Por: Lucas Fogaça, de Porto Alegre, RS
Há muitos trabalhadores e estudantes que pensam em apoiar Ciro Gomes para a Presidência da República em 2018. Muitos petistas sonham com ele ser vice numa eventual chapa com Lula. Outros tantos, mais sensíveis com as denúncias de corrupção sobre Lula e o PT, ou mesmo desiludidos com eles no governo, imaginam Ciro como o melhor candidato para enfrentar Dória (PSDB) e Bolsonaro (PEN).
Ciro Gomes é vice-presidente nacional do Partido Democrático Trabalhista (PDT). Ele é membro da direção central deste partido, fala e responde por ele, portanto. E o PDT não é flor que se cheire. Quero levantar algumas informações e ideias para estimular a reflexão entre os apoiadores de Ciro Gomes e do seu partido, o PDT.
“Nacionalismo Burguês” fora de época
Ciro Gomes e algumas alas do PDT dizem defender um projeto de soberania nacional e proteção do saque das riquezas naturais por estrangeiros. Neste momento histórico, o capitalismo está em crise em quase todo o globo e a economia mundial ainda não se recuperou do estouro da bolha de especulação imobiliária nos EUA em 2007/08. Desde os últimos anos, o imperialismo (sobretudo norte-americano) deseja impor uma nova onda de recolonização sobre a América Latina. Querem abocanhar fatias cada vez maiores do petróleo e outras riquezas naturais, como as mineradoras canadenses que miravam uma reserva mineral na Amazônia, que Temer estava disposto a entregar. E também pretendem impor um novo patamar de exploração para a classe trabalhadora brasileira através da reforma trabalhista, previdenciária, terceirização e a PEC 55 (do teto dos gastos).
O imperialismo age associadamente com a esmagadora maioria da classe dominante brasileira. A burguesia brasileira, covarde e submissa, quer entregar tudo para os gringos às custas de destruir o país e massacrar o proletariado. Ciro Gomes e o PDT ensaiam representar uma ínfima parcela da burguesia nacional que sonha em resistir. Pretendem salvar o capitalismo brasileiro se livrando um pouco da coleira que o imperialismo esmaga o pescoço da burguesia nacional, sem se livrar das botas que o imperialismo e a burguesia nacional esmagam o proletariado.
Projetos como esse já existiram na história. Ciro Gomes e o PDT sonham em reeditar projetos como o de João Goulart e Leonel Brizola no Brasil, Perón na Argentina e Nasser no Egito. Mas como é algo completamente fora de época, este sonho é apenas uma sombra dos nacionalistas burgueses daquela luta por libertação nacional. Hoje há muito menos gente da burguesia querendo correr esse risco do que naquela época, que já não tinha tanta gente assim, aliás. E os que há são ultra marginais na classe dominante.
Algumas das críticas levantadas por Ciro Gomes e o PDT são parte do programa da esquerda marxista também: ele critica o sistema tributário porque além de complexo, o rico paga pouco e o pobre paga muito. Critica as enormes somas de remessas de lucros ao exterior e sistema da dívida pública. A privatização de empresas estatais aos gringos, a entrega das riquezas nacionais aos empresários estrangeiros, entre outras críticas. Ao menos em palavras ele defende propostas que a esquerda defende. Mas sobre estas mesmas tarefas, nós temos uma diferença gigante: quem cumpre essas tarefas? Qual classe social?
A burguesia como classe poderia ter o interesse de se libertar do esmagamento imperialista para melhor alavancar os negócios. Mas a fração submissa da burguesia venceu a fração que queria resistir e decidiu os rumos da classe dominante brasileira quando do golpe militar de 64. E hoje as diferentes alas da burguesia nacional estão completamente comprometidas com a sociedade submissa ao imperialismo. Alguns pequenos setores são prejudicados com a atual tentativa de recolonização, mas não se arriscam pois essa luta pode abrir espaço para os de baixo atacando o patrão estrangeiro atacar também o patrão local. Só a classe trabalhadora não tem o que perder e tem interesse de classe em conduzir a luta por libertação nacional até as últimas consequências.
O discurso e a prática do PDT
O PDT discursa contra o “entreguismo”, mas no parlamento votou a favor dos projetos que beneficiam os banqueiros internacionais e o imperialismo. E muitos votaram a favor do impeachmeant de Dilma.
Em abril de 2015, na votação do projeto de lei da terceirização, 8 dos 18 deputados votaram a favor. Entre eles, o líder do partido André Figueiredo (CE). Na votação da terceirização de março de 2017, um dos 17 deputados votaram a favor (um dos deputados saiu do PDT).
O partido se posicionou oficialmente contra o processo de impeachment de Dilma Rousseff, mas na votação da Câmara dos Deputados do Brasil, seis deputados votaram favoráveis e um se absteve. No Senado, todos três senadores do PDT votaram a favor do impeachment.
Os mesmos três senadores votaram a favor da PEC 55 – que limita os investimentos públicos em saúde, educação e moradia em 20 anos. E seis deputados de 17 votaram a favor.
Na votação da reforma trabalhista, Carlos Eduardo Cadoca (PE) votou a favor e o senador Acir Gurgacz (RO) se ausentou da votação. Acir Gurgacz ainda votou para preservar o mandato de Aécio Neves em julho deste ano.
Alguns pedetistas e petistas argumentam que o PDT expulsou os parlamentares que foram favoráveis ao golpe parlamentar e os demais ataques da reforma trabalhista, terceirização, etc. Mas sejamos razoáveis: qualquer ativista ou pessoa minimamente interessada em política sabia que Lasier Martins (senador no RS pelo PDT) é inimigo do povo. Passou décadas destilando ódio aos movimentos sociais e defendendo os patrões como comentarista da RBS – afiliada da Rede Globo no Rio Grande do Sul. Foi, aliás, símbolo da luta em defesa das inúmeras isenções à montadora de veículos Ford quando ela especulava vir para o Rio Grande do Sul ou para a Bahia. Só pra dar um exemplo. E depois, justiça seja feita, parlamentares como o senador Acir Gurgacz (RO) e Carlos Eduardo Cadoca (PE) seguem agindo contra os trabalhadores no Congresso, sob o silêncio da direção do PDT e de Ciro Gomes.
Além da intervenção no parlamento, as relações internacionais também dizem muito de um partido político. E aqui mais uma vez o PDT faz um discurso contrário às suas ações. O Partido Democrático Trabalhista é vinculado à II Internacional Socialista, um fórum internacional de partidos. Hoje a Internacional Socialista é presidida pelo ex-primeiro-ministro da Grécia George Papandreou. Poucos líderes políticos são tão comprometidos com os planos de austeridade e ataques aos trabalhadores pós crise econômica de 2007/8 como ele: após ser eleito como primeiro ministro em 2009, descarregou um gigantesco “ajuste fiscal” contra o povo. E mesmo assim, Ciro e o PDT não se importam de seguir nesse grupo internacional liderado por ele. Ou sequer o criticam publicamente mesmo após esse vexame pra quem se diz “social democrata”.
Os governos do PDT
O partido elegeu 335 prefeitos nas eleições de 2016. Elegeu inclusive 2 prefeitos de capitais: Edivaldo Holanda Júnior (São Luís) e Roberto Claudio (Fortaleza). E o PDT, hoje, governa o estado do Amapá. Governava também o Mato Grosso, mas Pedro Taques saiu do PDT para ingressar no PSDB.
Waldez Góes (PDT), governador do Amapá, vem parcelando os salários dos servidores públicos, exatamente como fazem todos os partidos da ordem. Os trabalhadores reclamam do caos na rede pública de saúde, mas os grandes salários e benefícios aos políticos e juízes, e o pagamento dos juros aos agiotas e as regalias às grandes empresas seguem em dia. Seu secretário de planejamento Antônio Teles Júnior inclusive comemorou a vitória do não afastamento de Temer no
Congresso, pois isso ajudaria a implementar as reformas, em especial a da previdência.
Roberto Claudio, prefeito de Fortaleza com vice do DEM, por sua vez, promoveu o maior aumento nas passagens de ônibus em 14 anos. E ainda privatizou os terminais de integração.
A pesquisa sobre os atuais governos do PDT nos levaria a um número sem fim de críticas e denúncias. Paramos por aqui, ou então deveríamos fazer não um artigo, mas uma tese de doutorado sobre privatização, ajuste fiscal, favorecimento aos empresários e ataque aos trabalhadores. São posturas incompatíveis com o discurso de Ciro Gomes e da direção nacional do PDT. Mas, ao mesmo tempo, não vemos uma crítica sequer de Ciro Gomes a esses indefensáveis governos. Ciro pinta de valente para criticar os adversários, mas está sendo bem manso com os aliados.
Ciro Gomes: mão de ferro contra os trabalhadores em greve
Ciro Gomes discursa em defesa da democracia e do Estado de Direito. Mas, em 1993, quando foi governador do Ceará, enfrentou uma poderosa greve dos trabalhadores do SEPROCE (Serviço de processamento de Dados do Ceará). Em entrevista ao Programa Roda Viva, disse que era necessário “agir com mão de ferro” contra os trabalhadores: “Liguei para o presidente do Seproce, que é um técnico conhecido no meio, perguntei a ele o que estava acontecendo e ele me disse que não, que estava tudo sob controle, que estava agindo de maneira a garantir. E eu disse a ele que agisse com mão de ferro – isso é o que eu penso que deve ser feito. Eu não aceito… Eu não disse que era anarquista, até porque não vi nada demais; o que eu acho é que instalar anarquia no Ceará ninguém vai fazer. Isso é o que eu estou dizendo. O que eu considero anarquia? É quebrar a possibilidade, por uma razão corporativa… Podem lá desejar melhores salários, isso é justo, é honesto, é procedente, mas usar para essa razão um poder que não é deles, de paralisar o estado inteiro porque controlam as máquinas de informática e impedir que todos os seus colegas recebam seus salários, isso não vou admitir absolutamente nunca”.
Se como governador Ciro Gomes teve essa postura de repressão aos movimentos sócias e descumprimento do direito constitucional de greve, o que nos autorizaria pensar que como presidente ele faria diferente?
O PDT é o sétimo partido político de Ciro Gomes
PDT (2015 – presente), PROS (2013 – 2015), PSB (2005 – 2013), PPS (1996 – 2005), PSDB (1988 – 1996), PMDB (1983 – 1988) e PDS (1980 – 1983). Estava no PDS, herdeiro do regime militar, mesmo quando já havia o PDT, o PTB e mesmo o PT. Foi do PMDB quando Sarney era presidente do Brasil. Foi do PSDB no auge do neoliberalismo da era FHC. Estava no PPS quando este criticava o Fora FHC levantado por movimentos sociais, artistas e intelectuais. E foi do PSB quando este chegou a governar seis estados brasileiros, reprimindo os protestos de junho de 2013, preservando o ritmo de privatizações, benefícios fiscais às multinacionais e início de ajuste fiscal aos trabalhadores pós crise de 2007/8.
Ciro Gomes esteve em partidos que nos momentos decisivos se colocaram contra os trabalhadores e o povo, tal como nas históricas votações antipopulares do PDT dos últimos anos. Ele esteve, aliás, na maioria das vezes cumprindo um papel de porta voz dessas organizações políticas. Falando e respondendo por elas. É ingênuo pensar que, em quase quatro décadas de atividade política, Ciro Gomes não sabe escolher seus aliados.
Os trabalhadores e estudantes precisam tomar lado. A maioria odeia Temer e a quadrilha do PMDB. E estão frontalmente contra as reformas trabalhista e previdenciária, a PEC 55 e a terceirização. Alguns ainda procuram alternativas. Ciro Gomes e o PDT te representam?
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