Por: Gabriel Casoni
(Edição revisada em 09 de abril de 2017)
O presente texto tem como objetivo oferecer uma contribuição para a compreensão do proletariado brasileiro. A geração anterior da classe trabalhadora brasileira assumiu o seu lugar na história quando se levantou, a partir das greves do ABC, em 1978. Ela abriu o caminho para as greves de petroleiros, professores, bancários, metroviários, químicos, operários da construção civil, e muitos outros setores do proletariado. Sem o protagonismo da classe trabalhadora é impossível compreender a fase final da luta contra a ditadura militar. Foi ela que contagiou de esperança dos milhões que foram às ruas nos anos seguintes.
Ela já provou a sua disposição revolucionária de luta em milhares de combates parciais. Ela continua sendo a classe que, quando as condições políticas colocarem a possibilidade de disputar o poder, ou seja, quando se abrir uma situação revolucionária, pode mudar os destinos do Brasil. Ela é a classe portadora de esperança.
Os dados que apresentaremos em sequência revelam que classe trabalhadora brasileira é um gigante, pela sua dimensão e potência da sua força social de choque; é superexplorada através de salários baixos; está muito concentrada, em quase vinte cidades com um milhão ou mais de habitantes; tem uma expressiva composição negra, que é majoritária em muitas regiões; o peso da juventude no seu interior, um em cada três com menos de trinta anos, é grande; conheceu uma intensa feminização, nos últimos trinta anos, sendo esta uma de suas camadas mais oprimidas; exerce e sofre a pressão do peso do semiproletariado, mas tende a arrastar para o seu campo a maioria pobre e popular das cidades e do campo; sofre, em menor escala, a pressão do lumpen; está desorganizada, com algumas exceções, nos locais de trabalho; possui, em especial no setor privado da economia, um índice baixo de sindicalização; tem graus moleculares de organização política independente, e sofre as sequelas da baixa escolarização.
O estudo que ora apresentamos contém, certamente, erros e lacunas, limites e deficiências, que serão superadas, aos poucos, por meio da discussão, crítica e elaboração coletivas. Não analisaremos, nesta nota, pelas necessidades do foco da pesquisa, o papel dos aparelhos burocráticos que atuam sobre a classe trabalhadora. Este tema será central em outra nota.
Classe e programa: aspectos gerais
Nos dias atuais, paira sob a classe trabalhadora o véu da invisibilidade. Propagam-se nos mais distintos espaços discursos que buscam apagar o peso e a centralidade do proletariado no mundo contemporâneo1. Não temos acordo com essas teses.
Acreditamos que o programa socialista tem um caráter proletário por um motivo simples: é a classe explorada e oprimida que movimenta o mundo. A riqueza da burguesia é extraída do suor e sangue dos trabalhadores e trabalhadoras. Como uns são produtores e outros parasitas, a construção de uma humanidade emancipada vem do proletariado2. O caráter operário do programa revolucionário, portanto, é dado pela própria natureza do capitalismo, que é baseado na exploração do proletariado pela burguesia. Por isto, a revolução brasileira tem como principal sujeito social o proletariado3, liderando um bloco social com um programa socialista que incorpora as tarefas democráticas. Não é porque está escrito no Manifesto Comunista que isto é assim. É desse modo, porque a realidade, tal como ela é hoje, confirma o programa marxista.
Diferentes setores formam o proletariado. O núcleo estratégico da classe trabalhadora segue sendo a classe operária industrial. Os operários industriais formam o setor decisivo dos trabalhadores pelo seu papel fundamental na produção capitalista, sua concentração em grandes fábricas e canteiros de obras, e por sua tradição de organização coletiva.
Ao contrário dos que veem a expansão da classe média como um obstáculo4, não temos motivos para ser pessimistas. O desenvolvimento histórico do capitalismo vem confirmando a previsão de Marx e Engels. Os últimos cem anos foram testemunhas de uma gigantesca proletarização da sociedade humana5.
Até a primeira metade do século XX a maior parcela da humanidade era formada de camponeses. Em outras palavras, mesmo que pobre, a grande maioria da população era feita de pequeno-burgueses proprietários. Hoje a maior parte da população mundial é de trabalhadores assalariados explorados pela burguesia. A proletarização da sociedade foi acompanhada e impulsionada por um processo de urbanização em escala global sem precedentes6. Essas transformações devem ser motivos de otimismo. Afinal, significam que o proletariado tem uma força social objetiva maior, como nunca antes na história7.
O proletariado industrial, por sua vez, está longe de perder importância. A realidade do mundo contemporâneo confirma isso. Por exemplo, a China, que concentra 20% da produção industrial do planeta, tem hoje a maior concentração de operários industriais da história8. Podemos citar também o peso econômico e social da classe operária industrial em países como Alemanha, Itália, Japão, EUA, França, Brasil, Rússia, Coréia do Sul, Índia, Vietnã, África do Sul, os países do Leste Europeu, entre outros9.
Classe trabalhadora no mundo hoje
O proletariado contemporâneo não é igual ao que existia há 30 anos em nenhum lugar do planeta. A restauração capitalista no Leste Europeu e na China, assim como a reestruturação produtiva e o modelo econômico hegemônico neoliberal, modificaram muita coisa no mundo do trabalho10.
Em outras palavras, hoje temos uma classe trabalhadora mais explorada e precarizada11; com menos direitos, e que sofre de pesados ataques sobre suas condições de vida e trabalho, mas, também, mais concentrada em gigantescas regiões metropolitanas, e mais escolarizada. Nunca a classe trabalhadora foi tão grande em termos absolutos e relativos12, porém ela é mais complexa e segmentada. É tão ou mais lutadora que no passado, mas é menos organizada sindical e politicamente. Sua composição é mais negra, feminina e LGBT.
As últimas décadas assistiram a um acelerado crescimento dos assalariados no setor de serviços 13. Este processo de reconfiguração ocupacional acarretou, em muitos países, na diminuição relativa do proletariado industrial em relação ao conjunto da população trabalhadora (como é possível observar, por exemplo, nos EUA, Europa Ocidental e Brasil) 14.
Por outro lado, diversas modalidades de serviços – telemarketing, grandes redes varejistas, cadeias de restaurantes e fast-foods, entre outros – cada vez mais assumem características industriais15, tais como: concentração de mão de obra numa mesma unidade produtiva; métodos similares de organização da produção e controle do trabalho (combinações variadas de taylorismo, fordismo e toyotismo); conexão estreita com as cadeias globais de produção e distribuição de bens e serviços; etc.
Outro fator de importância central é o processo de terceirização e precarização da mão de obra16. Nos últimos 30 anos, formou-se um tremendo batalhão proletário super-explorado, super-oprimido e com pouca organização sindical, tanto na indústria como no setor de serviços. Um setor extremamente explosivo, em determinadas circunstâncias.
Lutas e consciência
Diversos processos revolucionários sacudiram o mundo nos últimos 20 anos: Argentina, Venezuela, Equador, Bolívia, Tunísia, Egito, Síria e entre outros. Nenhuma delas chegou perto da expropriação da burguesia, apesar da radicalidade na ação. De um modo de ou outro, todos esses processos foram derrotados ou desviados. Os trabalhadores participaram desses processos revolucionários, mas não foram organizações suas, independentes, que os dirigiram. Não entraram organizados, infelizmente, como classe, mas sim diluídos na massa em rebelião.
Foi essa a dinâmica também em muitos processos de revolta popular. Em Junho de 2013 no Brasil, nas mobilizações massivas da juventude em Portugal e Espanha ou nas marchas anti-estupro na Índia. Em cada um dessas rebeliões, como ou maior o menor participação, os operários se fizeram presentes, ainda que dispersos.
Existiram, também, diversas lutas proletárias que assumiram importância política no último período. A onda de greves operárias na China nos últimos anos, as rebeliões em grandes obras da construção civil no Brasil em 2012-2013, a marcha dos mineiros na Espanha, importantes greves operárias na Argentina, as paralizações de trabalhadores têxteis no Egito, entre outros casos.
Como marxistas, porém, sabemos que é preciso observar cuidadosamente o lado subjetivo da classe trabalhadora. Evidentemente, a derrota que significou a restauração capitalista em um terço do planeta e a ofensiva ideológica do imperialismo nos anos 90 trouxe consigo o recuo do nível médio de consciência da classe trabalhadora17. A consciência de classe retrocedeu muito e, por consequência, seu nível de organização. Ao mesmo tempo, por outro lado, a crise capitalista que eclodiu em 2008, voltou a despertar em parcelas dos trabalhadores, ainda que de modo limitado e desigual, elementos de consciência anticapitalista.
Estrutura social: proletariado e semiproletariado no Brasil
O capitalismo brasileiro reproduziu, no percurso da passagem da sociedade agrária para a urbano-industrial, um traço peculiar no desenvolvimento dos países atrasados18, mas em uma escala imensa, portanto, peculiar, comparativamente, mais intensa: o amálgama de formas modernas e arcaicas resultou numa formação econômico-social, especialmente, particular, pois desigual e combinada. Nela, o atrasado condiciona a existência do mais avançado e, vice-versa, o mais moderno impõe uma totalidade que é maior e mais complexa que a soma das partes. Não é mera coexistência ou sobreposição: trata-se de um híbrido 19.
Ao longo do século XX, a existência do “moderno” – o crescente processo de industrialização/urbanização – e o “atrasado” – a arcaica estrutura agrária/rural, com os agregados, os meeiros, os foreiros e o cambão20 – não representou uma barreira ao desenvolvimento nacional capitalista. Essa combinação foi, em realidade, condição para o estabelecimento de um regime de acumulação de capital especial para a burguesia nacional hegemônica, e para os interesses dos capitais estrangeiros dominantes. Especial, porque fundamentado na superexploração do trabalho.
Assim, a dimensão “arcaica” da economia não pode ser entendida com uma excrescência, um polo “marginal” indesejado das estruturas subdesenvolvidas, mas antes como parte funcional do modelo de acumulação nos países periféricos. Este processo histórico, articulando a expansão da indústria e dos serviços urbanos com a permanência de uma estrutura agrária, basicamente, atrasada, produziu taxas fabulosas de acumulação por um lado, e por outro, acentuados níveis de exploração da força de trabalho.
O Brasil caracterizou-se, desde a lenta formação do mercado livre de trabalho, por ser uma economia de baixos salários, assentada na superexploração da força de trabalho21. A herança de quatro séculos de escravidão conformou um padrão de exploração no país. A existência de uma ampla população trabalhadora “excedente”, existente à margem das cadeias produtivas centrais e, por isso, condenada à informalidade, e relegada à condição de miséria, constituiu uma característica da estrutura social nacional 22.
Embora a expansão econômica, ao longo de último século, tenha conduzido a uma redução relativa, ainda que muito desigual da pobreza, a maior parte dos trabalhadores permaneceu presa a salários baixos23. O fim do trabalho escravo não veio acompanhado da realização da reforma agrária. Tampouco ocorreu qualquer reforma social relevante que alterasse os níveis brutais de desigualdade social. Em outras palavras, as relações de produção baseadas na mão de obra escrava foram abolidas, porém a estrutura social manteve-se caracterizada pela concentração de riqueza e renda nas mãos de uma pequena classe proprietária.
Compreendamos a nossa peculiaridade. O período inicial de formação da classe trabalhadora assalariada se entrelaça com a história de luta dos trabalhadores escravos contra os senhores escravocratas, em especial no período final da vigência da escravidão, quando a luta pela liberdade adquiriu enorme amplitude24. O proletariado assalariado nascente abrigava homens e mulheres de distintas origens: ex-escravos, emigrantes estrangeiros, migrantes das áreas rurais, etc. O contingente de trabalhadores imigrantes europeus que chegou ao Brasil, entre o fim do século XIX e o início do século XX, compôs, durante as primeiras duas gerações, uma parte do proletariado industrial.
Ao mesmo tempo, em parte considerável, o fluxo migratório do meio rural, uma maioria de descendentes de escravos, foi empurrada para fora das atividades econômicas urbanas formais (indústria e serviços) suscitadas pelas transformações econômico-sociais. De tal modo, que ocorreu, a partir do final do século XIX, a criação de uma significativa camada de trabalhadores “sobrantes”, ou periféricos ao proletariado25. Esta massa de “excluídos” não oscilava somente em função da alternância das fases dos ciclos econômicos, sendo absorvida e expelida do mercado de trabalho. Esta superpopulação trabalhadora passou a ser um traço estrutural.
Dito de outro modo, o ciclo de industrialização nacional tardia (1930-1980), ainda que tenha impulsionado fortemente o emprego assalariado, foi incapaz de incorporar o conjunto da força de trabalho urbana em expansão. Essa população “excedente”, um exército industrial de reserva, em conceituação marxista26, em face das agruras da miséria, buscou no trabalho informal, no trabalho por conta própria, e em outras formas de trabalho precário, meios de sobrevivência.
Formou-se, assim, o que podemos denominar de semiproletariado 27. Isto é, uma camada da população trabalhadora empobrecida28 (existente tanto nas regiões semirrurais, como nas cidades médias e grandes), não incorporada nas relações formais de trabalho assalariado, e que tampouco consegue se constituir enquanto pequena burguesia proprietária empregadora; situando-se, do ponto de vista das classes sociais, na fronteira do proletariado.
A existência desse enorme contingente de trabalhadores “excedentes” nunca teve um caráter disfuncional com relação ao modelo de acumulação vigente. Ao contrário. Por um lado, a superpopulação trabalhadora, funcionando como um exército industrial de reserva, sempre pressionou negativamente a média salarial; por outro lado, a informalidade permitiu atender à demanda de serviços vinculados aos segmentos sociais de alta renda (trabalho doméstico, cuidadores familiares, conservação do patrimônio, etc.) 29. Mas não é só. O enorme batalhão de empregados informais contribuiu para o rebaixamento do salário médio também por outra via: a produção de bens e serviços baratos que contribuem para a formação da “cesta da básica” da classe trabalhadora (alimentos, moradia, vestuário, e serviços em geral) 30.
Esse cenário de acentuada precariedade, herdado do passado, ainda não foi superado. A situação de informalidade se reduziu de modo expressivo ao longo da urbanização do último meio século31. Mas esse aspecto da nossa formação econômico-social segue presente. É um traço distintivo da realidade social do país. Nas metrópoles brasileiras, nos dias atuais, ele se manifesta por meio da crescente segregação da população trabalhadora mais pobre e oprimida que vive nas favelas das cidades. Ela obedece à lógica de especulação e espoliação relacionada ao espaço urbano32.
Por outro lado, nas fronteiras do semiproletariado localiza-se uma camada marginalizada, geralmente vinculada às atividades ilícitas, que devemos classificar como o lumpemproletariado brasileiro. É conhecido, por exemplo, o peso das organizações criminosas ligadas ao tráfico de drogas (PCC, Comando Vermelho, entre outras) nas periferias e favelas das médias e grandes cidades brasileiras, bem como no sistema prisional33. Estes aparelhos, muito profissionais, controlam em regime de monopólios, atividades ilegais (roubo, furto, extorsão, tráfico, prostituição, jogos ilegais, etc.), vinculadas a negócios capitalistas ilegais de alta lucratividade. Incorporam em suas operações uma legião de desamparados, em sua maioria jovens. Não podem ser desprezados, politicamente, por sua incidência social regressiva sobre o proletariado e a população pobre.
Tendo em conta esse panorama amplo, a estrutura de classes brasileira caracteriza-se, do ponto de vista dos que vivem do próprio trabalho, em primeiro lugar, pela existência de uma classe trabalhadora assalariada de enorme envergadura. Ela ainda está em crescimento, tanto do ponto de vista absoluto como relativo, quando comparada com o peso demográfico das outras classes. Mas, também, se define pela existência de uma expressiva camada semiproletária no campo e na cidade, que ainda abarcava, em 2014, aproximadamente um terço da população ocupada do país.
A classe trabalhadora brasileira: um gigante social
Tomaremos os dados fornecidos pela PNAD 201434 como referência para a análise desta seção. Embora a metodologia e critérios da pesquisa do IBGE não seja, evidentemente, marxista, as informações oferecidas são indispensáveis para o mapeamento e descrição da população trabalhadora do país.
Em 2014, os assalariados com contrato formavam um contingente de 60,5 milhões pessoas, o que representava 61,3% do total da população ocupada do país 35. Além destes, havia 21,1 milhões de empregados por conta própria, 6,4 milhões de trabalhadores domésticos, e 6,9 de milhões trabalhadores em demais ocupações não remuneradas36. Se somarmos todos esses grupos37, chegamos a um total de 94,91 milhões de homens e mulheres que vivem do próprio trabalho38 – o que significa 96.2% do conjunto das pessoas ocupadas em 2014.
Os proprietários empregadores, aqueles que têm empresas com um ou mais funcionários e que, portanto, contratam de força de trabalho alheia, categoria que engloba indistintamente tanto microempresários como grandes capitalistas, eram 3,7 milhões de indivíduos (3,8% dos ocupados) 39.
Em termos de divisão por setor econômico, o de serviços absorvia, em 2014, 45,2% dos ocupados, o que correspondia a 44,6 milhões de trabalhadores. O comércio e a reparação, por sua vez, representavam 18,2% dos ocupados, com aproximadamente 17,9 milhões de pessoas. Os trabalhadores das atividades agrícolas totalizavam 14,0 milhões de pessoas. Já os empregados na indústria de transformação eram 13,0 milhões, representando 13,1% dos ocupados. Os trabalhadores da construção, por seu turno, com 9,0 milhões de pessoas, respondiam por 9,2% da população empregada.
No que se refere à relação campo-cidade, vale notar que dos 56,6 milhões de empregados em atividade não agrícola, 79% estavam no setor privado, dos quais 78,5% possuíam carteira de trabalho assinada. Os funcionários públicos correspondiam a 21% dos trabalhadores em atividades não agrícolas, dentre os quais predominavam os militares e funcionários públicos estatutários (60,4%); os demais eram empregados com carteira assinada (17,9%) ou sem carteira (21,7%).
Entre 2011 e 2014, a proporção de trabalhadores com carteira assinada em relação ao conjunto da população ocupada passou de 55,3% para 64,6%, o que representou um acréscimo significativo na formalização das relações de trabalho no período. Contudo, com a eclosão da crise econômica em 2015, a dinâmica se modificou. Somente entre o fim de 2014 e o fim de 2016, em 24 meses, mais de 2,613 milhões de trabalhadores com carteira assinada perderam seu empregos, de acordo com o IBGE. Uma destruição acelerada de enorme proporção e consequências.
Vale destacar que não há salários nacionais no Brasil a não ser em carreiras do funcionalismo público federal. Portanto, as desigualdades regionais pesam muito. A “regionalização” da classe trabalhadora é, comparativamente, menor que a da classe média e da burguesia, mas é grande, quando em comparação com proletariados de outros países.
Composição da força de trabalho
A expansão da indústria e dos serviços urbanos conduziu a uma redução qualitativa dos empregos vinculados às atividades agropecuárias ao longo dos últimos 70 anos. O setor primário passou de quase 61% do total de postos de trabalho, em 1950, para menos de um 18%, em 2008. O setor secundário (indústria e construção), por seu turno, que entre 1950 e 1980, havia crescido de 20,5% para 38,6% do PIB, perdeu peso relativo, após a década de 1980. Em 2008, a indústria e a construção respondiam por 24% dos postos de trabalho. A queda relativa da indústria deve-se fundamentalmente ao robusto crescimento dos serviços e do comércio, que pularam de 42,6% para 57,6% em termos da composição setorial da ocupação da força de trabalho.
Sindicalização
No que tange ao índice de sindicalização, nota-se o seguinte: em 1999, 32,9% do total de assalariados formais eram sindicalizados. Quando observamos a taxa em relação ao conjunto dos assalariados (formais ou não), o índice de sindicalização cai para 17,1%. Já em relação ao total de ocupados, a taxa de sindicalização era de apenas 12,2%. Os números mantiveram-se mais ou menos equivalentes em 2009, embora com viés de baixa: 29,7% de sindicalizados entre os trabalhadores assalariados formais, 17,3% entre o conjunto dos assalariados e 13,1% em relação ao total de ocupados 40.
Em relação à taxa de sindicalização por setor de atividade, destaca-se o maior índice sindicalização nos serviços públicos, e na indústria de transformação. Vejamos o gráfico abaixo41:
Feminização da classe trabalhadora
Na década de 2000, 60% das ocupações oferecidas absorveram mulheres. Ao longo dos anos 90, o emprego feminino respondeu por dois terços do total dos postos de trabalho gerados, sendo que, na década de 1980, eram as ocupações masculinas que predominavam. A população empregada masculina era de 56 milhões de pessoas, em 2014, enquanto que a feminina totalizava 42,6 milhões.
No que tange à participação das mulheres no mercado de trabalho, é inquestionável que houve um avanço considerável42. Em 1970, segundo os dados dos Censos Demográficos, apenas 18,5% das mulheres eram economicamente ativas. Em 2010, esta porcentagem subiu para 50%. Em outras palavras: a classe trabalhadora brasileira ficou mais feminina nos últimos 40 anos.
As desigualdades de gênero, porém, seguem enormes. Enquanto os homens apresentam taxas de atividade da ordem 80%, as mulheres não chegam a 60%. Ou seja, quatro de cada 10 mulheres não conseguem se colocar disponíveis no mercado de trabalho. A sobrecarga de trabalho doméstico (o cuidado da casa, dos filhos, idosos, doentes, maridos, etc.), entre outros aspectos conectados à opressão de gênero, explicam esse quadro de acentuada desigualdade.
É importante notar que o processo de feminização da força de trabalho parece emitir alguns sinais de esgotamento. Entre 2004 e 2014, a taxa de atividade feminina oscilou muito pouco, tendo alcançado seu auge, de 59%, em 2005, para depois, em 2011, cair a 56%43.
O racismo e exploração
O caráter estruturante do racismo no Brasil, no que se refere à conformação do padrão de superexploração, ganha contornos nítidos quando observamos as desigualdades de renda e de condições de trabalho. Como bem aponta Marcelo Badaró44, quando desagregamos os dados sobre rendimentos de 2010, considerando as classificações raciais do IBGE, temos o seguinte perfil dos rendimentos médios mensais: brancos (R$ 1.538); amarelos (R$ 1.574); pretos (R$ 834); pardos (R$ 845) e indígenas (R$ 735). Ou seja, brancos e amarelos tem quase o dobro do rendimento médio dos pretos, pardos e indígenas.
Outro relevante elemento do racismo se expressa na participação negra entre os empregos precários. A mulher negra, que está base do sistema remuneratório, fica sujeita às piores ocupações – fato que torna explícito a confluência da opressão de gênero, raça e classe. Os números são autoexplicativo: 39,1% das mulheres negras empregadas estão inseridas em relações precárias de trabalho, seguida pelos homens negros (31,6%), mulheres brancas (27,0%) e homens brancos (20,6%) 45.
O emprego doméstico, herança viva do nosso passado escravocrata, segue respondendo por parte significativa dos empregos das mulheres negras. O serviço para famílias de mais alta renda permanece profundamente disseminado na sociedade brasileira. Segundo dados do IBGE, em 2014, 14% das brasileiras ocupadas eram trabalhadoras domésticas, um total de 5,9 milhões46. Aqui, a diferença racial é notável: 17,7% das mulheres negras eram trabalhadoras domésticas, ainda a principal ocupação entre elas. Do total de trabalhadores que desenvolvem atividades no interior das unidades familiares, em 2010, quase 97% recebiam até dois salários mínimos mensais.
Os dados expostos acima atestam que não houve reversão qualitativa do quadro de extrema desigualdade racial no mundo do trabalho – mesmo durante uma conjuntura de crescimento econômico, e de ampliação da “formalização” da força de trabalho, como a que ocorreu durante os dois governos Lula e o primeiro governo Dilma. Afinal, parte considerável das negras e negros, que ingressaram no mercado de trabalho naquele período, o fez por meio de contratos atípicos, na terceirização ou no auto empresariamento precário, e geralmente em condições salariais inferiores à média da população trabalhadora.
Grupos etários, escolaridade e população ocupada
Do ponto de vista das faixas etárias, o grupo de pessoas entre 30 e 39 anos de idade, respondiam, em 2014, a 25,5% dos ocupados; 40 a 49 anos de idade, a 21,9%; e 50 a 59 anos, a 15,8% dos ocupados. Aqueles com menos de 30 anos são, pelo menos, 30%, o maior contingente relativo.
No que se refere ao nível de instrução da força de trabalho, predominaram, em 2014, os ocupados com ensino fundamental incompleto ou equivalente (26,4%) e os com ensino médio completo ou equivalente (30,1%). Os empregados com ensino superior completo registraram participação de 13,9% em 2013 e de 14,3% em 2014. Há importantes variações regionais. No Nordeste, foi registrado o menor percentual de pessoas ocupadas com 11 anos ou mais de estudo (40,0%). Já na Região Sudeste, este percentual foi o maior – 56,9% em 2014. Estima-se que, pelo menos 27% dos brasileiros com quinze anos ou mais, quase um em cada três, não conseguem atribuir sentido a um texto escrito.
É interessante notar algumas características da população desocupada em 2014, ano que antecedeu a eclosão da crise econômica de 2015-2016 que fez disparar o desemprego. Destacam-se os seguintes dados entre os que estavam à procura de trabalho: 56,7% dos desocupados eram de mulheres; 28,3% nunca tinham trabalhado; 34,3% eram de jovens de 18 a 24 anos de idade; 60,3% eram pretos ou pardos.
Padrão de exploração
O padrão de exploração da classe trabalhadora no Brasil está fortemente caracterizado pelos salários baixos e pela precariedade das condições laborais47. O grosso dos empregos concentra-se na base da pirâmide social. Em 2010, por exemplo, os trabalhadores com ganhos de até 1,5 salário mínimo representavam a metade do total das ocupações no Brasil; desses mais de 75% são assalariados, dos quais dois de cada três possuem carteira assinada.
Vejamos a evolução da geração líquida de postos de trabalho e algumas de suas características ao longo do tempo. Durante os anos setenta, houve a geração de 17,2 milhões de empregos, dos quais 34,3% ofereciam remuneração mensal de até 1,5 salário mínimo, e 16,9% recebiam acima de cinco salários mínimos mensais. Nos anos 80, por sua vez, o Brasil criou 18,1 milhões de novos postos de trabalho, destes 25,4% com remuneração de até 1,5 salário mínimo e 33,1% de cinco ou mais salários mínimos mensais.
Na década de 90, porém, a oferta de empregos caiu consideravelmente. Foram gerados apenas 11 milhões de novos postos de trabalho, dos quais 53,6% não previam remuneração. Na faixa de renda de até 1,5 salário mínimo, ocorreu a redução líquida de cerca de 300 mil empregos, o que assinala um padrão bem diferente das décadas anteriores.
Já nos anos 2000 temos um perfil muito distinto da década anterior: foram gerados 21 milhões de postos de trabalho, dos quais 94,8% foram com rendimento de até 1,5 salário mínimo. Nas ocupações sem remuneração, houve a redução líquida de 1,1 milhão de postos de trabalho. Outra característica do padrão de empregos criados nos anos 2000 é a significativa redução na faixa de 5 salários mínimos ou mais: foram eliminados 4,3 milhões postos de trabalho neste segmento de renda.
Em síntese, na primeira década do século XXI, houve concentração de empregos na base da pirâmide social, concomitantemente, diminuíram os postos de trabalho sem remuneração e, no outro extremo, foram eliminados especialmente os empregos mais bem pagos, de cinco salários mínimos ou mais.
Entretanto, convém notar, para o correto diagnóstico do padrão de exploração medido em faixas salariais, a significativa valorização do salário mínimo ao longo dos últimos vinte anos. Entre 1994 e 2014, o Salário Mínimo teve ganho real segundo o DIEESE, de 72,31%. Por conseguinte, é preciso ter em conta que o poder de compra da população trabalhadora, que recebia nesse período, por exemplo, entre 1 e 3 salários mínimos, aumentou consideravelmente; tendo sido sensível o impacto positivo, portanto, no nível de vida dessas pessoas.
Entre os trabalhadores na base da pirâmide social, observa-se que as profissões em maior expansão na década de 2000 foram as de serviço (6,1 milhões de novos postos de trabalho, que responderam por 31% da ocupação total). Logo em seguida, aparecem os trabalhadores do comércio (2,1 milhões), da construção civil (2 milhões), de escriturários (1,6 milhões), da indústria têxtil e de vestuário (1,3 milhão) e do atendimento público (1,3 milhão).
Do ponto de vista etário, registra-se que a maior parte das ocupações para trabalhadores de salário base concentrou-se na faixa dos 25 aos 34 anos na década de 2000. No aspecto racial, por sua vez, constata-se a importância das ocupações de salário base geradas para os trabalhadores não brancos: quatro quintos dos postos de trabalho foram absorvidos por trabalhadores não brancos.
Precarização do trabalho
A industrialização tardia, e o intenso processo de urbanização do país, ambos assentados sobre a base de uma estrutura social caracterizada pela superexploração da força de trabalho, e por níveis abismais de concentração de renda e riqueza, não reverteram o padrão de concentração dos empregos na base da pirâmide social vinculado ao setor agropecuário e aos empregos autônomos.
Nestes segmentos, no ano de 2009, por exemplo, mais de 87% do total dos ocupados recebiam até 1,5 salário mínimo mensal. Havia 22,9 milhões trabalhadores autônomos em 2009, o que representou cerca de um quarto de todos os postos de trabalho. De cada três ocupações autônomas, duas oferecem salários de até 1,5 salário mínimo.
A precariedade que marca as relações de trabalho no país se expressa também no peso específico do trabalho temporário em relação ao conjunto dos empregos assalariados no Brasil. Em 2009, a cada dez assalariados, um tinha contrato de trabalho inferior a três meses de serviço na mesma empresa.
Outro aspecto da precariedade das relações de trabalho no Brasil refere-se ao elevado grau de rotatividade dos trabalhadores nas empresas. Entre 1999 e 2009, a taxa geral de rotatividade nos empregos formais passou de 33,5% para 36,9%, o que significou um aumento de 10,1%. O grau de intensidade da rotatividade sobe em sentido inverso ao da renda do trabalhador. Para os que ganham entre 0,5 e 1 salário mínimo mensal, a taxa de rotatividade foi de 85,3% em 2009, um aumento de 42,2% em relação ao ano de 199948.
No que toca à distribuição dos empregos assalariados por tamanho de empresa, observa-se em 2009 que os micros e pequenos negócios (até 49 empregados) respondiam por 15,3 milhões de assalariados, o que representava 37,2% do total de trabalhadores formais no país. Ou seja, mais de 60% dos assalariados formais estão em empresas com mais de 50 empregados, porcentagem que indica razoável índice de concentração por local de trabalho.
O trabalho terceirizado
O processo de terceirização do trabalho consiste numa importante característica do atual modelo de acumulação capitalista em nível internacional. No Brasil, a terceirização ganhou impulso a partir da década de 1990, anos de ofensiva neoliberal e reestruturação produtiva.
Quando analisamos as faixas salariais, observamos que os empregos terceirizados tendem a se concentrar na base da pirâmide social brasileira. O objetivo da burguesia com o implacável processo de terceirização consiste essencialmente em diminuir o custo do trabalho, barateando ainda mais os gastos com a mão de obra.
Segundo Marcio Pochmann, o número de trabalhadores terceirizados cresceu, entre 1985 e 1995, a uma média anual de 9%, enquanto as empresas contratantes aumentaram, em média, 22,5% ao ano. Já entre 1996 e 2010, o crescimento médio anual do emprego formal terceirizado foi de 13,1% ao ano. Em 2013, o país registrava 12,7 milhões de trabalhadores terceirizados. No Estado de São Paulo, em 2010, as mulheres ocupavam 46% dos empregos terceirizados formais, e os trabalhadores não brancos 40%. A taxa de rotatividade neste segmento da força de trabalho, em São Paulo, foi de 63,6% em 201049.
Segregação urbana e o proletariado
O processo de urbanização do Brasil foi bastante acentuado a partir da década de 1950, acompanhando a dinâmica de industrialização do país. Foi na segunda metade do século XX que o Brasil se converteu num país urbano, ou seja, mais de 50% de sua população passou a residir nas cidades. Dados do censo de 2010 apontam que 84% da população brasileira reside nas cidades.
O Brasil tem quase 20 cidades com um milhão ou mais de pessoas. Mas o peso proletário não se manifesta por igual. São Paulo e Rio permanecem desproporcionais. Segundo os dados divulgados pelo IBGE em 2016, a cidade de São Paulo continua sendo a mais populosa do país, com 12,0 milhões de habitantes, seguida pelo Rio de Janeiro (6,5 milhões de habitantes), Brasília e Salvador (aproximadamente 2,9 milhões de habitantes cada). Existem dezessete cidades brasileiras que possuem população superior a 1 milhão de pessoas, que somam 45,2 milhões de habitantes, número que representa 21,9% da população total do Brasil. Tendo em vista o peso econômico, social e político das grandes regiões metropolitanas do país, podemos afirmar que a revolução brasileira pode até não começar nas principais capitais, mas seguramente se decidirá nelas, em particular em São Paulo e Rio de Janeiro.
É necessário pensar, também, a atual dinâmica urbana e sua relação com os segmentos mais explorados e empobrecidos do proletariado50. Como sugere Ruy Braga, o déficit habitacional alimenta a espoliação dos rendimentos do trabalho51, de modo que os ganhos salariais (como ocorreu entre 2004 e 2014) foram em parte absorvidos pelo aumento dos aluguéis, gastos com financiamento de imóveis, etc. As contradições crescentes no meio urbano, que brotam incessantemente, em múltiplas dimensões da vida social do proletariado e das massas empobrecidas das cidades, passam cada vez mais a ocupar a cena política do país.
Em outras palavras, os conflitos e demandas urbanas representam um aspecto fundamental da vida social e política das grandes massas trabalhadoras urbanas. Não por acaso, a luta contra o aumento da tarifa do transporte (mobilidade urbana) serviu como gatilho para a eclosão das Jornadas de Junho.
Primeiras conclusões
A partir da interpretação dos dados objetivos descritos na seção anterior, queremos concluir, de modo sintético, elencando as principais características do proletariado brasileiro que identificamos neste estudo parcial. Listamos a seguir, sem ordem de importância: (1) o seu gigantismo, tamanho e potência; (2) o peso enorme (em muitas regiões, majoritário) dos negros e negras em sua composição; (3) a crescente feminização; (4) a imensa concentração em grandes metrópoles, que traz a tona a relevância das demandas urbanas; (5) a importância da juventude no seu interior; (6) as condições peculiares de superexploração; (7) a heterogeneidade interna; (8) o peso do semiproletariado e, em menor escala, do lumpen; (9) os índices, relativamente, baixos de sindicalização no setor privado; (10) pouca militância organizada, portanto, o grau frágil de organização política independente, (11) níveis rudimentares de escolarização, portanto, atraso cultural.
Estas condições materiais explicam, parcialmente, a imaturidade da expressão subjetiva de classe própria. Muito parcialmente, porque é impossível compreender a realidade da superexploração sem considerar, em primeiro lugar, o papel dos aparelhos burocráticos (políticos e sindicais), com variadas ideologias e programas, que atuam ao serviço da preservação da dominação capitalista.
1 Diversas teses sobre o suposto fim da classe operária e/ou a perda de centralidade do trabalho ganharam força nas ultimas décadas. Ver autores como: Daniel Bell, Habermas, Adam Schaff, Lojkine, Gorz, entre outros.
2 “A afirmação de que a classe trabalhadora possuía uma “missão histórica”, porém, não tinha, para Marx, o sentido de um fatalismo determinista. Daí o porquê de o proletariado ser o sujeito histórico potencial da transformação revolucionária socialista. Afinal, já no Manifesto Comunista (em 1848), Marx e Engels deixaram claro que não havia um resultado necessário para a luta de classes entre burgueses e proletários, pois historicamente os confrontos entre opressores e oprimidos acabaram marcados por “uma reconfiguração revolucionária de toda a sociedade ou pelo declínio comum das classes em luta.””. Marcelo Badaró, O sujeito histórico: notas introdutórias para o debate da esquerda socialista no Brasil. Disponível em: http://blogjunho.com.br/o-sujeito-historico-notas-introdutorias-para-o-debate-da-esquerda-socialista-no-brasil/
3 “Por proletariado (entende-se), a classe dos assalariados modernos que, não tendo meios próprios de produção, são obrigados a vender a sua força de trabalho para sobreviver”. Nota de F. Engels contida no Manifesto Comunista. Pg. 40. Editora Boitempo, 2007. Ver também a definição de Alex Callinicos: “Marx não identificou a classe trabalhadora com nenhum grupo particular de ocupações, como por exemplo, aquelas na indústria manufatureira: empregados domésticos são ‘parte da classe trabalhadora’, embora uma parcela improdutiva, no sentido de não criar mais-valia. Alinhado com o entendimento geral, relacional, de classe em Marx, o proletariado é melhor definido como: a) compelido, pela ausência de acesso aos meios de produção, a vender sua força de trabalho; b) o uso dessa força de trabalho no interior do processo de produção é submetido à supervisão e controle do capital e seus agentes. Por esse critério, a classe trabalhadora cresceu consideravelmente no presente século [o século XX].””. (Making History, Chicago, Haymarket, 2009 p. 218).
4 Ver: A. Giddens, A terceira via: reflexões sobre o impasse político atual e o futuro da socialdemocracia. (Rio de Janeiro, Record, 1999).
5 “A mudança social mais impressionante e de mais longo alcance da segunda metade deste século, e que nos isola para sempre do mundo do passado, é a morte do campesinato”. Pg. 283. A Era dos Extremos. Eric Hobaswm. Editora Companhia das Letras, 1994.
6 “A Terra urbanizou-se ainda mais depressa do que previra o Clube de Roma […]. Em 1950, havia 86 cidades o mundo com mais de 1 milhão de habitantes; hoje são 400, e em 2015 serão pelos menos 550. Com efeito, as cidades absorveram quase dois terços da explosão populacional global desde 1950 e hoje o crescimento é de 1 milhão de bebês e migrantes por semana. A força de trabalho urbana do mundo mais que dobrou desde 1980, e a população urbana atual de 3,2 bilhões de pessoas é maior do que a população total do mundo quando John F. Kennedy tomou posse”. Mike Davis, Planeta Favela (São Paulo, Boitempo, 2006, páginas 13-14).
7 O numero de assalariados, em torno de 3 bilhões entre proletários e semiproletários, constituí a maioria da população mundial. A própria restauração capitalista na China, Rússia e nos países do Leste, junto com a Índia, aportaram durante os anos 90, nada mais nada menos que 1,47 bilhão de novos operários ao mercado mundial. A força de trabalho colocada à disposição do capital, antes contada em torno de 1,46 bilhão, foi praticamente duplicada neste período. Ver: Freemann, Richard, “China, India and the doubling of the labor force: Who pays the price of globalization?”. The Globalist, 03/06/2005).
8 O proletariado industrial na China conta atualmente com aproximadamente 230 milhões de operários. “The total population of China has reached 1.35 billion. Of this, the economically active population was 785.79 million at the end of 2011. At that time, China’s workforce hit 764.2 million people, with 359.14 million employed in urban and 405 million in rural China. The number of migrant workers stood at 252.78 million, with an increase of 10.55 million from 2010. Among the migrant laborers, about 158.63 million worked outside of their home province. Regarding the sectors, primary industry accounted for 34.8 percent of total employment, while secondary industry represented 29.5 percent, and tertiary industry had a share of 35.7 percent”. Citação extraída em: https://www.statista.com/topics/1317/employment-in-china/.
9 Para dados e informações sobre a distribuição geográfica da produção manufatureira global, ver Marcio Pochann, O mito da grande classe média (São Paulo, Boitempo, 2014). Paginas 34-38.
10 Para maiores detalhes, ver Ricardo Antunes, Os sentidos do trabalho (São Paulo, Boitempo, 2009).
11 Para maiores detalhes, ver Ruy Braga, A política do precariado: do populismo à hegemonia lulista (São Paulo, Boitempo, 2012).
12 Para maiores detalhes, ver Waldo Mermelstein, que apresenta informações sobre o tema em “Sobre a definição marxista da classe operária…”. Disponível em: http://blog.esquerdaonline.com/?p=5882.
13 Para maiores detalhes, ver Ellen Wood, “Labor, The State, and Class Struggle”, Montly Reviem, Vol. 49/3, jul.-ago, 1997.
14 Para mais detalhes, ver Marcio Pochann, O mito da grande classe média (São Paulo, Boitempo, 2014).
15 Sobre a relação entre o trabalho em serviços e escritório com a lógica industrial, ver Harry Braverman, Trabalho e capital monopolista: A Degradação do Trabalho no Século XX (Rio de Janeiro, Zahar, 1981).
16 Para maiores detalhes, ver Ricardo Antunes, Os sentidos do trabalho (São Paulo, Boitempo, 2009).
17 Sobre os impactos político-sociais da restauração capitalista, ver Fábio José de Queiroz, Sete questões sobre a restauração capitalista no Leste Europeu. Disponível em: http://blog.esquerdaonline.com/?p=7830.
18 Para maiores detalhes sobre as características do desenvolvimento nos países atrasados, ver Michael Löwy, A teoria do desenvolvimento desigual e combinado. Disponível em: http://www.afoiceeomartelo.com.br/posfsa/Autores/Lowy,%20Michael/a%20teoria%20do%20desenvolvimento%20desigual%20e%20combinado.pdf.
19 Para mais detalhes, ver Francisco de Oliveira, Crítica à razão dualista/O ornitorrinco (São Paulo, Boitempo, 2003).
20 Relações sociais pré-capitalistas eram ainda comuns nos interiores do Brasil até os anos sessenta. No Nordeste, por exemplo, a palavra “cambão“ expressa o dia de trabalho que o foreiro dá ao patrão sem receber nada em troca.
21 Para mais detalhes, ver Ruy Braga, A política do precariado: do populismo à hegemonia lulista (São Paulo, Boitempo, 2012).
22 Para maiores detalhes, ver C. Furtado, Formação econômica do Brasil (São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1977); C. Prado Júnior, História econômica do Brasil (22. Ed., São Paulo, Brasiliense, 1979); F. de Oliveira, Crítica à razão dualista/O ornitorrinco (São Paulo, Boitempo, 2003).
23 Os empregos gerados na primeira década do século XXI se concentraram especialmente na base da pirâmide social: 95% das vagas abertas eram de remuneração mensal de até 1,5 salário mínimo, o que representou saldo líquido de dois milhões de empregos novos por ano. Este processo levou a que, na década de 2000, a parcela dos ocupados com até 1 salário mínimo e meio voltasse a crescer, chegando a quase 59% de todos os postos de trabalho. Para mais detalhes, ver dados citados por Marcio Pochmann, Nova Classe média? O Trabalho na base da pirâmide social brasileira (São Paulo, Boitempo, 2012).
24 Até a década de 1850, o trabalho escravo não era predominante apenas nos grandes latifúndios exportadores, mas também nas principais cidades do país. Os braços escravizados garantiam o funcionamento dos portos, transporte, comércio e até mesmo das primeiras fábricas. Desse modo, a corajosa luta do povo negro pela liberdade, muitas vezes apoiada por trabalhadores livres que se opunham à escravidão, marcou o primeiro momento do surgimento da classe trabalhadora brasileira, deixando assim valiosas experiências de resistência e revolta contra a exploração e a opressão. Para maiores detalhes ver: Marcelo Badaró, Trabalhadores e sindicatos no Brasil (São Paulo, Expressão Popular, 2008).
25 “Camponeses com pouca terra, ou trabalhadores urbanos por conta própria, os camelôs, prestadores de serviços variados, os subempregados e outros integram-se ao capitalismo brasileiro apenas como assalariados eventuais, como vendedores ocasionais e autônomos de mercadorias eventualmente produzidas pelas empresas capitalistas ou, no limite, apenas como consumidores. Estão na margem do sistema. O modelo capitalista neoliberal e dependente fez crescer a massa de trabalhadores marginal”. Armando Boito Jr. em Os trabalhadores da massa marginal e o golpe do impeachment. Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2017/01/20/os-trabalhadores-da-massa-marginal-e-o-golpe-do-impeachment/. Consulta em 09/03/2017.
26 Sobre o ‘exército industrial de reserva’ (proletariado excedente) e o desenvolvimento do modo de produção capitalista, explica K Marx: “Daí segue que, quanto mais o modo de produção capitalista se desenvolve, uma quantidade cada vez maior de capital se torna necessária para empregar a mesma força de trabalho, e ainda maior para uma força de trabalho crescente. A força produtiva crescente de trabalho gera, portanto, na base capitalista, necessariamente uma superpopulação trabalhadora permanente e aparente”. MARX, K. O Capital: crítica da economia política. Livro III, volume I. 2. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1985-1986, pag. 171.
27 Alguns autores, como André Singer, preferem denominar essa camada social de ‘subproletariado’. Para mais detalhes, ver André Singer, Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador (São Paulo, Boitempo, 2012).
28 Em 2009, 69% dos trabalhadores autônomos, por exemplo, recebiam até 1,5 salário mínimo mensal, parcela mais ou menos semelhante das três décadas anteriores. Para mais detalhes, ver dados citados por Marcio Pochmann, Nova Classe média? O Trabalho na base da pirâmide social brasileira (São Paulo, Boitempo, 2012).
29 Para mais detalhes, ver dados citados por Marcio Pochmann, Nova Classe média? O Trabalho na base da pirâmide social brasileira (São Paulo, Boitempo, 2012).
30 Para mais detalhes, ver Francisco de Oliveira, Crítica à razão dualista/O ornitorrinco (São Paulo, Boitempo, 2003).
31 Em 2009, o Brasil registrou a maior participação do emprego formal no total da ocupação de salário de base dos últimos quarenta anos. Nas últimas décadas, observa-se uma trajetória de queda relativa considerável do ‘semiproletariado’ quando comparamos com a proporção adquirida pelos assalariados formais. Para maiores detalhes, ver PNAD 2014 completa.
32 Para maiores detalhes sobre a relação contemporânea entre o espaço urbano e a acumulação por espoliação, ver David Harvey, O novo imperialismo. Disponível em: http://www.geografia.fflch.usp.br/graduacao/apoio/Apoio/Apoio_Gloria/2016/1s/HARVEY-O_novo_imperialismo.pdf.
33 Sobre a relevância do PCC nas periferias e no sistema prisional do estado de SP, ver Gabriel de Santis Feltran, Governo que produz crime, crime que produz governo: o dispositivo de gestão do homicídio em São Paulo (1992 – 2011). Disponível em: http://www.diagramaeditorial.com.br/namargem/wp-content/uploads/2014/02/feltran-04.pdf.
34 A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) é feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em uma amostra de domicílios brasileiros. A pesquisa é feita em todas as regiões do Brasil. Para maiores detalhes ver PNAD 2014 completa, disponível em: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv94935.pdf.
35 Segundo o IBGE, se entende como população ocupada as pessoas que tinham trabalho durante todo ou parte do período da pesquisa. Incluem-se, ainda, como ocupadas as pessoas que não exerceram o trabalho remunerado que tinham na semana de referência por motivo de férias, licença, greve etc. Por sua vez, compreende-se a como população desocupada as pessoas sem trabalho que tomaram alguma providência efetiva de procura de trabalho nesse período. As pessoas desempregadas que não estiveram à procura de trabalho no período compõem a população economicamente não ativa. A soma das pessoas ocupadas e desocupadas forma o total da população economicamente ativa. Em 2014, a população em idade ativa (entre 16 e 64 anos) foi estimada em 159,2 milhões de pessoas. Nesse universo, cerca de 105,9 milhões, ou 66,5%, compunham a população economicamente ativa do País. Enquanto a população não economicamente ativa totalizava 53,4 milhões de pessoas, ou 33,5%: são, fundamentalmente, os estudantes, as donas de casa, os doentes inaptos para o trabalho e os idosos. Em 2014, a população residente no Brasil na data de referência da pesquisa foi estimada em 203,2 milhões de pessoas.
36 Considera-se, segundo o IBGE, “demais ocupações”: trabalhadores não remunerados; trabalhadores na produção para o próprio consumo; e trabalhadores na construção para o próprio uso.
37 Os trabalhadores por conta própria, aqueles que trabalham explorando o seu próprio empreendimento, sozinhos ou com sócio, sem ter empregado pago, situam-se na fronteira de classe entre o proletariado e a pequena burguesia proprietária; por consequência, compartilham de um estatuto ambíguo. Em 2014, do contingente total trabalhadores por conta própria, aproximadamente apenas 4,0 milhões (19,0%) trabalhavam em empreendimentos registrados no CNPJ; de modo que sua condição de vida se assemelha, usualmente, a dos trabalhadores assalariados mais empobrecidos. Podemos considera-los como parte “das classes trabalhadoras” em sentido amplo. A rigor, os trabalhadores por conta própria, entre outros, conformam um segmento específico que podemos denominar como ‘semiproletariado’.
38 Importante ressaltar que nem todos assalariados são parte da classe trabalhadora. É necessário excluir do proletariado os assalariados com altos salários que ocupam funções de gestão e administração de empresas (gerentes, executivos, diretores, etc.), os quais formam a moderna classe média – note-se que, em alguns casos, são burgueses, como muitos executivos assalariados de grandes corporações. Sobre a exclusão de setores assalariados do proletariado, explica E. Mandel: “a característica estrutural definidora do proletariado na análise de Marx do capitalismo é a necessidade socioeconômica de vender sua força de trabalho. Dentro do proletariado, portanto, não há apenas trabalhadores manuais industriais, mas todos trabalhadores não produtivos que estão sujeitos aos mesmos limites fundamentais: não ter propriedade sobre os meios de produção, ausência de meios diretos à subsistência (o acesso à terra de forma alguma é livre!), falta de dinheiro para sua sobrevivência sem a venda mais ou menos continua de sua força de trabalho. Portanto, todos do estrato social cujo nível de salário permite acumulação de capital adicional a um nível “normal” de vida deve ser excluído do proletariado.”. (Introdução. In Marx, K. Capital, volume 2. Penguin Books, London, 1976, PAG. 46).
39 Este indicador não retrata o conjunto da classe média proprietária e da burguesia, bem como não afere o peso da classe média assalariada (que fica de fora desta categoria), apenas expressa o contingente da pequena burguesia proprietária e da burguesia que tem empresas com empregados assalariados. Por exemplo, parte das camadas proprietárias que vivem da renda de alugueis, investimentos financeiros, etc. não está representada adequadamente por esse indicador.
40 Para mais informações, ver Marcio Pochmann, Nova Classe Média? (São Paulo, Boitempo, 2012).
41 Gráfico extraído e disponível em: http://www.dmtemdebate.com.br/tendencias-recentes-do-associativismo-sindical-no-brasil-uma-perspectiva-setorial/
42 Para maiores detalhes sobre o tema, ver nota técnica do IPEA, Mulheres e trabalho: breve análise do período 2004-2014. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/nota_tecnica/160309_nt_24_mulher_trabalho_marco_2016.pdf.
43 Idem.
44 Ver Marcelo Badaró, O sujeito histórico: notas introdutórias para o debate da esquerda socialista no Brasil. Disponível em: http://blogjunho.com.br/o-sujeito-historico-notas-introdutorias-para-o-debate-da-esquerda-socialista-no-brasil/
45 Idem.
46 Ver PNAD 2014.
47 A análise e dados contidos neste intertítulo, ‘Padrão de exploração’, baseiam-se fundamentalmente no estudo de Marcio Pochmann, Nova Classe Média? (São Paulo, Boitempo, 2012).
48 Para maiores detalhes, ver Marcio Pochmann, Nova Classe Média? (São Paulo, Boitempo, 2012).
49 Para maiores detalhes, ver Marcio Pochmann, Nova Classe Média? (São Paulo, Boitempo, 2012).
50 Para maiores detalhes, ver Ruy Braga, Terra em transe, no livro As contradições do lulismo (São Paulo, Boitempo, 2016).
51 “De fato, segundo a Fundação João Pinheiro, responsável pela organização e pela divulgação das pesquisas oficiais sobre o déficit habitacional, entre 2007 e 2012 o número de pessoas que sofrem com gasto excessivo com aluguel subiu 35,3%, chegando a 2,66 milhões de famílias. Entre 2011 e 2012, o déficit habitacional nas metrópoles brasileiras subiu 10%, alavancado pelo aumento dos aluguéis. Apenas a cidade de São Paulo apresenta um déficit habitacional de mais de 700 mil famílias; cerca de 1,3 milhão de pessoas vivendo em favelas; e outras 2,5 milhões que moram em loteamentos irregulares.” Páginas 83-84. Ruy Braga, Terra em transe, no livro As contradições do lulismo (São Paulo, Boitempo, 2016).
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