Por: Gibran Jordão
“Afinal de contas, era regra no capitalismo do século XX que todos deviam enganar os outros, e o que enganasse mais, definitivamente, ganhava o jogo. Nessa lógica, eu era o campeão mundial invencível.” (O Lobo De Wall Street, Jordan Belfort)
O imperialismo se desenvolveu nos últimos anos, ganhou terreno no Leste Europeu com o fim da União Soviética, avançou sobre a periferia do planeta, e a engenharia administrativa empreendedora e moderna do mundo dos negócios tem encontrado métodos sofisticados para avançar com o processo de recolonização da América Latina e, consequentemente, do Brasil.
A democracia burguesa no Brasil sofre intervenção direta das grandes Holdings que comandam grandes empresas e bancos, financiam campanhas, tem influência significativa no Congresso Nacional, fazem negócio com as grandes igrejas, sustentam financeiramente a grande mídia e comandam hoje o Ministério da Fazenda.
Há uma crise econômica no mundo e os grandes monopólios se movimentam para aumentar a mais valia e ampliar seu controle sobre as estruturas de decisão do regime para fazer tudo funcionar a favor de seus interesses financeiros. Operam, portanto, um poderoso ajuste fiscal no país para saquear direitos, benefícios, serviços sociais, recursos naturais e, se preciso for, recrudescer gradualmente as liberdades democráticas para concentrar também o poder.
Holdings e a influência nas decisões políticas
As grandes Holdings são verdadeiras associações de várias empresas comandadas por uma administração central de algumas famílias que detêm a maioria das ações destas empresas. Administrando vários produtos de diferentes ramos, influenciam seus preços, eliminam a livre concorrência, controlam o tempo e tudo que milhões de pessoas vão comer, comprar, vestir, ver e acreditar em cada canto do globo. As Holdings são uma forma organizacional dos grandes monopólios que atua em conjunto com os cartéis e trustes, mas com um alcance mais amplo no controle das estruturas de decisão do estado.
A bancada evangélica do Congresso Nacional, por exemplo, na verdade são representantes de Holdings que até mesmo as grandes igrejas fazem parte. O PRB é um partido controlado pela Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). Ao mesmo tempo, essa mesma instituição religiosa é acionista da Rede Record e, recentemente, do Banco Renner. O público que assiste a Record e que é influenciado pela IURD é o mesmo publico alvo para os negócios do Banco Renner, bem como de todas as empresas anunciantes e que sustentam financeiramente a Rede Record.
A IURD e a Rede Record associadas ao sistema financeiro influenciam parte importante do Congresso Nacional, tornando – se uma força política de peso no país. Trata-se de uma das frações da burguesia brasileira que é sócia do imperialismo, e que operam decisivamente para que as decisões políticas do país sejam tomadas a favor de seus negócios.
A notícia abaixo do site do PRB, logo após as eleições de 2014, expressa como avança o poder dos grandes monopólios: “O Partido Republicano Brasileiro (PRB) faz história ao eleger 21 deputados federais, 31 deputados estaduais e um deputado distrital. A surpresa ficou por conta da votação expressiva de Celso Russomanno em São Paulo, com mais de 1,52 milhão de votos (7,26% dos votos válidos), que arrebanhou o título de candidato mais bem votado em números absolutos em todo o país, desbancando o fenômeno Tiririca.”
Com capital associado aos grupos econômicos internacionais, o país vai sendo saqueado por uma complexa rede de sócios capitalistas que concentram uma sofisticada máfia legal e institucionalizada pelo Estado. O PRB, citado acima, é só um exemplo que não é a exceção, mas a regra geral de todos os grandes partidos, incluindo aí também o PT.
Outro exemplo é a relação de grandes empresas que financiam as campanhas eleitorais. Segundo a Folha de São Paulo, a JBS Friboi, na eleição de 2006, investiu cerca de R$ 20 milhões em financiamento de campanhas. Em 2010, a empresa entrou com R$ 83 milhões, e ajudou a eleger a presidenta da República, oito governadores, sete senadores, 40 deputados federais e 19 deputados estaduais. Em 2014, a empresa desembolsou uma quantia espetacular de R$ 391 milhões, foi a maior doadora seguida pela Odebrecht com R$ 111 milhões, e Bradesco com R$ 100 milhões.
Quanto mais a JBS aumentou seus financiamento nas campanhas, mais cresceu o seu próprio patrimônio, recebendo aportes maciços do BNDES, aproximadamente R$ 10 bilhões. O BNDES é o segundo maior acionista com 24,59% das ações da JBS, a Caixa Econômica tem 10% e a família Batista 41,12%. Nota-se que a J&F Holdings construiu uma cadeia que concentra poder econômico e político: o dinheiro público potencializa o patrimônio da empresa que, consequentemente, passa a financiar ainda mais as campanhas eleitorais, abrindo as gavetas do poder e garantindo ainda mais vantagens na relação com o Estado. Apoiado por aportes bilionários do BNDES, o frigorífico que faturava R$ 3,7 bilhões em 2005, agora tem fábricas em 12 países, 200 mil funcionários, e faturou R$ 92 bilhões em 2013, segundo dados da Folha de São Paulo ( 21/09/2014).
Meirelles, o homem de confiança das Holdings
Henrique Meirelles foi presidente do Banco de Boston, depois se candidatou às eleições por Goiás e foi eleito, com uma campanha milionária, à deputado federal. Foi o mais bem votado pelo PSDB. Renunciou o mandato para ser nomeado por Lula à presidente do Banco Central de 2003 a 2011. Em 2012, assumiu a Presidência do Conselho Consultivo da “J & F Holding” que tem um faturamento anual de R$ 65 bilhões e controla as seguintes empresas: JBS (alimentícia), Vigor (alimentícia), Flora (higiene pessoal e limpeza doméstica), Eldorado Brasil (papel e celulose), Banco Original, Floresta Agropecuária (criação e comercialização de gado), J&F Oklahoma (empresa de atividades pecuárias nos EUA), Canal Rural (emissora de televisão sobre agronegócio), Alpargatas S.A. (Dona das famosas sandálias Havaianas e da Osklen). Além da J & F, Henrique Meirleles é também membro do Conselho Administrativo da Azul Linhas Aéreas. Não é a toa que Lula aconselhava Dilma a indicar Meirelles como ministro no início de seu segundo mantado. Temer assumiu e o indicou, e agora a própria Dilma sinalizou que se o impeachment não passar no Senado, Henrique Meirelles fica.
“Se nós formos comparar a velocidade que está caminhando esse ajuste com a ansiedade de todos para resolver o problema econômico do país, está caminhando devagar. Se formos comparar a velocidade com que caminha o ajuste com o fato de que é a primeira vez em 28 anos, desde a Constituição, que se faz esse ajuste, está caminhando muito rápido e dentro de um ritmo legislativo de muita responsabilidade”, disse Henrique Meirelles, recentemente, tentando acalmar o mercado ansioso.
Henrique Meirelles é um homem de confiança dos bancos e das grandes Holdings, das quais ele mesmo faz parte. A aplicação do ajuste fiscal é o objetivo central de Meirelles para direcionar os recursos do Estado para investimentos e interesses desses grandes grupos financeiros, tanto através do pagamento religioso da dívida pública quanto com a garantia de empréstimos, investimentos e todo tipo de vantagem na relação com o Estado.
Para além dos planos de austeridade, estão nos planos do Governo Temer a Reforma Trabalhista e Previdenciária que têm como objetivo baratear a mão de obra e gastar menos com benefícios. Uma Holding de 200 mil funcionários como a J & F tem muito interesse em diminuir os custos com a mão de obra, abrindo caminho para ganhar fôlego diante da crise do capital que se aprofunda desde 2008.
O que está por trás do PLP 257 e da PEC 241/16?
O PLP 257/16 enviado por Dilma ao Congresso Nacional, em regime de urgência, renegocia a dívida dos estados impondo condições draconianas que vão diminuir os investimentos na máquina pública, ampliam o processo de privatização e diminuem drasticamente gastos com pessoal e com a previdência. O funcionalismo público vai ganhar menos e trabalhar mais para que as poucas famílias donas das grandes Holdings possam garantir uma vida de luxo e ostentação absolutamente desproporcional com a realidade da maioria da população.
Esse projeto foi aprovado recentemente no Congresso Nacional com pequenas alterações. O barulho que o movimento sindical fez nessas últimas semanas provocou algumas inflexões e mudanças no texto do PLP 257/16, mas foram mudanças que não alteraram efetivamente o conteúdo do projeto. Este será complementado com a aprovação da PEC 241/16 que teve maioria dos votos dos deputados na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados no dia 09 de agosto. Veja aqui quem votou na PLP 257/16 . Denunciar cada deputado federal que está a serviço dos grandes monopólios votando contra os trabalhadores no congresso nacional é um dever de todo o movimento sindical.
Já a PEC 241/16 é uma intervenção na Constituição do país. Irá retroceder as pequenas conquistas que ainda existem desde a constituição de 88. Trata-se de um ataque qualitativo contra os direitos sociais. Há uma coesão significativa na base do Governo Temer para aprovar essa PEC. Mas não sem medo e crises, pois sabem que é possível um levante contra esse absurdo cometido contra os trabalhadores e contra a soberania nacional.
Recolonização
Em nome de interesses de sócios estrangeiros e do imperialismo faz-se uma emenda complementar na Constituição Federal do país para dar segurança aos negócios. Uma demonstração que a recolonização avança no terreno econômico e político. O fato é que as grandes holdings operam mudanças ousadas no arcabouço legislativo do país a favor de seus interesses. A proposta visa instituir um novo regime fiscal ou um novo teto para o gasto público, que terá como limite a despesa do ano anterior corrigida pela inflação. A regra de congelamento do gasto público em termos reais valerá por 20 anos, período durante o qual o dinheiro economizado será canalizado para pagamento dos juros e do principal da dívida. Henrique Meirelles, como representante das grandes Holdings, opera a serviço dos interesses dos monopólios.
Unidade para derrotar o Ajuste Fiscal de Temer
A não aprovação ou adiamento desses projetos que concretizam o ajuste fiscal seria uma derrota importante para o imperialismo. Mas essa derrota histórica do capital não se dará sem a construção de uma ampla unidade de ação com forças sociais suficientes para fazer o Governo Temer e o Congresso Nacional recuar.
As centrais sindicais precisam colocar o bloco na rua e construir em conjunto com funcionalismo público, com as categorias que estão entrando em campanha salarial, com o movimento dos sem teto e com a juventude, uma forte jornada de lutas. Caravanas à Brasília, denúncia dos deputados que votarem contra os trabalhadores, pressão no Congresso Nacional, paralisações e mobilizações a serviço da construção de uma greve geral no país.
Começam a surgir iniciativas importantes através do funcionalismo publico federal que precisam ser ampliadas, pois a magnitude dos ataques contra os direitos sociais é enorme. Nenhuma categoria de trabalhadores com suas próprias forças vai conseguir enfrentar o poderoso inimigo. O segredo da vitória está na paciência em construirmos mobilizações em torno do que nos unifica contra o governo Temer, mas respeitar as expressões das distintas propostas que existem de saída política para o país.
Por uma Segunda Independência
O imperialismo usa de vários métodos para avançar no seu domínio sobre os povos do mundo. Mas, nos últimos anos, em especial na América Latina, o imperialismo não tem intervido através de golpes militares como foi no seculo XX. O que vemos são manobras, quebras de acordos, rompimento de tratados e traição de ritos que venham atrapalhando o capitalismo sair de sua crise. São pequenos golpes por dentro do regime burguês, sem a necessidade de intervenção militar. Destituem presidentes sem mudar o regime e, muitas vezes, contando com certa indiferença popular em relação aos processos.
Dilma sofre um processo de impeachment no qual sua base de apoio rompeu todos os acordos e tratados políticos para retomar o controle das instituições, diminuir os danos da Lava Jato, retomar o controle político que Dilma e o PT perderam, reconstruir a unidade interburguesa e aprofundar um plano econômico anti-popular.
Assim, ainda que não caracterizemos o impeachment como algo qualitativamente igual ao golpe militar de 64, não é possível apoiá-lo. A derrubada do governo de conciliação de classes de Dilma não se deu e não está se dando pela classe trabalhadora organizada, mas sim por uma iniciativa da própria burguesia que se movimenta para abrir condições políticas favoráveis para a máquina do estado passar a funcionar a todo vapor, e atender, assim, os interesses dos grandes negócios.
Ao mesmo tempo, não é possível ir às ruas defender Dilma e lutar para que o PT volte ao governo. Apoiaríamos Dilma se ela voltasse anunciando uma politica econômica de ruptura com o imperialismo, suspensão do pagamento da dívida pública aos banqueiros, demissão de todos os ministros burgueses, e a nomeação de ministros indicados pelos movimentos sociais e aplicasse um plano econômico para atender as necessidades do povo trabalhador brasileiro. Sabemos que isso não vai se dar, que a direção do PT está completamente corrompida e que Dilma voltando vai continuar aplicando o ajuste fiscal contra os trabalhadores. A política de conciliação de classes do PT criou as condições para que Michel Temer esteja hoje na Presidência da República.
Por essas razões, só é possível derrotar os planos da burguesia em curso construindo um amplo movimento de massas que derrube Temer e convoque Eleições Gerais nesse país, contrariando o plano A da burguesia que é de dar estabilidade ao governo Temer para o mesmo governar a favor dos seus negócios.
Por último, é preciso debater com os trabalhadores e com a juventude a necessidade de uma Segunda Independência do nosso país. O Brasil é uma semi colônia que caminha para se transformar numa colônia. Estamos nos transformando em um país que tem toda sua estrutura de decisão política e arcabouço legislativo atacados por lobos que comandam o sistema a favor de grandes vantagens financeiras. A antecipação das eleições no país vai atrapalhar os planos da burguesia, mas não vai resolver os problemas sociais por si só. É preciso ganhar a maioria do povo para lutar por um projeto de libertação soberana do país com independência de classe, exigindo a aplicação de um programa de transição que garanta o pão e a liberdade rumo ao socialismo.
*É Coordenador Geral da FASUBRA, membro da Secretaria Executiva da CSP Conlutas e militante do MAIS.
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