Os 17 primeiros dias do governo têm sido marcados por recuos, desavenças internas, uma política externa reacionária e atabalhoada e declarações caricaturais, oferecendo muito material para o humor político nas redes.
De conteúdo, estão aplicando uma política de ataques complexa. A inspiração vem da expertise militar, Blitzkrieg ou guerra-relâmpago é uma tática militar em nível operacional que consiste em utilizar forças móveis em ataques rápidos e de surpresa, com o intuito de evitar que as forças inimigas tenham tempo de organizar a defesa.
Com isso, o governo avança posições para todos os lados, na economia, na política externa, nos direitos humanos com política sexual e combate à opressão do gênero, sobre o meio ambiente, sobre as liberdades democráticas e políticas, na organização dos trabalhadores e na segurança pública.
Mas não é um avanço sem crises. Ontem (17), a decisão do ministro Fux de suspender a investigação do Queiroz recolocou o bode na sala. Nas redes sociais as críticas foram a mil. Somadas ao escândalo de Olavo de Carvalho contra a ida dos parlamentares do PSL à China. Além desses desgastes, analistas avaliam que a decisão de Flávio em pedir ao STF a suspensão da investigação empurrou sujeira para a porta do governo, na medida em que abre espaço para aproximar Queiroz do Bolsonaro pai.
Diante de tudo isso, na internet, em entrevistas e outros meios, políticos especialistas e especialistas de Facebook interpretam uma crise no governo, e muitos já anunciam que está fazendo água. Será?
Há crises, mas…
É inegável que há bateção de cabeça no governo e uma crise de comando. Errado é achar que crise é sinônimo de fraqueza.
Enquanto a fumaça das contradições internas são vistas de longe, o mercado aplaude tudo com os olhos na aprovação da agenda Paulo Guedes, principalmente a reforma da previdência social.
Há crises no governo Bolsonaro. Mas ele não é menos perigoso por isso, pode até ser mais.
Vejamos, as crises econômicas não questionam o capitalismo, na verdade lhes dá impulsos para novo crescimento; a crise de regime no Brasil não questionou a dominação política do capital, foi motor para uma reorganização reacionária das forças da Nova Direita… e por aí vai.
“Quando o dedo aponta para a lua…
(…) o tolo olha para o dedo”. Assim diz um provérbio chinês. Bolsonaro não é a origem da correlação de forças no país, da ofensiva reacionária da burguesia sobre o povo. Sequer é o produto legítimo, mas sim uma excrescência da animação de demônios na sociedade.
Por muitos anos buscaram explicar a ascensão do nazifascismo por meio de estudos psicológico dos seus principais líderes, Hitler e Mussolini, como critica Wilhelm Reich no ‘Psicologia de Massa do Fascismo’. Mas a resposta está na realidade, na composição e movimentação das classes sociais, nas condições concretas da vida na produção e na reprodução social e, também, nas estruturas psicológicas de massa da sociedade.
Disse Marx no exuberante ‘Os Dezoito Brumário de Louis Bonaparte’: “a tradição de todas as gerações mortas oprime o cérebro dos vivos como um pesadelo”. Bolsonaro foi projetado para além do que realmente é, assumindo o espectro de novo, revolucionário diante da falida estrutura político-partidária. Assim, Bolsonaro assumiu a máscara de Collor, a máscara de Jânio Quadros, se vestiu dos fantasmas do passado, mantidos no presente pelas ideologias reacionárias sobre o Brasil.
A lua brilha pela correlação social de forças mundial. Não é só no Brasil o deslocamento à direita das consciências. Isso está na base da formação do bolsonarismo, um tumor do sistema, projetado para irromper e dar luz a um novo regime político onde a dominação política do capital seja ainda mais brutal, à altura das tarefas frente à crise econômica.
Bolsonaro, todo o seu governo e seus apoiadores são altamente corruptos. Até a última espinha. Essa é uma ferida aberta do novo governo. Devemos explorar isso. Contudo, cuidado. A grande imprensa tem outro projeto estratégico. Como bem aponta Jessé Souza na ‘Elite do Atraso’, a “luta” contra a corrupção é utilizada para demonizar o Estado em favor do mercado. Isso está entranhado na sociedade. Assim, entre farsas e tragédias, a máscara de caçador de marajás ou varredor da corrupção segue disponível para quando são necessárias. A grande mídia chantageia o governo, enquanto lustra essas máscaras.
Aprendendo com o inimigo
Em 2015, a nova direita deu um show de política. Enquanto impulsionava pautas bombas no Congresso, as ameaças de impeachment e a chantagem sobre as empresas centrais para o PIB brasileiro; seus braços no “movimento” colocavam milhões nas ruas.
Tudo coordenado. Contra a corrupção e a “velha política” nas ruas, e depois em reuniões para negociar as pautas da Câmara com Eduardo Cunha, como fez Kim Kataguiri. Esse é o caminho para nós, apesar de inverso absolutamente o sentido e a direção.
É preciso aproveitar as contradições de cima e mobilizar embaixo. Se um dia as contradições no andar de cima extraírem a besta, o farão para colocar coisa pior no lugar.
É a ação do movimento de massas imbuído de um programa justo que será capaz de explorar as contradições e crises do governo.
Mas não basta sermos nós, tem de ser em nosso nome. A Globo, por exemplo, bate em Bolsonaro, mas quer dele a reforma da previdência. Suas armas, apesar de adversárias do governo, são gêmeas da sua parteira, a demonização do Estado.
O Brasil precisa se livrar do grande mito de que nosso problema está no Estado, quando de fato está no Mercado. Esse que nunca aceitou a Constituição de 1988 e, desde então, vem drenando a proteção social e destruindo por dentro o Estado. Querem o Estado só para eles. Dizem: “o Estado está podre, corrupto, deixem que cuidemos dele e nós cuidamos de vocês”. Temos de dizer: “o Estado está apodrecido por vocês, nós o queremos para nós, o moldaremos da nossa maneira e depois o destruiremos”.
Foto: EBC
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