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MUNDO

Estado espanhol: Partido Socialista reforça a possibilidade de manter-se à frente do governo

Deputada socialista Francina Armengol é eleita presidenta do Congresso, com apoio de uma coalizão ampla, formada pelo PSOE, partidos de esquerda, regionais e independentistas

André Freire, da Redação
Fernando.Calvo/Gobierno de España

Na manhã da última quinta-feira, dia 17 de agosto, houve a instalação do novo Congresso do estado espanhol (equivalente à Câmara de Deputados, no Brasil), eleito no último dia 23 de julho. O Congresso possui 350 deputados e como nenhum partido ou bloco (anteriormente constituído) obteve maioria absoluta, as eleições para presidência e para a mesa da Casa eram cercadas de grandes incertezas e muitas especulações.

O Partido Socialista (PSOE – partido socialista operário espanhol) apresentou o nome da deputada Francina Armengol. Ela foi eleita com a maioria absoluta, mais precisamente 178 votos. Neste total, 121 votos vieram do PSOE, 31 votos do SOMAR (uma frente de várias organizações de esquerda), 7 votos da ERC (Esquerda Republicana da Catalunha), 7 votos do “Juntos por Catalunha” (Junts), 6 votos do Bildu (Reunir, organização de esquerda do País Basco), 5 votos do PNV (Partido Nacional Basco) e 1 voto do BNG (Bloco Nacionalista Galego).

Em segundo lugar, chegou a candidata do Partido Popular (PP), Cuca Gamarra, que obteve 139 votos (137 votos do PP e mais 2 votos de outros partidos menores). E, em terceiro, chegou o candidato do VOX, isolado, com 33 votos (apenas os votos de seu partido). A aliança do PP com o VOX se rompeu nesta eleição interna do Congresso, pois o PP não aceitou incluir nenhum nome do VOX na Mesa da Casa, buscando um afastamento momentâneo e oportunista da extrema direita, para tentar viabilizar outros apoios a sua candidatura. Deu tudo errado, felizmente. No Senado, sem surpresas, o resultado foi diferente, como o PP conseguiu eleger maioria absoluta nesta Casa e seu candidato, Pedro Rollán, foi o eleito.

Ainda sobre a eleição da presidência do Congresso, uma simples conta vai demonstrar que para conseguir eleger Francina Armengol não bastava os votos da aliança entre PSOE e Somar, que já estava alinhavada antes das eleições, era fundamental que o acordo incluísse os partidos regionais e chamados independentistas.

Os termos do primeiro acordo

Francina era Presidente do governo das Ilhas Baleares. A sua indicação pelo PSOE, mesmo que simbólica, já foi uma sinalização do PSOE às forças regionais e independentistas de disposição de trabalhar com a pluralidade regional, muito presente na formação do estado espanhol.

Mas, na verdade, a sua eleição só foi possível a partir de um acordo, principalmente com os partidos da Catalunha, ERC e Junts, que só saiu horas antes da eleição da presidência e da mesa do Congresso. O acordo envolve concessões bem parciais do PSOE em relação à agenda de autodeterminação regional, apresentada por estes partidos.

Este acordo prevê que o Catalão e outras línguas presentes no território do estado espanhol tenham seu uso admitido nas discussões do Congresso; e que, o mesmo, seja reivindicado nos fóruns da União Europeia; Além da criação de uma comissão parlamentar que investigue tanto os atentados de 2017, ocorridos na Catalunha, pois existe a séria dúvida de envolvimento do estado espanhol na sua execução, como se houve espionagem ilegal do Estado sobre lideranças políticas Catalãs.

Mesmo que parcial, o acordo já representa concessões do PSOE à agenda de autodeterminação, tanto da Catalunha, como do País Basco. Mas, o referido acordo foi válido apenas para a eleição da presidência e da mesa do Congresso, ainda não existe nenhum acordo sobre uma possível investidura de um novo governo.

PSOE vai conseguir formar um novo governo?”

Como existe na Espanha um regime parlamentarista, para conseguir a investidura do novo governo, o PSOE vai precisar repetir a mesma aliança que conseguiu para as eleições da presidência do Congresso. Este acordo de governo ficou mais próximo? Sim. Mas para que ele se estenda à manutenção de Pedro Sánchez como Primeiro-Ministro espanhol, as exigências dos partidos regionais e independentistas serão maiores. Caso nenhum dos blocos enfrentados no Congresso espanhol consiga formar maioria, a saída será a repetição das eleições, em até seis meses.

Para um acordo, na mesa estão dois pontos centrais: a anistia aos perseguidos políticos da Catalunha, por conta da realização de um plebiscito que chegou a aprovar um processo de independência da região; e a retomada de uma agenda de discussão sobre a justa reivindicação de autodeterminação regional, tanto da Catalunha como do País Basco. Temas que sofrem grandes resistências no interior do PSOE, por suas conhecidas relações com setores conservadores e adeptos a uma maior centralização política e administrativa.

A questão da anistia aos perseguidos da Catalunha, ganha ainda mais destaque, por que entre os possíveis anistiados estaria Carles Puigdemont, maior líder político do partido “Juntos pela Catalunha” (Junts), que se encontra exilado na Bélgica desde 2017 e é até hoje procurado pela polícia do estado espanhol, por sua liderança na organização do plebiscito que chegou a aprovar a independência da Catalunha.

Até agora o PSOE rejeita a concessão dessas anistias, embora a coalizão de esquerda Somar, liderada pela atual vice-presidenta do governo espanhol, Yolanda Díaz, sinaliza estar disposta a aceitá-la, para viabilizar a indicação de um novo governo progressista e acabar parcialmente com a judicialização das discussões sobre o justo direito à autodeterminação.

Portanto, apesar da eleição da presidência do Congresso ter sido um primeiro passo importante para a viabilização do acordo para investidura de um novo governo de coalizão, as negociações nas próximas semanas serão decisivas e darão a última palavra. Caso seja possível a investidura deste novo governo de coalizão, ficará afastada a possibilidade de um governo formado pelo PP e pelo VOX, uma aliança sinistra entre uma direita cada vez mais radical e uma organização de extrema direita neofascista. Ou seja, uma boa notícia.

Entretanto, fica uma grande dúvida se Pedro Sanchéz (e o PSOE) conseguirá se equilibrar entre sua política de adesão à agenda de guerra da Otan, aos já permanentes planos de austeridade da União Europeia e sua relação umbilical com os setores da grande burguesia espanhola, com as reivindicações dos outros parceiros de uma possível aliança.

Tanto da coalizão de esquerda Somar, que mesmo representando uma esquerda cada vez mais moderada irá cobrar uma agenda de mais avanços sociais e de direitos democráticos para a maioria da população; como de partidos como Junts, ERC e Bildu, que vão querer avançar de forma qualitativa em negociações que atendam ao justo direito à autodeterminação regional.

Fatalmente, caso realmente se forme, será um governo de grande instabilidade. É importante acompanhar de perto os desfechos deste importante processo político, com evidentes desdobramentos sobre a situação na Europa.