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MUNDO

O Estado paraguaio frente a pandemia: é necessário taxar os ricos

Tomás Zayas Roa, Dirigente do MPS - Movimento pelo Socialismo. Comunidade El Triunfo, Minga Guasú, Paraguai.

Tradução Ge Souza

A crise iniciada pela pandemia de Covid 19 gera reações em todos os setores sociais, sobre o que fazer frente a emergência sanitária, econômica e social que se abriu, de onde tirar recursos extras para poder atender a esta dramática situação.

Por outro lado, revela a fragilidade em que se encontra a saúde pública, por ter sido desmantelada, junto com outras áreas vitais do Estado. As políticas de ajuste provocaram falta de equipamentos nos hospitais e de recursos para compra-los. A população pobre ficou impossibilitada de suportar a falta de recursos, e sem a ajuda do Estado, que se recusa a cobrar impostos dos que ganham enormes fortunas.

Os direitos se defendem lutando

Há que ressaltar que o atendimento prestado pelo Estado, só é possível graças a luta e mobilizações do povo. No ano de 2002, com o conto da Reforma do Estado, o Governo de González Maqui, em cumplicidade com o parlamento, esteve a ponto de privatizar tudo. 30 mil camponeses e camponesas, mobilizados, com muito sacrifício, e com o preço da vida do companheiro Calixto Cabral, assassinado em 17 de junho de 2002, pela repressão policial, obrigaram o governo e retirar seu Projeto, que já contava com o apoio do Parlamento.

Foi assim que se defenderam os recursos estatais e os direitos do povo pobre. Os sucessivos governos têm cortado verbas dos Ministérios da saúde, educação e agricultura. O golpista Federico Franco foi o que mais cortou verbas da saúde, deixando o setor em terapia intensiva.

Medidas de emergência necessárias

Com a emergência da pandemia, o Governo não encontrou nada melhor do que recorrer a empréstimos para equipar os hospitais e atender a quem precisa de alimentos.

Para isso, é necessário que o Estado tenha recursos próprios, em primeiro lugar cobrando os impostos. Neste momento, se justifica a taxação das grandes fortunas do país, como se está discutindo em outros países.

Por obra e graça das classes dominantes, o Paraguai segue sendo um paraíso fiscal, no qual os capitalistas fazem o que querem. O governo de Horacio Cartes promove esta situação com expressões grosseiras como “Paraguai deve ser como essas mulheres lindas e baratas” ou “usem e abusem do Paraguai”. Na prática, estas expressões vulgares se tornaram realidade para alguns grupos econômicos, como por exemplo, o agronegócio.

Dando nome aos bois

No último dia 23 de abril, o jornal ABC Color publicou um comunicado da União de Empresas da Produção (UGP) que diz que a última safra de soja foi de 10.500.000 de toneladas, gerando 1,6 bilhões de dólares (citação de referência). O comunicado também observava que 41.600 fazendas têm menos de 20 hectares, e que houve um crescimento de 26.000 novas pequenas fazendas. A UGP utiliza estes dados com o objetivo de sustentar que o desenvolvimento e o progresso dependem do agronegócio, e que, portanto, o setor não deve pagar impostos, pois isto prejudicaria os 41.000 pequenos produtores de soja. Até o momento, a “contribuição” dos produtores de soja, apesar dos bilhões de dólares que afirmam ganhar, não passou de distribuir leite de soja. O plano deles é como sempre, evitar o pagamento de impostos.

É necessário chamar as coisas pelo seu nome. Tranquilo Favero é um latifundiário brasileiro que detém mais de milhão de hectares em terras. Grande parte destas terras era de pequenos agricultores que foram enganados, e aceitaram cultivar soja e receber créditos dos silos de Favero. Quando não podiam pagar suas dívidas, os camponeses iam perdendo suas terras, que acabavam nas mãos dos patrões. Essa é uma das formas, depois passaram a comprar os direitos sobre a terra e logo passaram ao arrendamento das mesmas, numa clara violação das leis. Ultimamente alugam terras e contratam pessoas como “testas de ferro”. Só em San Cristóbal y Alto Paraná, se impediu 200 titulações irregulares no INDERT, usando “testas de ferro”, na época em que Justo Cárdenas era presidente da instituição.

O desaparecimento de populações inteiras não se deu pelo cultivo de amendoim, feijão ou mandioca, mas sim porque se meteram a cultivar soja. Hoje, a situação é alarmante, pois todas as famílias que alugaram (arrendaram) suas terras para o cultivo da soja não têm comida e estão passando fome.

O pequeno grupo de privilegiados do agronegócio move 1,6 bilhões de dólares, e para o Estado oligárquico não importa que não paguem impostos e nem gerem mão de obra. Além de destruírem o meio ambiente e o ecossistema. Muitos deles nem são empresários ou investidores. São simplesmente especuladores que diariamente violam as seguintes leis do Paraguai:

1. Lei 1863/02 – Estatuto Agrário que estabelece que a terra pública só possa ser adquirida para a agricultura familiar, a produção de alimentos de consumo e renda de excedentes, mantendo uma produção ecologicamente sustentável, e que esta terra não se pode alugar ou arrendar.

2. Lei 2532 que estabelece a zona de segurança da fronteira.

3. Lei 4686/12 que sanciona a prática de atos puníveis contra bens patrimoniais (compra e venda de direitos).

4. Lei 716 que protege o meio ambiente e a qualidade da vida humana.

5. O capítulo 5 da Constituição Nacional que reconhece os Povos Indígenas como Nação, anterior a criação do Estado do Paraguai, e que as terras indígenas não podem ser hipotecadas, arrendadas ou divididas, mas que apesar do que diz a Constituição está sendo invadida pelo agronegócio, expulsando os indígenas de seus territórios, fazendo com que se transformem em pedintes nas cidades.

Em qualquer país do mundo se aplica o princípio de que aquele que tem mais paga mais, e não pode ser admitida a exploração capitalista de toda a sociedade e de seu próprio Estado.

Se não estiverem satisfeitos que procurem outro país, já que o capital não tem pátria. Nós, o povo, não temos nada além de nossas terras para viver e satisfazer as nossas necessidades.

O imposto é obrigatório, não precisa ser solidário, e o imposto sobre a agroexportação de soja e milho, bem como de tabaco e álcool, é apenas justiça social.

Estas medidas, se aplicadas, permitiriam formar um fundo para combater a pandemia e para atender a todos que perderam tudo nestes tempos.

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coronavírus / paraguai