Por Renato Fernandes, Campinas (SP)
Foto: Izquierda Diario
Seguindo uma tradição recente, as ruas da Argentina foram tomadas por marés humanas de mulheres para gritarem “Ni Una Menos” e “Basta de Feminicídios”. Para se ter uma ideia, o ato em Córdoba reuniu mais de 20 mil pessoas, enquanto em La Plata houve mais de 15 mil. Na cidade de Buenos Aires, capital do país, cerca de mais de 50 mil pessoas estiveram presentes no ato que terminou em frente a Casa Rosada, palácio do governo.
A Argentina é um dos principais palcos do que alguns estão chamando de “quarta onda feminista”. Desde o surgimento do movimento Ni Una Menos, em abril de 2015, em resposta à violência brutal sofrida pelas mulheres – a cada 18 horas uma mulher é morta e por dia, 50 mulheres sofrem ataques sexuais no país – podemos dizer que o país é vanguarda do movimento feminista.
As principais mobilizações feministas, desde então, foram realizadas de forma unitária pelos diversos coletivos, sindicatos e partidos de esquerda e impulsionadas por Ni Una a Menos. Todas elas multitudinárias, reunindo milhares de pessoas. A última, antes do 8 de março, foi a greve de mulheres contra o feminicídio de Lucía Perez, em 19 de outubro de 2016.
Dessa vez não poderia ser diferente, com o chamado a uma greve internacional de mulheres. As reuniões preparatórias foram gigantescas e fizeram convergir os diversos coletivos feministas existentes no país. Pedindo uma resposta política a demandas políticas, os coletivos exigiram que as centrais sindicais chamassem à paralisação no 8 de março e incorporassem as demandas das mulheres nas reivindicações sindicais. Isso pressionou diversos sindicatos a aderirem a paralisação deste 8M.
A situação atual na Argentina é de uma verdadeira crise social. Segundo o informe apresentado pelo Observatório da Dívida Social, ligado a uma Universidade Católica (UCA), desde que o atual presidente Macri assumiu, em dezembro de 2015, o número de pobres aumentou em cerca de 1,5 milhões de pessoas e o de indigentes em 600 mil, chegando a um total de 13 milhões de pobres e 2,7 milhões de indigentes. Isso é o resultado do ajuste neoliberal que Macri vem implementando, com aumento no preço de produtos básicos como energia elétrica e gás e com cortes na educação, saúde, salários, empregos, etc.
Essa situação de crise social está atravessada por importantes mobilizações sociais. Um exemplo é a AGR-Clarín, uma gráfica que está ocupada desde final de janeiro contra o seu fechamento. A comissão de mulheres da AGR esteva presente ao ato.
Outra luta recente foi a dos docentes que fizeram 3 dias de paralisação: um dia para exigir a abertura de negociação salarial da categoria, no último 6/3, com manifestação de cerca de 50 mil professores na capital e com 92% de paralisação na base, de acordo com os sindicatos; no dia 7/3, a CGT havia convocado uma manifestação nacional contra o ajuste, no qual os docentes se incorporaram com a paralisação de suas atividades; e o último, no 8 de março, incorporando-se à greve internacional, junto com categorias como as de funcionários públicos e servidores do judiciário, que também paralisaram suas atividades no 8M.
No final da manifestação, a polícia perseguiu mulheres que haviam participado da manifestação e prendeu cerca de 20 pessoas. Essas mulheres presas denunciaram que foram humilhadas e torturadas na delegacia, sendo obrigadas a tirarem as roupas, além da tradicional intimidação da força policial. Todo isso demonstra que a polícia serve muito bem para reprimir as manifestações, mas não para proteger as mulheres do feminicídio.
Todas essas lutas na Argentina parecem demonstrar a abertura de uma nova situação social, na qual a classe trabalhadora começa a questionar, por meio das mobilizações, o governo neoliberal de Macri. O grande empecilho para isso é ainda a CGT, principal sindicato do país, que não quer colocar uma data para uma paralisação nacional e não rompe a trégua com o governo, demonstrando ser um grande obstáculo as lutas das trabalhadoras e trabalhadores argentinos.
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