Opinião: Construir é o essencial!

Bernardo Vargaftig, de Paris, França
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Entrevista de Lula ao El Pais e ao jornal Folha de S. Paulo

A entrevista de Lula foi desapontadora. Como em outros momentos, perdeu-se uma ocasião excepcional de atenção do público, em meio à campanha pela sua libertação. Não se trata de criticar os aspectos emocionais, respeitáveis e indiscutíveis. Já os comentários sobre Moro e Dallagnol, retratados como únicos culpados pela sua tragédia, refletem um sentimento compreensível, mas são errôneos, na medida em que atribuem culpa exclusiva a duas pessoas odiosas, mas que não são senão um instrumento de uma conspiração muito mais ampla. O modelo de cooperação de classes, de que Lula foi o principal promotor e defensor, está há longo tempo ultrapassado. Não adianta reclamar e conclamar à sua renovação sob outras formas (o que tenta fazer Ciro Gomes), pois a burguesia e seus representantes reais e/ou institucionais, assim como seus sócios majoritários, o imperialismo e os bancos, não querem e não podem mais – o dinheiro disponível não dá para concessões relativamente custosas e que sobretudo, trazem em seu bojo mobilizações populares constantes. Os sindicatos majoritários, em queda constante mas ainda assim representantes dos trabalhadores, pouco fazem pela única forma susceptível de deter a ofensiva reacionária, notadamente na Previdência, que é a construção da greve geral. Lula substitui a política mobilizadora por conselhos ridículos – pressionar seu deputado em frente à sua casa, para que ele vote direitinho! A crítica que faz às sucessivas manifestações ditas centrais (fala em “Avenida Paulista”) podem até ser acertadas, mas por outras razões: esgotam-se, não dá para sair à rua em intervalos regulares, sem efeito algum.

Sem programa, sem alguma forma de direção aceita pela maioria, não há alternativa. O próprio movimento pela libertação de Lula, ao qual subscrevo, acabará por se esgotar, se colocado fora do contexto de um programa global, defensivo certamente, mas aberto a desenvolvimentos. Isto se chama programa de transição, que não precisa ser, ao contrário do que pensam os burocratas, a apologia da violência e do irrealismo: “Paz e Terra” na Rússia bastou. Verdade que foi ao final desesperador de uma guerra imperialista assassina, que as massas rejeitavam. Será que precisaremos esperar que o imperialismo e seus satélites ataquem diretamente a Venezuela?

Qual a pauta? Previdência e uma mobilização nacional no 1 de maio. Desmascarar o caráter privatista do projeto governista (capitalização), em que só quem contribuir muito durante sua vida terá alguma chance – caso seu dinheiro não desapareça numa crise. Mobilizar para o 1 de maio é uma evidência; falar nas manifestações, diretamente sobre os problemas reais e não dar gritos sem conteúdo, que podem arrancar alguns aplausos, mas não constroem. E construir é o essencial!