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Propostas Substutivas à PEC 6/2017 são golpe na classe trabalhadora para retirar o direito à aposentadoria

Sônia Meire

Professora da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Militante da Resistência-PSOL, primeira-suplente do PSOL na Câmara dos Vereadores de Aracaju (2021-2024)

Após manifestações, paralisações e greves de diversas categorias em todo o país, no último dia 16, exigindo a retirada da Proposta de Emenda à Constituição nº 6/2019 da “Nova Reforma da Previdência”, a Câmara ignora as vozes das ruas e inicia um debate, a partir do Substitutivo à proposta, apresentado pelo Relator da PEC 6/2019, Deputado Samuel Moreira (PSDB/SP). O texto do substitutivo propõe alterações profundas quanto à forma e conteúdo da matéria para legitimar a necessidade da reforma da previdência, sustentada pelo pretenso debate de combate aos privilégios.

Ao analisar as propostas de emendas do texto substitutivo, observamos que não há nenhum compromisso em combatê-los, ao contrário, aprofunda ainda mais a desigualdade, porque mantém a ideia da desconstitucionalização do direito à seguridade social. No caso dos direitos previdenciários, o texto propõe que alterações, como os direitos à idade mínima, carência e tempo de contribuição e cálculo dos proventos, sejam regulamentadas por Lei Ordinária, ou, até mesmo, Medida Provisória. Neste item, o substitutivo consegue ser ainda pior do que o texto original da PEC 6/2019.

Outro ponto grave do substitutivo está na ruptura entre os regimes próprios, pois os entes federados são tratados de forma diferenciada, onde só a União será obrigada a seguir as regras da PEC. Os Estados e Municípios, não, exceto quanto ao regime de contribuições forem, significativamente, elevados. Decorre dessa propositura uma fragilidade na coerência da PEC e dos regimes próprios, além de gerar disparidades anti-isonômicas, principalmente, nos casos de carreiras como magistratura, membros do ministério público, policiais, dentre outros.

Há elementos positivos no texto do substitutivo, como a manutenção da situação vigente no caso dos benefícios de prestação continuada e segurados especiais (trabalhadores rurais), bem como reduz idade mínima para professores. No entanto, as regras permanecem, ao todo, prejudicando os segurados do Regime Geral de Previdência Social -RGPS e servidores públicos. Essas melhorias são insuficientes para a garantia do direito ao conjunto da classe trabalhadora, são propostas elaboradas para dialogar com parte da classe com o objetivo de fragmentar a unidade para derrubar a reforma e garantir a reprodução nos espaços de poder dos setores mais reacionários e de direita, bem como os lucros aos grandes investidores, pois, apesar de suprimir todos os itens que tratam da capitalização, não prevê a obrigatoriedade de “segregação contábil do orçamento da seguridade social nas ações de saúde, previdência e assistência social”.

Na realidade, nem o texto da PEC 6/2019, nem o substitutivo atacam os problemas da Seguridade Social, porque não se tem uma reforma que promova a reorganização contábil da União para garantir direitos como o combate à Desvinculação das Receitas da União (DRU), que provocam desvios da aposentadoria para outras áreas. A sonegação de impostos as isenções fiscais que atingem as fontes de custeio da Previdência e da Seguridade Social como um todo não impõem ao setor financeiro e ao agronegócio o pagamento das dívidas fiscais, não faz com que as grandes fortunas sejam taxadas, dentre outros pontos que contribuiriam para a arrecadação da União, Estados e Municípios para garantir os direitos sociais, dentre eles as aposentadorias.

O pseudo discurso de combate aos privilégios é constatado no conteúdo da matéria quando não se propõe, também, nenhuma alteração nas alíquotas de contribuição, uma clara demonstração de que os que ganham menos irão contribuir mais com a previdência, sem nenhuma garantia de obter o direito, já que não se propõe também alteração na idade e do tempo de contribuição no geral, apenas para algumas situações. As duas propostas premiam a sabotagem dos nossos direitos.

O trâmite da proposta da reforma e os interesses em jogo

Enquanto o debate que iniciou no dia 18 na Comissão Especial da Câmara dos Deputados sobre o substitutivo, o presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ) articula a votação da proposta na comissão para o dia 25 deste mês.

O Presidente da Comissão Especial na Câmara, Deputado Marcelo Ramos (PL-AM), explica que fez um acordo para que o debate ocorra sem obstrução dos trabalhos com vistas à aprovação do texto substitutivo. “É um acordo em que a oposição não fará a obstrução tradicional apresentando requerimentos de inversão de pauta ou de leitura de ata, que é absolutamente legítima do ponto de vista regimental; mas, em contrapartida, serão garantidas todas as inscrições sem requerimento de encerramento dos debates”.

Na realidade, os governistas e seus aliados estão preocupados em aprovar a reforma da previdência a todo custo e, para isso, tem o objetivo de blindar a Câmara dos últimos acontecimentos com o vazamento das informações pela “The Intercept”, que expõe diálogos entre o então juiz e hoje ministro da Justiça, Sérgio Moro, e o procurador Deltan Dallagnol sobre a Lava Jato, demonstrando um verdadeiro envolvimento do judiciário em manobras, para defender grupos no poder, por meio de cooptação de integrantes do próprio judiciário.

Neste sentido, os acordos podem estar comprometidos, pelo próprio bloco da oposição minoritária, em garantir a obstrução para que não seja aprovado o substitutivo na Comissão, primeiro, para focar a discussão na Câmara sobre a operação Lava Jato a partir dos vazamentos e a sua relação com a liberação de Lula. Segundo, porque está exposto que alguns parlamentares desse bloco defendem que a reforma da previdência é necessária, porém com outro conteúdo. O Senador Jaques Wagner (PT-BA) afirmou que “a oposição deve apresentar uma proposta alternativa para a reforma da Previdência”. Significa dizer que o Partido dos Trabalhadores irá operar para apresentar emendas à PEC ou até mesmo outro texto substitutivo ou contribuir com o texto que está sendo discutido na Comissão.

Enquanto isso, o governo e a própria Câmara Federal atuam com pressa para responder aos grandes interesses do capital, e, sob a cumplicidade de oposições, poderemos ter a aprovação de uma reforma que irá destruir o sistema de seguridade social e não vai garantir nenhum desenvolvimento econômico para o país. Este último é um dos pseudo argumentos, tendo em vista que os grandes empresários e banqueiros estão segurando qualquer investimento para obrigar a aprovação da reforma com a única finalidade de garantir seus lucros progressivos às custas da exploração e expropriação dos/as trabalhadores/as brasileiros/as.

Uma outra questão é a legitimidade e validade do substitutivo, desde quando há um disciplinamento na Constituição Federal (Art. 60, incisos I a III) e, no regimento da Câmara, que impõe limites do relator no processo de elaboração de emendas constitucionais.

A Constituição exige iniciativa de pelo menos um terço da composição da Câmara, ou um terço, no mínimo, dos membros do Senado Federal para ser válida a iniciativa de proposta de emenda constitucional. Segundo a CF e o Regimento, o relator não pode ser considerado detento de capacidade de inovação, de acréscimos imprevistos, sem base nas emendas apresentadas durante o prazo regimental, porque torna incerto o que se debate e se vota no curso das deliberações da Comissão, diferentemente de projetos de lei, cujas mudanças podem ser feitas nas comissões a partir da apresentação de acréscimos de qualquer deputado ou senador, é diverso nos casos de Projeto de Alteração Constitucional – PEC.

Diante disto, nos resta continuar a luta para a não aprovação da reforma nas ruas e na pressão junto a parlamentares que, mesmo com as apresentações individuais de propostas, seja qual for o partido, pressionar pela não aprovação de mecanismos que ferem a Constituição Federal. Não queremos reforma dentro da reforma. O conteúdo da PEC 6/2019 não permite reforma, ela como um todo não tem nada que atenda às necessidades e garantia dos direitos públicos à previdência e à seguridade social.

[1] Professora da Universidade Federal de Sergipe. Militante da Resistência-PSOL.