto Alegre.
A melhor preservação é Fora Salles!
Mais importante do que saber os dados da destruição dos biomas brasileiros, é entender porquê ela acontece. Os principais inimigos dos ecossistemas brasileiros são as madeireiras, a mineração e o agronegócio. Todos esses setores estão ligados ao desmatamento, à destruição dos modos de vida tradicionais e a operações ilegais em áreas preservadas. Coincidentemente, os três setores possuem relações muito estreitas com Ricardo Salles.
A operação contra um esquema de venda ilegal de madeira deflagrada pela PF que chegou até o ministro do Meio Ambiente desvelou de maneira mais concreta os laços escusos entre Salles e aqueles que lucram com a devastação da natureza brasileira. Tornou mais concreta, mas não deixou ninguém surpreso. Um mês antes da ação da PF – que investiga os crimes de corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e facilitação de contrabando – o então superintendente da Polícia Federal no Amazonas, delegado Alexandre Saraiva, apresentou notícia-crime contra Salles, após uma visita do ministro à Região Amazônica, em 06 de abril, para verificar uma das maiores apreensões de madeira ilegal na história do país: mais de 130 mil m² de madeira em tora, um estimado de R$ 55 milhões em madeiras apreendidas. Na ocasião, o ministro exibiu a documentação de duas toras de madeira – entre 40 mil apreendidas – e em seguida reuniu-se com um grupo de madeireiros e políticos locais. Ao final, anunciou que o resultado da análise dos documentos seria anunciado “em uma semana”. O delegado Saraiva criticou publicamente a ação do ministro, vista como interferência: “É o mesmo que um ministro do Trabalho se manifestar contrariamente a uma operação contra o trabalho escravo”, afirmou ao jornal Folha de S. Paulo. E completou: “Não vai ter boiada na PF”.
Também no mês passado, Salles passou 4 dias na Amazônia em conversas sobre mineração. O que poderia se esperar de um ministro do Meio Ambiente é que estivesse lá para debater propostas de contenção ao garimpo ilegal, ou demonstrar solidariedade e se colocar ao serviço de comunidades indígenas como a dos Munduruku, que vivem um aumento de 363% de degradação da sua área por conta da mineração. A pauta, entretanto, era a legalização de garimpos em áreas protegidas. A relação de Salles com as mineradoras está no seu DNA político, já que no ano de 2016 ele alterou mapas elaborados pela USP com a intenção de beneficiar projeto de mineradoras integrantes da FIESP, além de ter alterado minuta do decreto do plano de manejo e promovido perseguição a funcionários da Fundação Florestal que tentaram se opor aos projetos.
Ainda em maio, durante um evento bolsonarista, Salles afirmou que “o agronegócio é o melhor amigo do meio ambiente”. Opinião completamente contrária, e muito mais fundamentada, é a dos especialistas que apontam o agronegócio como uma das principais fontes que alimentam a grilagem e o desmatamento. Muito bem enraizado na política brasileira, o agronegócio articula a Frente Parlamentar da Agropecuária, que possui 245 deputados alinhados ao seu programa e interesses. Para termos noção em termos de proporção, a Câmara dos Deputados é composta por 513 assentos. Isto é, apenas a bancada ruralista forma praticamente metade da Câmara. O que fica claro é que o agronegócio não é melhor amigo do meio ambiente, mas um dos melhores amigos de Salles.
Os setores se alegram com Salles e constantemente demonstram isso publicamente, lançando cartas elogiando o seu trabalho na “desburocratização” das leis ambientais e sua leal defesa das madeireiras na Amazônia. É trágico que alguém do mais alto escalão do governo federal, responsável por tudo que diz respeito à natureza brasileira, seja um sujeito intimamente ligado aos interesses dos setores que tem como objetivo máximo lucrar com a devastação do meio ambiente. Salles está lá porque é um agente destes setores, um representante, um sócio. Quanto mais as florestas são derrubadas, as espécies nativas são substituídas por soja e os garimpos rompem a terra destruindo tudo ao seu redor, Salles recebe mais tapinhas nas costas. Não podemos seguir com um capacho da devastação ecológica como ministro.
Nesse Dia Mundial do Meio Ambiente há muito pouco o que comemorar, mas muita luta a fazer. É preciso lutar pelo hoje, mas pelo amanhã. Pela natureza e por nós, que também somos parte dela. Fora Salles!
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