1) As manifestações deste domingo (26) foram essencialmente da extrema direita fascistizante, do setor bolsonarista puro. Apesar de “O Globo” dizer que, na Avenida Paulista, manifestantes gritaram “Paulo Guedes”, não acredito que isso tenha tido dimensão relevante. Se fosse assim, os ataques a Rodrigo Maia, hoje a figura-chave para a aprovação das contrarreformas, não teriam acontecido na dimensão em que aconteceram. Depois de Bolsonaro, a figura mais reverenciada não foi Guedes, mas Sérgio Moro, hoje um dos maiores símbolos do autoritarismo. Reverenciada de Norte a Sul. E, para mim, dentre todas, a imagem mais significativa das manifestações foi a da retirada, pelos vândalos, da faixa na entrada do prédio da UFPR que pedia apoio à educação. Aquilo foi a cara de quem foi para as ruas: boçal, obscurantista e brutal.
2) Decididamente, o que se viu neste domingo não foram manifestações da direita com punhos de renda, mas de seu setor mais selvagem. Ao longo da história, os dois segmentos podem ter pontos de contato e, muitas vezes, caminham unidos, com o grande capital usando a turba na defesa de seus interesses e, em contrapartida, suportando seus arroubos enquanto ainda não está assentada, de forma clara, a hegemonia de um setor sobre o outro. Aliás, não só aqui no Brasil esses dois segmentos são diferentes. Foi assim também na Alemanha. Lá, quando o nazismo surgiu tinha um componente “popular” em grande medida expressado nas SA. Até que, em julho de 1934 o grande capital e o Exército disseram “basta” e forçaram que Hitler as liquidasse, na chamada Noite dos Grandes Punhais.
3) O Globo e outros jornalões forçam claramente a barra ao caracterizar as manifestações como tendo sido em apoio às “reformas”. Pode ter havido algo nesse sentido aqui e ali, mas o essencial era o apoio a Bolsonaro em seu estado mais cru, em seu discurso “antipolítica” e contrário às instituições, mesmo aquelas que já deixaram claro o seu reacionarismo, como o STF e o Congresso. E mesmo que isso prejudicasse a tramitação das “reformas”. Daí os ataques duríssimos a figuras fundamentais para a aprovação delas, como o MiniMaia, vistas como símbolos da corrupção e da politicagem.
4) Ao contrário do que consideraram alguns analistas de esquerda, as manifestações foram relevantes. E é preciso se ter em conta de que uma parcela expressiva da direita não as apoiou. Outra foi até alvo dos manifestantes. Foram manifestações bolsonaristas. Por isso, não creio que o presidente saia delas enfraquecido. Ao contrário. Mostrou que seu cacife é grande, mesmo sem o apoio da direita “civilizada”.
5) As manifestações confirmaram também algo que já vinha se desenhando: há um setor de massa que ganha mais e mais contornos de extrema direita fascista. E, nele, há gente de classe média baixa, que já votou em Lula e foi atraída pela direita por conta da crise, do fim dos benefícios que chegou a ter no início dos governos do PT e da corrupção, associada aos petistas, que ficaram com uma parte exagerada dessa conta, mas não deixaram de dar pretexto para isso. Hoje, afloram nessa gente que bota as manguinhas de fora e flerta com o fascismo a raiva dos pobres e um obscurantismo que estavam submersos.
6) Como se temia, as igrejas neopentecostais estão sendo uma importante reserva para um projeto de massas da extrema direita no país. O que mostra duas coisas: a) que, apesar das enormes dificuldades, é preciso trabalhar com esses segmentos, cada vez mais expressivos numericamente; b) que esse trabalho, ao contrário do que imaginam alguns ingênuos, não pode ser pela sua cúpula, formada por pastores e bispos agentes conscientes do que há de mais reacionário no país.
7) Ao apostar no confronto – e não com a esquerda, mas com parte de seus apoiadores e com instituições conservadoras com que poderia negociar, certamente cedendo em algo, mas conseguindo o essencial – não é impossível que Bolsonaro esteja jogando numa saída golpista. Se isso for verdadeiro, significaria que ele tem no horizonte a possibilidade de uma ditadura, para a qual estaria tratando de acumular forças.
8) Por fim, esse quadro muito grave e que pode se tornar ainda mais perigoso só fortalece a importância de que as forças progressistas e democráticas façam do dia 30, quinta-feira desta semana, um dia verdadeiramente marcante. Muita coisa relativa ao futuro do país estará em jogo nos próximos meses. E, nessa batalha, as ruas serão decisivas.
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