Por: Evandro J. Castagna, de Curitiba, PR
Golpe e direitização do Judiciário
No Superior Tribunal Federal (STF), temos 11 senhores (as) não eleitos por ninguém e que hoje mandam no País. O golpe de 31 de agosto de 2016 foi aplicado com apoio da mídia, do judiciário e do parlamento. A Lava Jato foi seletiva em seu objetivo maior de apoiar e dar prosseguimento ao golpe, utilizando-se de mecanismos autoritários para isso, tais como a Teoria do Domínio do Fato, Delações Premiadas, Depoimentos Coercitivos, vazamento de gravações seletivas, condenação e ameaça de prisão sem provas.
É nesse marco que entendemos a condenação e possível prisão de Lula, 1º colocado em todas as pesquisas eleitorais que o apontam como eleito no segundo turno na disputa com qualquer pré-candidato. Além disso, Lula é a principal figura pública da esquerda do país, embora uma esquerda que tenha como direção uma maioria que se apoia num método de luta institucionalizado e um programa nos marcos da conciliação com partidos de direita.
A crise econômica mundial segue. Não faz sentido para a direita golpista que o PT volte ao governo dois anos após ser expulso pelo golpe. Ela não contava com a recomposição eleitoral do PT e de Lula um ano após o impeachment. Em certo sentido, o golpe não atingiu todos os seus objetivos e, por isso, precisa ser aprofundado. É nesse marco que a Lava Jato, com apoio da alta cúpula do judiciário, tenta desesperadamente impedir a candidatura de Lula e desmoralizar seus possíveis substitutos (Fernando Haddad e Jaques Wagner). Um outro movimento parecido tem origem na direita golpista representada por Michel Temer, que impulsiona um processo de militarização do governo.
Militarização do Governo
Apesar de ter aprovado as Reformas do Ensino Médio e Trabalhista, a PEC do Teto e a Lei das Terceirizações, Michel Temer (MDB) não ficou contente com a derrota em relação à aprovação da Reforma da Previdência. Na mesma semana de sua derrota, aprofundou o processo de militarização do governo através da Intervenção na Segurança Pública do Rio de Janeiro com o General Walter Souza Braga Netto, criação do Ministério Extraordinário de Segurança Pública. Deslocou Raul Jungmann, homem de confiança da cúpula das FFAA, para dirigir a Secretaria Nacional de Segurança Pública. Jungmann deixou, em seu lugar, no Ministério da Defesa, o General Gal Joaquim Luna e Silva.
Michel Temer já havia colocado na chefia de seu gabinete da Casa Civil o General Roberto Severo Ramos; na direção da FUNAI o General Franklimberg Ribeiro de Freitas e, recentemente, na ABIN, o General Sérgio Westphalen Etchegoyen, que fez elogios a feitos da ditadura militar em outubro de 2017 e disse que o país sofre de amoralidade e patrulha do “politicamente correto”. Frases estas comumente utilizadas pela extrema-direita no País.
Temer também alterou a legislação (Lei 13.491/2017) para que os militares sejam julgados em tribunais militares por crimes praticados durante operações de rua, que antes seriam julgados pela justiça comum.
Nuances deste processo de militarização já apareciam nos primeiros momentos do golpe através do Projeto “Escola sem Partido”, que tinha e tem como objetivo instaurar o medo, a censura e criminalização de educadores. Como se não bastasse, já é noticiada, nos veículos de comunicação, a possibilidade da volta da disciplina da época da ditadura de Educação Moral e Cívica nas escolas.
Somado a tudo isso, diante do descrédito de um setor da classe média e de trabalhadores nas instituições democráticas, o candidato da extrema-direita Jair Bolsonaro, que expressa um setor neofascista das FFAA e da sociedade civil, ganha peso eleitoral de massas. Esse setor social empoderou-se com o golpe a ponto de atacar, recentemente, com capangas armados, a caravana de Lula no Rio Grande do Sul, fato que precisamos todos abominar.
A execução de Marielle e Anderson
No dia 28 de fevereiro, a vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco (PSOL), destacada na luta contra a intervenção, foi nomeada relatora da comissão que a fiscalizaria no estado. Em 10 de março, Marielle denunciou a violência policial em Acari, afirmando que a intervenção empoderou as milícias. Em 14 de março, Marielle é executada a tiros, assassinato realizado por profissionais, com munições que pertenciam à Polícia Federal de Brasília. O chefe da Secretaria Nacional de Segurança Pública, Raul Jungmann, disse que as munições teriam sido roubadas nos Correios da Paraíba, informação desmentida logo depois.
Um fato curioso é que, em 2008, a família Bolsonaro, que tem amplo apoio popular no RJ, foi contra a CPI das Milícias encampada no estado por Marcelo Freixo (PSOL/RJ), na Assembleia Legislativa. Esta CPI foi um marco na luta contra o crime organizado e sua articulação com o poder público. O relatório final pediu o indiciamento de 225 políticos, policiais, agentes penitenciários, bombeiros e civis. Ficou comprovada a relação entre instituições do estado e o crime organizado.
Pudemos perceber nas redes sociais que os seguidores de Bolsonaro foram os que mais impulsionaram calúnias sobre Marielle. E, recentemente, uma investigação feita pelo Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic), da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), mostrou que o MBL ajudou a impulsionar as notícias falsas contra a vereadora Marielle Franco.
Muito suspeito também foi a postura do indicado de Michel Temer na Empresa Brasil de Comunicações – EBC, Laerte Rímoli, que orientou censura sobre o caso Marielle em uma empresa pública, vinculada ao Governo Federal.
Para finalizar, não podemos deixar de mencionar o nefasto Pastor Feliciano (PSC), importante líder religioso do País, que participou de um programa popular de rádio logo após a morte de Marielle, no qual afirmou em rede nacional que “esquerdista demora para morrer porque bala não acha o cérebro”. A temática do programa era exatamente a morte de Marielle.
Golpe
O golpe não acabou em 31 de agosto de 2016, ele segue firme em seus propósitos e precisa ser combatido por todas as forças sociais progressivas do País.
A conclusão que se chega é que todos estes elementos apresentados acima, ou seja, a direitização do judiciário, condenação e possibilidade de prisão de Lula, militarização do governo, execução de Marielle e Anderson, a violência e difamação contra Marielle e às organizações de esquerda por parte de setores machistas, racistas, homofóbicos, militaristas e autoritários, de seguidores de Bolsonaro e MBL, de um setor fundamentalista e charlatão ligado a parte das igrejas pentecostais no País, representadas pelo Pastor Marco Feliciano, tudo isso são elementos da mesma conjuntura de aprofundamento do golpe.
Portanto, é urgente que os sindicatos e centrais, as federações e confederações, os movimentos sociais do campo, da cidade, da juventude, da luta contra as opressões e os partidos políticos que representam a classe trabalhadora construam a mais ampla unidade para impedir o avanço do golpe que leva o nosso País para o caminho do retrocesso, das trevas e da barbárie, do endurecimento do regime e das restrições às liberdades democráticas.
Uma grande frente social de resistência é necessária para inverter essa correlação de forças. Não há tempo a perder.
*Esse artigo reflete a opinião do autor, e, não necessariamente, a linha editorial do Esquerda Online.
Foto: Ricardo Stuckert
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