O dia 30 de outubro de 2019 ficará marcado na vida de milhares de metalúrgicos do ABC paulista como o último dia de produção de uma das mais tradicionais bases operárias brasileiras.
O fechamento desta fábrica destrói os sonhos de aproximadamente 3,4 mil trabalhadores, demitidos e com o futuro incerto, dada a situação econômica lastimável da região e do país, além de pôr fim à luta de centenas de milhares de metalúrgicos, que batalharam durante décadas contra o seu fechamento, ameaça muitas vezes repetida pela multinacional norte-americana, com o intuito de forçar a retirada de direitos dos trabalhadores.
O encerramento das atividades foi anunciado no dia 19 de fevereiro deste ano. Após essa decisão unilateral da matriz da empresa, o sindicato iniciou um processo de negociação, a fim de encontrar uma alternativa para a Ford rever sua decisão e manter a produção no ABC. Porém, quando os patrões decidem condenar milhares de trabalhadores ao desemprego para a manutenção de seus lucros, ficam explícitos os limites da tática de negociação e também a face inescrupulosa do capital.
Uma alternativa para manter parte dos trabalhadores empregados seria a compra da planta pela CAOA. Muito se foi prometido pelo governador João Dória (PSDB) e pelo prefeito Orlando Morando (PSDB), mas a disposição para ajudar os trabalhadores não passou do discurso, e após nove meses de negociação, os governos viraram as costas para os metalúrgicos.
Nesta planta, uma das mais antigas do Brasil, foram produzidos carros e caminhões para toda a América Latina durante meio século, período durante o qual também foi palco de inúmeras greves, que enfrentaram a ganância capitalista e governos autoritários.
A greve de 1990, por exemplo, que durou 50 dias, entrou para a história como a greve dos golas vermelhas, nome dado por conta da tática utilizada na ocasião. Os operários eram diferenciados pela cor da gola do uniforme, sendo que as golas vermelhas eram do setor de manutenção, que seria o único setor a parar inicialmente. Em pouco tempo, a planta inteira estava parada, em função das máquinas que iam quebrando enquanto os manutencistas estavam de braços cruzados. Enquanto isso, os outros setores da fábrica continuaram recebendo seus salários, mesmo com as máquinas paradas, possibilitando a formação de um fundo de solidariedade para ajudar os trabalhadores da manutenção, sem salários. A tática adotada colocou a empresa contra a parede, pela radicalização da greve e pelo fôlego para continuar na luta por muito tempo. O movimento desencadeou a mobilização de toda a categoria metalúrgica contra o arrocho salarial imposto pelo plano verão e contra o governo Collor, recém empossado. Esta foi apenas uma das greves que esses trabalhadores protagonizaram.
Esse desfecho, com o fechamento da fábrica, acontece neste momento de forma bastante simbólica, já que a política de liberalização econômica adotada pelo governo Bolsonaro, idealizada pelo desalmado Paulo Guedes, facilita e incentiva os patrões a tomarem decisões como esta.
O objetivo do governo Bolsonaro é, explicitamente, massacrar a classe trabalhadora, principalmente os setores mais organizados. Setores operários com tradição de luta, como os petroleiros, professores, trabalhadores dos correios, funcionários públicos, entre outras categorias, são considerados inimigos para Bolsonaro.
Uma coisa que os trabalhadores da Ford de São Bernardo do Campo mostraram e deixaram como experiência para a classe trabalhadora brasileira é que o enfrentamento a governos autoritários se faz nas greves, nas passeatas e nas ocupações. Esse é o legado ao qual devemos nos manter fiéis.
É nas ruas que vamos derrotar estes governos e seus ataques!
*Pedro Augusto Nascimento é petroleiro e integrante do setorial Negros e Negras do PSOL Santo André.
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