Sabemos que o agronegócio é um dos setores mais ativos politicamente da burguesia e mais atrasado, econômica e socialmente, no Brasil das últimas décadas. Um dos pilares de sustentação do golpe parlamentar-jurídico-midiático de 2016, o agronegócio conduz toda a política do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, na figura do famigerado Blairo Maggi. Mas depois que a equipe de transição de Bolsonaro começou a anunciar seus futuros ministros, foi possível tomar conhecimento de que a ofensiva do agronegócio e dos setores predatórios será muito dura, e a resistência será, mais do que nunca, necessária. O Ministério do Meio ambiente quase foi extinto e o futuro ministro é um condenado por crime ambiental.
Voltando um pouco no tempo, depois de mais de nove horas de debate, com argumentos toscos por parte da chamada “bancada do agronegócio” e forte obstrução da bancada do PSOL na Câmara dos Deputados, e de alguns outros parlamentares, os deputados que compõem a bancada do agronegócio conseguiram aprovar em julho deste ano, em Comissão Especial na Câmara, o Projeto de Lei 6299/2002, apelidado de “PL do Veneno”.
Formado em sua maioria por deputados com interesses ligados ao agronegócio, o colegiado aprovou por 18 votos a 9 a proposta, que, dentre outras arbitrariedades, permite a liberação de pesticidas mesmo antes de concluídas análises científicas sobre eventuais riscos à saúde humana e ao ambiente. A análise dos destaques apresentados manteve inalterado o parecer do deputado Luiz Nishimori (PR-PR), que deve seguir para o Plenário da Câmara dos Deputados e ser votado no início do ano que vem, dentro de destruições socioambientais que o governo Bolsonaro deverá promover.
O relatório aprovado retira a palavra “agrotóxico” dos veículos oficiais, com o objetivo de suavizar os efeitos negativos dos venenos usados no agronegócio, adota o termo “pesticida” (outrora já havia sido usado o termo “fitossanitário”) e prevê que esses produtos possam ser liberados pelo Ministério da Agricultura mesmo se outros órgãos reguladores, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), não tiverem concluído análises científicas dos mesmos.
O projeto causa uma grande preocupação em diversas outras organizações, como o Instituto Nacional do Câncer (INCA), a Fiocruz, o Ministério Público Federal e até a Organização das Nações Unidas (ONU) já manifestou preocupação. Evidente que essa ofensiva política se deveu à hegemonia do agronegócio na condução do Ministério durante o governo ilegítimo de Temer.
A bancada do PSOL atuou intensamente até o meio do ano para tentar impedir a aprovação da proposta. O líder do PSOL, Chico Alencar (RJ), afirmou que “o interesse e a saúde do povo brasileiro são diminuídos ao interesse meramente econômico, financeiro e até político”. Diversos estudos vinculam o uso de agrotóxicos a doenças como câncer, infertilidade, problemas renais, má formação do feto, entre outras.
A ofensiva dos ruralistas passou a contar com o marqueteiro Nizan Guanaes, pago regiamente, que vem orientando uma campanha publicitária pesada para tentar convencer a população de que há riscos aceitáveis ou de que veneno não é veneno… A campanha de Nizan certamente se esquiva de mencionar o aumento de quase 300% no uso de agrotóxicos entre 2002 e 2012 e muito menos alerta que os produtos em questão causam má formação de feto, mutação genética, abortos, distúrbios hormonais, infertilidade, impotência, distúrbios neurológicos e outros. E, para coroar o desastre, há produtos comprovadamente cancerígenos que a também chamada “bancada do Detefon” pretende liberar.
Por outro lado, uma importante vitória aconteceu, também no âmbito da Câmara dos Deputados, no que toca à questão dos agrotóxicos, neste mês de dezembro.
A Comissão Especial que analisou a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA) aprovou o Projeto de Lei 6670/2016 – que é um contraponto ao Pacote do Veneno A bancada do PSOL mais uma vez atuou ativamente na aprovação da proposta para melhoramento da qualidade na alimentação da classe trabalhadora brasileira.
A PNARA tem origem na crítica e na reação por parte de amplos setores da sociedade civil organizada, contra o potencial de contaminação dos alimentos e do meio ambiente derivado do uso intensivo de produtos agrotóxicos pelo agronegócio.
Desde o início da tramitação do projeto na Câmara, o PSOL fez parte do esforço coletivo de construção da PNARA. O trabalho foi exitoso, especialmente porque contribuiu, ao longo de sua construção, para a mobilização e a contribuição de inúmeras entidades, além do aumento do engajamento e percepção da sociedade da importância de uma produção agrícola de alimentos saudáveis, tanto para o meio ambiente como para os trabalhadores rurais e consumidores urbanos.
Como só será votado a partir de fevereiro há tempo para mobilização contra o PL 6299/2002, o Pacote do Veneno. É preciso impedir que o PL seja levado à pauta de votações no Plenário da Câmara, uma vez que ele é absolutamente contrário à Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA). Mas se for levado à plenário, a população trabalhadora do país poderá estar mais atenta aos perigos que o uso de agrotóxicos representa, e é preciso intensificar essa divulgação nestas próximas semanas, até a volta do recesso parlamentar.
A mobilização social e a derrota da narrativa dos ruralistas são os componentes essenciais para que esta proposta seja rejeitada no plenário da Câmara. Além disso, a bancada do PSOL já preparou uma contestação jurídica através de uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) para apresentar no STF, em consonância com parecer do Ministério Público Federal e com a PNARA. É uma luta em defesa da saúde da maioria da população e da preservação do ambiente natural, que enfrentou ofensivas duras e constantes durante a gestão de Blairo Maggi à frente do Ministério da Agricultura no governo golpista de Temer, e deverá continuar enfrentando durante o governo de Bolsonaro.
*Renan Dias Oliveira é membro da coordenação nacional do Setorial Ecossocialista “Paulo Piramba” do PSOL pelo estado de São Paulo.
Foto: EBC
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