Não é novidade que o governador Camilo Santana (PT), após dez meses de reeleito, tem se aproximado de políticas chaves do governo Bolsonaro e o PT nacional e sua militância mantêm silêncio ensurdecedor.
Camilo já tabelou com Sérgio Moro a vinda da Força Nacional de Seguranças ao estado, no mês de janeiro, como parte da sua aproximação à política de segurança pública bolsonarista a la Wilson Witzel, mendigou com Paulo Guedes e Rodrigo Maia o apoio à reforma da previdência em troca da inclusão de estados e municípios, e gora, aderiu ao programa do MEC das escolas cívico-militar. E o que é mais desmoralizante para a militância petista, inclusive professores e juventude, é que isso ocorre às vésperas da jornada nacional em defesa da educação e soberania, 02 e 03 de outubro.
Mas afinal em que consiste o projeto? Lançado em 5 de setembro, é um programa do governo Bolsonaro para incentivar a criação de 216 escolas cívico-militares em estados e municípios até 2023, onde a gestão escolar seria compartilhada entre educadores e militares da reserva das forças Armadas. O projeto é iniciar com 54 escolas em 2020, com o orçamento de R$ 54 milhões, sendo R$ 1 milhão por escola, repassados ao governo do estado.
A adesão ao projeto é opcional e se dá em duas fases, os estados e o Distrito Federal ocorreu em setembro, e municípios iniciará fase de adesão a partir de 4 de outubro. Nas regiões Centro-oeste aderiram Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, no Norte o Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, e no Sul, o Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. além destes, Minas Gerais e o Ceará, aderiram também.
A decisão de Camilo Santana em aderir é uma vergonha. Fortalece o projeto reacionário que tem o bolsonarismo para a educação pública brasileira e termina traindo a esquerda, os educadores, professores, e a juventude que tem se levantado desde o 15M contra os ataques do governo aos cortes de verbas à educação.
Está em curso, portanto, em fase de ajustes, o projeto que tem o bolsonarismo para a educação no marco da ofensiva conservadora mundial. Mas está evidente o profundo ataque ao atual modelo de escola e universidades públicas. Não se trata apenas de aprofundar as diretrizes dos organismos imperialistas mundial como Banco Mundial, Unesco, conforme ocorre desde o início da aplicação do neoliberalismo nos anos 1990. Há uma combinação de ataques orçamentários, retirada de qualquer viés de autonomia administrativa e política, leia-se redução da parca democracia, retirada de direitos, com uma forte ofensiva ideológica conservadora, sendo o projeto Escola Sem Partido, o MEC encabeçado por um empresário e centenas de militares e o programa escola cívico-militar, as maiores expressões.
Segundo o professor da UFF, Fernando Penna, o Escola Sem Partido (ESP) se sustenta fundamentalmente em dois grandes pilares: a) a concepção de escolarização de que o professor não é educador, que o dever do professor é apenas instruir e que a educação é responsabilidade da família; b) a desqualificação e desumanização do professor com uma criminalização político-ideológica. E Gaudêncio Frigotto (2018) considera que o Escola Sem Partido substitui a pedagogia da confiança e do diálogo crítico pelo estabelecimento de uma nova função: estimular os alunos e seus pais a se tornarem delatores. E mais, Frigotto alerta que a concepção de educação que se busca hegemonizar com o ESP nega a atividade do professor, articula falta de pluralidade e estreitamento do conteúdo e restrição da liberdade.
O programa escolas cívico-militares vai na mesma direção. Para Miguel Arroyo2, a narrativa do governo de que, sob gestão dos militares, as escolas conseguirão resolver a questão da violência e produzir melhores resultados educacionais, a partir de mais regras e disciplinas no ambiente escolar, é uma farsa. As escolas que serão militarizadas não serão as privadas, mas as públicas, as que recebem as infâncias populares das favelas, dos campos. Para Arroyo, “as escolas cívico-militares são parte do projeto de criminalização das infâncias e adolescências populares, bem como dos movimentos sociais de luta por terra, teto, transporte”.
É a esse projeto educacional, reacionário, que aderiu o governador petista, contribuindo com o que há de mais reacionário no campo educacional e consequentemente, enfraquecendo a luta em defesa da escola pública. Camilo mais uma vez se aproxima das políticas do governo Bolsonaro enquanto os professores, a juventude, a esquerda trava uma batalha nas ruas contra a política educacional bolsonarista e em defesa da educação pública. O PT está à frente da CNTE, da CUT e de vários sindicatos de professores, sua juventude está na União Nacional dos Estudantes e em vários coletivos, não podem aceitar esse duro golpe na frente de luta em defesa da educação pública. Nós que somos parte do PSOL vamos denunciar e combater sem trégua essa adesão de Camilo Santana, e nos orgulhamos da bancada do PSOL que protocolou na terça (01) um projeto de decreto legislativo (PDL 643/2020) para derrubar o decreto de Jair Bolsonaro que institui o “Programa Escolas Cívico-Militares” (Decreto nº 10.004/2019). A luta se dá em todas as arenas. Sigamos firmes.
[1]Socióloga e mestra em Educação Brasileira pela Universidade Federal do Ceará (UFC).
2 Sociólogo e educador espanhol, entrevista disponível em Carta Capital.
Comentários