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Os Direitos Humanos e as duas declarações internacionais

Aderson Bussinger

Advogado, morador de Niterói (RJ), anistiado político, diretor do Centro de Documentação e Pesquisa da OAB-RJ e diretor da Afat (Associação Fluminense dos Advogados Trabalhistas).

Aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, no período chamado pós-guerra, a Declaração Universal dos Direitos Humanos surgiu enquanto uma declaração estatal-mundial, personificada pela ONU, de promoção e, mais que isto, universalização dos direitos e garantias individuais, através de seus 30 artigos de defesa e proclamação da vida, liberdade, segurança, democracia e fundamentalmente dignidade humana, texto este que passou a ter uma benéfica influencia fundamental nas constituições da maioria dos países, bem como serviu de parâmetro para relação entre estes, no plano político-jurídico internacional.

Neste ano em que completa seus 60 anos, é importante, sim, destacar seus enunciados civilizatórios, mas sem cair no ufanismo de imaginar que isto é o que a humanidade possui de mais avançado, pois, embora tenha o seu ideário influenciado pelas ideias irradiadas pela civilizatória revolução francesa de 1789, tivemos também, há 100 anos, na Rússia de 1918, pós-revolução socialista, a proclamação da Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, (ambas fazem aniversário neste ano de 2018), que, em meu particular ponto de vista, constitui um estatuto de direitos humanos e sociais muito mais avançado que a sexagenária e importante Declaração da ONU e que traz insculpido em seu capitulo II a afirmação e promessa histórica de (…) suprimir toda exploração do homem pelo homem, a abolir completamente a divisão da sociedade em classes (..), priorizando de forma categórica a promoção de direitos sociais, especialmente o pleno emprego e terra para os camponeses.

A situação, contudo, mais impressionante, – independentemente das simpatias pelo primeira ou segunda declarações internacionais -, constitui o fato de que estamos enormemente distantes dos enunciados do documento fundante socialista,assim como do texto primordial da ONU, sendo que, além de toda miséria produzida pelo capitalismo, (dentro e fora de suas regiões mais desenvolvidas), a própria URSS, como sabemos, posteriormente se degenerou em um lamentável Estado burocrático e opressor, devido a diversos fatores que não cabe hoje aqui desenvolver, mas que decorrem, além dos sabidos ataques e sabotagens dos países capitalistas, certamente também de uma forte dose de traição dos ideais revolucionários e libertários pelas direções que vieram após o primeiro e ousado governo bolchevique.

Mas, registros históricos a parte, assim como respeitadas as preferências de cada um, o importante é refletir, nestes dois aniversários, (para todos os gostos), que a humanidade está vivendo tempos de retrocessos sociais e democráticos, que, se não tiverem um paradeiro, poderão nos lançar em uma nova “idade das trevas”, assim como já tivemos o apogeu do nazismo e fascismos, e digo isto vendo o tratamento desumano conferido aos imigrantes que chegam aos milhares à velha Europa e também agora aqui no Brasil, provenientes da caótica Venezuela; Digo isto a par dos índices de forme, carência de moradia, saúde, educação, ausência assistência de assistência minimamente adequada à velhice, às crianças, racismo, homofobia, pregação anti-democracia, enfim, um quadro nacional e mundial em que existe uma enorme parcela da população humana que está desumanamente abaixo da linha de pobreza, apesar dos esforços das políticas compensatórias da social-democracia europeia e do PT no Brasil, através de políticas como bolsa-família, minha casa minha vida, dentre outras.

Constata-se que nem isto – mínimas concessões humanitárias – as elites empresariais egoístas e seu neoliberalismo calculado se compadecem de conceder, haja visto, por exemplo, a redução destas políticas sociais tanto aqui no Brasil, nos últimos dois anos, principalmente após o golpe parlamentar-judicial que depôs uma presidente eleita, como também nos EUA, após as eleições que elegeram o direitista Trump, com a ajuda, dentre outros reforços, da espionagem e dinheiro russos. Constata-se que os direitos humanos são tão necessários como o ar e a água, sem os quais não se consegue viver minimamente.

O fato principal, incontestável, é que precisamos, sim, de direitos humanos, proteção social, cumprimento, no mínimo, da Declaração Universal de 1948 e também sonhar com um mundo sem exploração do homem pelo homem, como preconizava a Declaração corajosa (hoje sem nenhuma vigência estatal…) de 1918; Precisamos de reformas, sim, sem perder de vista as mudanças mais profundas, mas que minimamente evite que continuemos a perder vidas, sobretudo de jovens negros e negras, como vem acontecendo nos morros do Rio de Janeiro, principalmente após esta malsinada intervenção militar. Nunca os Direitos Humanos foram tão necessários, e, por este motivo, são tão atacados, pisoteados, não sendo atoa que toda a mídia, os conservadores, se dedicam, com bastante êxito, inclusive, a convencer a população de que “direitos humanos não defendem as vítimas, mas apenas bandidos”, ou “que é coisa de bandido”, como diz o candidato da extrema-direita brasileira, o inominável Capitão reformado do Exército, candidato em verdade a ditador, junto com um ultraconservador General igualmente golpista.

Finalizando este breve texto, (que escrevo em sincera homenagem a todos que lutam pelos direitos humanos no mundo e no Brasil), dizendo que devemos aproveitar este momento histórico para não somente celebrarmos a importância inegável da Declaração Universal da ONU, mas refletirmos sobre o que realmente faz-se necessário e urgente, – para alem dos aspectos do Direito Internacional- a fim de resistirmos e conseguirmos deter esta onda anti- civilizatória e anti-direitos humanos que está tentando avançar como uma avalanche sobre principalmente o povo pobre, os negros e negras africanos e brasileiros, quilombolas, favelados dos morros cariocas, palestinos, curdos, armênios, (para citar aqui apenas alguns destes povos oprimidos), imigrantes das mais variadas bandeiras, indígenas, ciganos, comunidade mundial LGBT, enfim, a maioria absoluta dos povo e dos povos, antes que seja tarde demais.

* Aderson Bussinger é advogado sindical e conselheiro da OAB-RJ. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais/UFF, colaborador do site Tribuna da Imprensa Sindical, Diretor do Centro de Documentação e Pesquisa da OAB-RJ, membro Efetivo da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ. Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB).

Imagem: Lenin, autor da Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, de janeiro de 1918