Está para ser votado no dia de hoje, numa comissão especial da Câmara dos Deputados, o substitutivo do projeto Escola Sem Partido, PL 7180/14. Esse projeto foi uma junção de outros oito projetos sobre o tema que estavam tramitando ao mesmo tempo. O deputado Flavinho, do PCS, resolveu colocar tudo em um único projeto, sendo criada uma comissão especial para avaliar e deliberar sobre ele.
Tal comissão especial está dominada pela bancada fundamentalista. O próprio Flavinho (PSC) pertence ao grupo católico chamado Canção Nova, um dos grupos mais conservadores dentro da Igreja. Foi ele quem afirmou no plenário da Câmara que “mulher não precisa de empoderamento, precisa ser cuidada e amada”; para ele, as feministas seriam “mal amadas”. Esse grupo defende uma visão medieval de submissão das mulheres, de família e de moral. É um grupo totalmente preconceituoso contra qualquer orientação sexual que não seja a heterossexual; e família para eles é somente com pai, mãe e filhos.
Essa ideologia reacionária, preconceituosa e discriminatória é a que predomina na comissão especial. O grande absurdo é que meia dúzia de deputados dessa comissão pode decidir alterar a LDB e enviar o projeto diretamente para o Senado, sem precisar passar pelo plenário da Câmara dos Deputados, um verdadeiro golpe!
O projeto denominado “Escola Sem Partido”, criado por Miguel Nagib em 2004 e apresentado pela primeira vez em uma casa legislativa por Flávio Bolsonaro em 2014, representa um imenso retrocesso em todos os terrenos. O projeto tem como objetivo impedir a construção de uma escola democrática, com debates políticos, com respeito à pluralidade, com respeito à diversidade, com respeito aos direitos dos educadores de educar com liberdade e dos estudantes de terem acesso ao conhecimento científico e a uma educação libertadora e emancipadora. O nome do projeto é uma farsa para confundir as pessoas. Não tem nada a ver com impedir a partidarização das escolas, como tenta parecer. Trata-se de tirar da escola e da educação o pensamento crítico e o envolvimento político, ambos pressupostos importantes para a formação de cidadãos.
Vou dar dois exemplos práticos de como a aprovação desse projeto seria nefasta. Sou professora da rede municipal de São Paulo e nossa categoria fez uma greve de 20 dias contra o projeto da Reforma da Previdência do prefeito Doria (PSDB). Durante a greve, mobilizamos a comunidade escolar, pais e estudantes para apoiar a luta. Houve, inclusive, passeatas dos pais com seus filhos. Pelo projeto Escola sem Partido, isso seria proibido, pois, em um de seus artigos, diz que os professores não podem incentivar que os estudantes participem de manifestações. Outro exemplo: na minha escola, os próprios estudantes das turmas de 9° ano decidiram que o trabalho autoral de final de curso seria sobre o tema “Diversidade Sexual”. Pelo projeto, qualquer conteúdo abordando gênero ou orientação sexual estaria proibido dentro das escolas, ou seja, a própria vontade dos estudantes não seria respeitada.
Os deputados da comissão especial estão aproveitando o início do recesso escolar para tentarem aprovar o projeto, momento em que educadores e estudantes estão de férias e ficam com o poder de mobilização reduzido.
É importante relacionar o Escola Sem Partido com o momento político que estamos vivendo no Brasil. O projeto ganha adeptos e força para ser aprovado em alguns municípios na esteira do crescimento do discurso conservador, do crescimento da popularidade de figuras como Jair Bolsonaro, dentro de um cenário de golpe parlamentar e da imposição de uma agenda de imensos retrocessos econômicos, políticos e sociais.
Eles sabem que os profissionais da educação têm sido linha de frente na resistência contra todos esses retrocessos, inclusive sendo ponto de apoio importante para as lutas estudantis, como foi o caso das escolas ocupadas contra a reorganização do ensino em São Paulo e da luta contra a PEC do fim do mundo.
Querem amordaçar os educadores para implementar uma agenda ainda mais excludente e nefasta para a maioria do povo brasileiro. Não podem nos calar. Nossa voz tem história e poder transformador. Resistiremos até o fim contra a “Escola da Mordaça”!
*Silvia Ferraro é professora e pré-candidata do PSOL ao Senado por São Paulo
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