Censura, golpe e as eleições
Publicado em: 3 de agosto de 2018
Na última semana de julho vieram a público informações de que o chefe de gabinete da UFSC era alvo de investigação da Polícia Federal e professores da UFABC foram questionados pela corregedoria da universidade após denúncia anônima sugerindo que teria havido crime durante o lançamento de um livro sobre o ex-presidente Lula. São as nuvens carregadas da censura e restrição das liberdades democráticas se avolumando a nossa volta.
Não são apenas os revolucionários que lutam pelas liberdades democráticas, mas todo revolucionário deve ser também um defensor ardoroso das liberdades de pensamento, de expressão e de manifestação; elas permitem nossa própria existência e nossa resistência como ativistas políticos, como trabalhadores, mulheres, negras e negros, lgbts.
Punitivismo e classe
É impossível não nos indignarmos com o evidente caráter de classe da justiça brasileira. Temos a terceira maior população carcerária do mundo (atrás dos Estados Unidos e China); Dois terços dos presos são negros e negras; Mais da metade são jovens entre 18 e 29 anos; 90% em prisões superlotadas. Por uma daquelas ironias do destino, boa parte desses presos (26% dos homens e 62% das mulheres) são fruto da lei antidrogas de 2006, ou seja, do período em que Lula, agora preso político, era presidente.
É fácil perceber que a lei antidrogas não resolveu em nada os problemas relacionados ao tráfico de drogas, embora tenha sido muito eficaz para encarcerar e colocar na ilegalidade milhares de pessoas que não têm condições de arcar com altos custos de sua defesa nos tribunais, razão pela qual 40% dos presos são provisórios, ou seja, não têm condenação judicial (nem mesmo em primeira instância!);
Diante disso alguns podem pensar que para reverter esse quadro deve-se exigir que a justiça puna também os mais ricos, aqueles que conseguem ter seus direitos assegurados graças aos honorários de seus advogados. A saída mais fácil, nesse caso, seria restringir – ou relativizar – os direitos de todos, visando punir e prender também os poderosos. O problema de saídas fáceis numa sociedade desigual como a brasileira é que suas consequências são muito mais complicadas para os trabalhadores e os mais pobres. A relativização do direito de defesa e da presunção de inocência pode servir para prender Lula (mas não Aécio, Temer, Alckmin e outros). Já para a população mais vulnerável, ela significou quase 14 mil prisões somente no estado de São Paulo.
As consequências não poderiam ser outras, pois quem esteve à frente desse processo não foram os trabalhadores, os explorados, e os setores oprimidos, mas a direita no congresso nacional que aprovou o golpe em 2016 e o judiciário, dominado por uma casta de juízes que estão entre os mais privilegiados de nosso país.
Ameaças e retaliações nas universidades
Na última semana, as universidades públicas tiveram uma mostra dramática do grau de ameaça ao livre pensamento, expressão e manifestação. Esses direitos são fundamentais para a própria existência das universidades como espaço para produção de conhecimentos voltados à sociedade brasileira, aos seus problemas e suas necessidades. É preciso liberdade para questionar, pesquisar, pensar, refletir e debater.
Não significa que qualquer coisa possa ser dita. Discursos de ódio, racismo, machismo, misoginia, homofobia, e outras formas de discriminação que legitimam a transformação das diferenças em desigualdades não devem ser permitidas. E isso não é invenção de nenhuma esquerdopata feminazi. Está bem fundamentado já no artigo 5º da Constituição Federal de 1988. Devemos combater também aqueles que visam disseminar a ignorância e conhecimentos falsos, como faz por exemplo o Bolsonaro ao afirmar que os portugueses nunca pisaram na África e que a escravização fora obra dos próprios africanos. É uma mentira, como pode ser comprovado a partir do estudo dos documentos históricos brasileiros e de diversos países africanos, inclusive daqueles de países em que os portugueses pisaram tão firmemente que foram colônias portuguesas até 1975, como Angola e Moçambique e só se tornaram independentes após uma luta armada por sua libertação. Além de mentira, é uma declaração racista, porque utilizada na recusa em reconhecer a dívida histórica com as negras e negros em nosso país.
Contudo, o que as universidades têm vivenciado são tentativas de intimidação e censura, são agressões à autonomia das Universidades, estabelecida pela constituição federal e pela LDB. Na Universidade Federal do ABC, no ABC paulista, professores foram questionados pela corregedoria da Universidade (que foi provocada pela Corregedoria Geral da União) sobre o lançamento de um livro sobre o ex-presidentes Lula, do qual o professor Gilberto Maringoni, da instituição, participou. Os questionamentos são um retrato da censura que o projeto de lei Escola sem Partido, melhor denominado como Lei da Mordaça, pretende instalar em nosso país. Tem questões como:
“É de seu conhecimento quais pessoas participaram da organização do evento? Poderia dizer o nome de outros organizadores?”; “A realização do evento foi autorizada por algum servidor? Se sim por quais?”; “Durante o evento ocorreram manifestações de apreço por parte de servidores em horário de serviço a favor de Lula e partidos de esquerda?”; “Durante o evento ocorreram manifestações de desapreço e contra o Presidente Temer e integrantes do poder judiciário-MP?”
A investigação originou-se de denúncia anônima, quando não havia razão alguma que pudesse justificar o anonimato, e não deveria sequer ter sido acolhida. Ao seguir com a investigação dessa forma um clima de ameaça e medo acaba se impondo, com consequências que podem ser desastrosas para as universidades brasileiras.
Na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o professor Aureo Mafra de Moraes, chefe de gabinete, vem sendo investigado pela Polícia Federal por atentado à honra de delegada da PF após manifestação realizada no aniversário da Universidade denunciando o caráter arbitrário de investigação que culminou na morte do antigo reitor após atirar-se do 7o. andar de um shopping. Dessa forma, busca-se intimidar e restringir a liberdade de manifestação na Universidade.
A saída é pela esquerda
Diante dessas ameaças, nossa primeira tarefa é a unidade nas lutas e nas ações contra as restrições às liberdades democráticas. Defendemos “Marielle Vive”, defendemos a investigação e punição dos responsáveis por sua morte, porque foi um crime político, de uma liderança do PSOL, e também foi um crime contra uma mulher negra, lbt, e cuja atuação era pautada na defesa das pautas desses setores. É o direito básico à vida. Defendemos Lula livre. Defendemos a liberdade de pensamento, expressão e manifestação.
O PSOL está na linha de frente dessas mobilizações. E é importante que todos os partidos de esquerda e organizações da classe como PT e CUT construam a defesa nas ruas, pois é somente lá, e não nos gabinetes de juízes e políticos, que seremos vitoriosos. Sem mobilização, sem greves, paralisações, protestos e outras formas de atuação do movimento organizado não derrotaremos a direita.
Por fim, é importante destacar a alternativa que surge com as pré-candidaturas de Guilherme Boulos e Sônia Guajajara numa frente com PSOL, MTST, PCB, Mídia Ninja e outras organizações. Sempre que existe a necessidade e a possibilidade de resistir, lá está Guilherme Boulos, lá estão o MTST, e as organizações que constroem o PSOL. Boulos, Sônia e os pré-candidatos do PSOL aproveitam o espaço aberto na campanha eleitoral para denunciar o golpe parlamentar, a execução de Marielle, as consequências das reformas de Temer e os ataques às liberdades democráticas. Boulos inclusive já havia se manifestado contra a censura na UFABC quando participou de atividade na universidade em junho.
Mais do que isso, o período eleitoral mostra que essas são as únicas candidaturas consequentes na luta contra o golpe. Consequentes porque não fazem acordo com golpistas, com aqueles que atacam nossos direitos e as liberdades democráticas. Infelizmente PT e PCdoB seguem apostando nas alianças com partidos que atacam os trabalhadores, com partidos que apoiaram o golpe como o PSB e com o próprio MDB de Temer.
O golpe de 2016 demonstrou que essas alianças eleitorais, cedo ou tarde fortalecem apenas a direita, os setores reacionários e os bancos e grandes empresários que querem arrancar nossos direitos com a reforma trabalhista e o projeto de reforma da Previdência. Uma alternativa de esquerda deve fortalecer a própria classe trabalhadora e os setores oprimidos. Hoje é Guilherme Boulos e Sonia Guajajara que trilham esse caminho.
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